CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 506/2003; OFÍCIO DE 9 de Janeiro de 2004

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 506/03

OF. ATL nº 037/04

Ref.: Ofício 18-LEG3 nº 0761/2003

Senhor Presidente

Por meio do ofício referenciado, ao qual ora me reporto, Vossa Excelência encaminhou à sanção desta Chefia do Executivo cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara em sessão de 27 de novembro de 2003, relativa ao Projeto de Lei nº 506/03, de autoria do Vereador Ricardo Montoro, que dispõe sobre a implantação de dispositivos em passagens de pedestres sinalizadas com semáforos, objetivando a instalação de equipamentos sonoros de orientação para pessoas portadoras de deficiência visual.

Sem embargo dos elevados propósitos que certamente nortearam o Parlamentar autor da propositura, impõe-se veto total ao texto aprovado, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, como a seguir se demonstrará.

A mensagem aprovada basicamente dispõe que, em todas as faixas para travessia de via sinalizadas com semáforo

de pedestres, deverão ser implantados dispositivos que possibilitem a instalação de equipamento sonoro de orientação para pessoas portadoras de deficiência visual. No mais, o texto aprovado vai além, ao determinar que o comando dele constante seja condição obrigatória para novas implantações de travessias de pedestres e para cruzamentos semaforizados cujo ciclo contemple fase especial para pedestres.

Ao assim dispor, a propositura incorre claramente em vício de iniciativa, versando sobre serviço público, cujo impulso oficial para legislar é privativo do Prefeito, “ex vi” do disposto no artigo 37, § 2º, inciso IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Dispõe, ademais, sobre matéria típica de administração de bens públicos municipais, igualmente de competência exclusiva da Chefia do Executivo, por força da norma prevista nos artigos 70, inciso VI, e 111, ambos da Lei Maior local.

Inquestionável, portanto, que a mensagem, maculada pelo vício de iniciativa, transgride o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Constituição Federal e reproduzido no artigo 5º da Carta Estadual e no artigo 6º da Lei Orgânica do Município.

A par disso, ao regular assunto afeto à gestão administrativa municipal, relacionado ao funcionamento de semáforos, de natureza eminentemente técnica e de competência exclusiva de órgãos específicos do Executivo, a mensagem reveste-se de flagrante contrariedade ao interesse público, não apenas por adotar medidas inadequadas, como também por propiciar maior risco de acidentes.

Inicialmente, cabe ressaltar que o tema referente à implantação de semáforos sonoros para deficientes visuais não é novo para a Companhia de Engenharia de Tráfego – CET, que, desde 1989, dele vem cogitando. De fato, no citado ano, a CET desenvolveu a primeira versão de um dispositivo da espécie, até chegar, já em 1993, àquela denominada “Semáforo Sonoro”, que se caracterizava pela emissão de sons distintos durante as fases “verde” e “vermelho intermitente” do semáforo de pedestres. Objetivava-se, com tal técnica, definir claramente cada uma das partes do ciclo semafórico de pedestres, auxiliando, assim, os deficientes visuais a empreenderem, com segurança, a travessia da via pública.

O equipamento em questão chegou a ser instalado em três locais estrategicamente selecionados.

Ocorre que, após estudos realizados, inclusive com pesquisas efetuadas junto à população usuária do sistema, a Gerência de Desenvolvimento e Estudos Especiais da Companhia de Engenharia de Tráfego concluiu que o equipamento em causa proporcionava uma falsa segurança aos deficientes visuais, e isto na medida em que não se podia desconsiderar o elevado índice de desrespeito, por parte dos condutores de veículos, ao semáforo vermelho, a comprometer a segura travessia da via pública por aqueles a quem o sistema objetivava.

Em decorrência das mencionadas constatações, a citada Gerência da CET deliberou, afinal, pela inviabilidade da aprovação do projeto, fazendo-o em parecer encampado pelas instâncias superiores e lastreada, inclusive, nas informações prestadas pelos próprios deficientes visuais e pelas entidades que os assistem, no sentido de não se sentirem eles seguros ao efetuar, desacompanhados, a travessia da via pública, mesmo com o denominado “semáforo sonoro”, nem sempre respeitado pelos motoristas.

Inviabilizada, assim, a implantação do projeto em larga escala, a situação, nos dias de hoje, é a seguinte: a CET mantém em funcionamento quatro unidades equipadas com o referido semáforo sonoro, estando três delas localizadas nas proximidades de instituições que atendem a deficientes visuais e em cujas portarias registra-se a presença de um empregado ou monitor, destinando-se o sinal sonoro a informá-lo de que uma pessoa assistida pela entidade aguarda sua ajuda para efetuar a travessia da via pública. Quanto à quarta unidade, encontra-se instalada em local de grande fluxo de pedestres – sem necessidades especiais –, servindo o sinal, apenas, para avisá-los do início da permissão da travessia.

A este passo, é de se observar que, não obstante o empenho da CET em coibir as infrações resultantes de desrespeito ao sinal vermelho pelos condutores de veículos, empenho esse traduzido na modernização dos equipamentos de fiscalização, as referidas infrações ainda se mantêm em níveis elevados. De conseguinte, o acolhimento da medida constante da mensagem exporia o deficiente visual a uma situação não cabalmente segura.

No mais, e mesmo que fosse vencido tal obstáculo, o texto aprovado tem uma amplitude que, sistematicamente, o compromete.

Com efeito, a adoção indistinta do recurso em questão implicaria aumento considerável da já exacerbada poluição sonora da Cidade. Inconveniente, também, a utilização indiscriminada do equipamento, até por envolver matéria atinente a recursos públicos, o que, em princípio, demandaria a definição de locais com fluxo representativo de deficientes visuais.

Por tudo, como se vê, é a propositura, além de inconstitucional, contrária ao interesse da Cidade, pelo qual cabe à Chefia do Executivo zelar. Ilegal, ainda, por invadir matéria disciplinada pelo Código de Trânsito Brasileiro, que reservou ao CONTRAN competência para aprovar, complementar ou alterar os dispositivos e equipamentos de trânsito.

Enfim, as razões ora aduzidas impedem-me de acolher o texto vindo à sanção, compelindo-me, com fulcro no disposto no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, a vetá-lo integralmente, sem olvidar a nobre intenção que o ditou.

Assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao

Excelentíssimo Senhor

ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo