Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 517/03
OF ATL n° 82/06
Ref.: Of. SGP-23 nº 1398/2006
Senhor Presidente
Reporto-me ao ofício referenciado, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou a esta Chefia do Executivo Municipal cópia autêntica da medida relativa à aprovação, em sessão de 10 de maio do corrente ano, do Projeto de Lei nº 517/03.
De autoria do Vereador Toninho Paiva, o referido projeto dispõe sobre autorização às farmácias e drogarias instaladas no Município de São Paulo para proceder a medição de pressão arterial, de tanto se incumbindo o farmacêutico responsável pelo estabelecimento, a ser treinado pela Secretaria Municipal da Saúde. Por sua vez, os aparelhos para a cogitada medição, denominados tensiômetros, deverão se encontrar em perfeito estado e devidamente calibrados, importando, o descumprimento dessas condições, a aplicação de multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), dobrada em hipótese de reincidência.
Considerando que, como já ressaltado pelo próprio Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, a hipertensão arterial pode ser tida como uma moléstia de características epidêmicas, fica evidente a importância de medidas destinadas a prevenir e a tratar esse mal. Sob esse enfoque, portanto, e no que diz respeito, estritamente, à sua motivação, o projeto de lei em comento, aprovado por essa Egrégia Câmara, é de todo louvável. Ainda assim, e como a seguir se demonstrará, a pretendida sanção resultará inviável ante a existência de impedimentos legais, de resto inafastáveis.
Com efeito, no exercício de competência que lhe foi constitucionalmente assegurada, a União fez promulgar a Lei nº 5.991, de 17 de dezembro de 1973, que dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos. Após conceituar no artigo 4º, incisos X e XI, as farmácias e as drogarias, o citado diploma federal é taxativo ao dispor, em seu artigo 55, ser vedada a utilização de qualquer dependência da farmácia ou da drogaria como consultório ou para outro fim diverso do licenciamento.
Fixados esses parâmetros, tem-se que a farmácia é um estabelecimento licenciado para a manipulação de fórmulas magistrais e oficinais, comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, compreendendo a dispensação e o atendimento privativo de unidade hospitalar ou de qualquer outra equivalente de assistência médica. No que tange à drogaria, trata-se de estabelecimento licenciado para a dispensação e comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos em suas embalagens originais. Ambas – farmácia e drogaria – não podem utilizar, por força da mencionada legislação federal, nenhuma de suas dependências como consultório médico ou para fins diversos do respectivo licenciamento, o que equivale a afirmar ser legalmente proibida a prática de atos médicos, tais como a medição da pressão arterial, nas dependências dos estabelecimentos em questão.
De fato, e conforme já delimitado pelos órgãos de classe responsáveis, a medição da pressão arterial é parte integrante do exame físico procedido no paciente pelo profissional habilitado para a definição do diagnóstico e a prescrição do medicamento. Bem por isso, a determinação da pressão arterial é um ato médico, a cargo, portanto, do médico ou sob sua supervisão, o que exclui – sempre levando em conta a antes citada legislação federal – a realização desse procedimento nas farmácias e drogarias.
Como se tanto não bastasse para impedir a sanção do projeto aprovado, há que se aduzir, ainda, outra proibição que mais o inquina de ilegalidade.
Na verdade, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por sua Diretoria Colegiada, expediu a Resolução RDC nº 173, de 8 de julho de 2003, por meio da qual agregou ao Regulamento Técnico que institui as Boas Práticas de Dispensação em Farmácias e Drogarias — objeto da Resolução RDC nº 328, de 22 de julho de 1999 —, dentre outras vedações, a da utilização, pelos citados estabelecimentos, de aparelhos de uso médico-ambulatorial, que é o caso do tensiômetro.
Do exposto deflui que a prática da medida prevista pelo projeto aprovado é cabalmente vedada pela legislação federal que regula a matéria, pelo que sancioná-lo equivaleria a afrontar o ordenamento jurídico vigente, ou, por outras palavras, a promulgar lei municipal contrária a lei federal legitimamente editada, hipótese essa inadmissível ante a mais singela hermenêutica.
Em assim sendo, por razões de inconstitucionalidade e ilegalidade, e com base no disposto no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, veto na íntegra o projeto aprovado, restituindo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara, para o necessário reexame.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ROBERTO TRIPOLI
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo