Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 422/08
OF ATL nº 22/10
Ref.: Ofício SGP-23 nº 04455/2009
Senhor Presidente
Reporto-me ao ofício em referência, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia da lei decretada por essa Egrégia Câmara, relativa ao Projeto de Lei nº 422/08, de autoria do Vereador Ricardo Teixeira, que declara de utilidade pública áreas particulares situadas nos fundos da Praça Dr. Pérsio Molina, de quem olha da Rua Bresser, no bairro da Mooca.
Como consta da Justificativa apresentada pelo Vereador, a praça em referência possui áreas particulares contíguas, as quais eram utilizadas pela população como se pertencentes a esse logradouro público. Ocorre que recentemente tais áreas foram muradas, para surpresa dos usuários. Pretende-se, pois, com o projeto aprovado, a declaração dessas áreas como de utilidade pública para fins de desapropriação.
Em que pese o elevado intuito norteador da iniciativa, a medida não reúne condições de ser convertida em lei, sendo indeclinável seu veto total, com fundamento no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, na conformidade das razões a seguir aduzidas.
De início, observo que a desapropriação é uma forma de aquisição de bens para integrarem o domínio público municipal, e de tal sorte encontra-se estabelecida como uma das matérias de competência privativa do Prefeito Municipal. É o que deflui do artigo 37, § 2º, inciso V, da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Isto tem uma razão de ser, pois somente mediante análise a ser efetuada pelos órgãos competentes do Poder Executivo é que se poderá chegar à conclusão de que existe interesse público para tal finalidade e que há recursos financeiros para tanto.
Nesse sentido, a aquisição de bens insere-se na matéria orçamentária, tendo em vista vigorar no Brasil a técnica do orçamento-programa, introduzido no país pela Lei Federal nº 4.320, de 17 de março de 1964, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Em seu artigo 2º determina que “a Lei de Orçamento conterá a discriminação da receita e da despesa, de forma a evidenciar a política econômico-financeira e o programa de trabalho do Governo, obedecidos os princípios de unidade, universalidade e anualidade”.
Por conseguinte, a proposta aprovada pressupõe a existência de verbas, importando aumento de despesas sem a indicação dos correspondentes recursos, estando, pois, em desacordo com o artigo 25 da Constituição do Estado de São Paulo e com a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, em seus artigos 15 a 17.
A propósito, vale lembrar que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em casos análogos, tem proclamado reiteiradamente a inconstitucionalidade de textos legais como o ora vetado:
“Desta forma, determinando por meio de lei a adoção de medidas específicas de execução, houve ingerência de um Poder em relação ao outro, com nítida invasão de competência e infringência ao artigo 5º, “caput”, da Constituição do Estado. (...) A par disso, é evidente que a execução da indigitada lei iria provocar despesas. Sem constar a indicação dos recursos disponíveis próprios para atender aos novos encargos, era de rigor o veto, nos tempos do artigo 25 da Constituição do Estado” (ADIN nº 44.255.0/5-00 – Rel. Franciulli Neto, v.u., j. em 19.05.99; no mesmo sentido: ADIN nº 59.744.0/01, Rel. Des. Mohamed Amaro; ADIN nº 11.676-0, Rel. Des. Milton Coccaro; ADIN nº 11.803-0, Rel. Des.Yussef Cahali; ADIN nº 65.779-0/0, Rel. Des. Flávio Pinheiro.
De outra parte, pode-se verificar ainda que não se trata de lei meramente autorizativa. Realmente, por força do artigo 3º da propositura, o Executivo deverá efetivar a medida, ou seja, desapropriar o bem, no prazo de 90 (noventa) dias, que é o prazo da regulamentação. Com isso, a medida contraria a legislação federal sobre a matéria relativa a desapropriações. É que o artigo 6º do Decreto-lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, dispõe que “a declaração de utilidade pública far-se-á por decreto do Presidente da República, governador, interventor ou prefeito”.
O texto da propositura repete, em seu artigo 1º, termos dos decretos de desapropriação que são normalmente editados pelo Prefeito. Sendo assim, se sancionada, a nova lei já anteciparia um ato que é privativo do Chefe do Executivo, como consta da norma federal citada. Na verdade, é necessária toda uma análise fática sobre o bem a ser desapropriado, inclusive no tocante à existência de outras praças e áreas verdes no entorno do local, para que se possa avaliar a real necessidade de se incorporar lotes particulares ao logradouro em comento, o que é atribuição precípua da Administração Pública.
Nessas condições, evidenciadas as razões que me levam a vetar integralmente o projeto aprovado, nos termos do § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica local, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo