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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 377/2001; OFÍCIO DE 14 de Junho de 2005

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 377/01

Ofício ATL nº 104/2005

Ref.: OF-SGP23 nº 1769/2005

Senhor Presidente

Por meio do ofício referenciado, ao qual ora me reporto, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 377/01 aprovado por essa Egrégia Câmara em sessão de 11 de maio de 2005, de autoria do Vereador Beto Custódio (PT), o qual dispõe sobre a isenção de tarifa nos transportes coletivos do Município de São Paulo para trabalhadores(as) desempregados(as).

Convém registrar, inicialmente, que o Projeto de Lei do Vereador Custódio foi apresentado em 2001, durante a gestão da Prefeita Marta Suplicy, mas a liderança da Prefeita na Câmara não favoreceu sua tramitação nem, muito menos, aprovação. Essa liderança só apoiou o projeto em questão depois da eleição do final do ano passado. Mais ainda, projetos que ampliavam agama de gratuidades foram vetados pela então Prefeita, como os Projetos de Lei nº 313/99, de autoria do Vereador Gilson Barreto, nº 50/01, do Vereador Willian Woo, nº 586/02, do Vereador Alcides Amazonas, e nº 250/03, do Vereador Humberto Martins.

É importantíssimo notar também que o projeto ora analisado não concede o benefício do transporte gratuito nos três a oito meses imediatamente posteriores ao trabalhador perder o emprego. Ou seja, no período em que o trabalhador mais procura emprego, mais se movimenta pela cidade, ele não receberia o passe do desempregado. Ao mesmo tempo, o projeto cria o benefício para todos os que dizem estar procurando emprego, inclusive o primeiro emprego. Ou seja, concede o transporte gratuito para todos aqueles que não tem carteira assinada: autônomos, camelôs, estudantes, aposentados e até servidores públicos não celetistas, já que estes não possuem carteira de trabalho assinada. Por derradeiro, não estabelece limite de viagens diárias para os beneficiários.

O potencial de beneficiários previsto no projeto ultrapassaria facilmente 1,5 milhão de pessoas. O custo potencial seria de 2 bilhões de reais por ano.

Mais ainda, o projeto determina que a Prefeitura faça, a cada seis meses, o cadastramento de todos os desempregados, providência que custaria pelo menos 45 milhões por ano. Aliás, fica implícito no projeto em questão, que, mesmo que uma pessoa consiga trabalho logo no segundo mês do beneficio, ela continuaria utilizando o passe gratuito por mais quatro meses, até o seguinte cadastramento. Note-se, ademais, que o custo do cartão magnético não seria inferior a 10 milhões de reais.

O desemprego é um dos problemas que merecem especial atenção por parte desta gestão, empenhada na implementação e aperfeiçoamento de políticas publicas e medidas que contribuam, efetivamente, para sua diminuição. Contudo, ainda que compartilhando das mesmas inquietações da mensagem aprovada, razões inarredáveis de ordem legal e financeira impedem a sanção, tornando indeclinável a aposição de veto pelo Executivo, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, na conformidade das considerações a seguir aduzidas.

Primeiramente, cabe assinalar que o beneficio proposto pela medida aprovada interfere no custo do transporte e na fixação da tarifa, envolvendo, pois, matéria de natureza orçamentária. A questão relativa às isenções e reduções tarifárias no sistema de transporte coletivo urbano municipal acha-se devidamente disciplinada por lei específica, que confere ao assunto tratamento sistemático, em consonância com as normas estabelecidas pela Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).

De fato, a Lei nº 13.241, de 12 de dezembro de 2001, que dispõe sobre a organização dos serviços do Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros da Cidade de São Paulo e autoriza o Poder Público a delegar sua execução, determina, no § 4º do seu artigo 27, que "as dispensas ou reduções tarifárias de qualquer natureza, além daquelas já vigentes na data da promulgação desta lei, deverão dispor de fontes específicas de recursos".

Assim, de acordo com a normatização vigente, a concessão de qualquer gratuidade ou desconto demanda, obrigatoriamente, o aporte adicional de recursos por parte da Administração Municipal ou o aumento da tarifa, a onerar o usuário pagante, a fim de atender a despesa resultante do benefício, em razão da atual fonte de receita do sistema, para a remuneração do operador, consistir na arrecadação tarifária.

A matéria reveste-se ainda de vício de iniciativa, uma vez que além de incorrer em matéria orçamentária, configura ingerência no serviço de transporte coletivo de passageiros, atualmente prestado sob regime de concessão e permissão de serviço público, matérias cuja iniciativa é exclusiva do Prefeito, nos termos dos artigos 37, § 2º, inciso IV, e do artigo 69, inciso IX, ambos da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Simultaneamente, a propositura incide em ilegalidade, haja vista que contraria o disposto no artigo 178 da Constituição Federal, o qual determina que as tarifas dos serviços públicos de transporte são de competência exclusiva do Município e deverão ser fixadas pelo Executivo.

A sanção dessa matéria implicaria na inobservância da Constituição Federal e da Lei Orgânica do Município, na medida em que malfere o princípio da separação e harmonia dos poderes, e desobedece a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei Municipal 13.241/2001, ao não prever a fonte de recursos para a ampliação das gratuidades.

Além dos vícios acima expostos, a medida não é compatível com a situação financeira do município. O artigo 5º da propositura proíbe o aumento de tarifa em razão dos custos decorrentes da isenção, e seu artigo 8º estabelece que as despesas advindas de sua execução correrão "por conta de dotações financeiras próprias, consignadas no orçamento vigente e suplementadas, se necessário, devendo as previsões futuras destinarem recursos específicos para seu fiel cumprimento". De fato, a única alternativa aflorada do texto aprovado é a de impor tal ônus exclusivamente ao Poder Público Municipal, o qual deveria dispor, já no presente exercício, de verbas adicionais no orçamento vigente, que pudessem suportar as despesas geradas pela isenção - como já citado, da ordem de 2 bilhões de reais por ano, uma vez que o valor consignado na Lei Orçamentária Anual de 2005 seria absolutamente insuficiente para fazer frente ao benefício pretendido. Tal valor permitiria tão somente a realização de dez viagens por ano para 1 milhão de pessoas. Só de ida.

Portanto, o Executivo se depara com um obstáculo incontornável, que impossibilita por completo a sanção do projeto aprovado, qual seja, a insuficiência de recursos financeiros no orçamento vigente, mesmo porque a situação financeira da Prefeitura é bastante delicada, dada o passivo descoberto deixado pela administração anterior. Cumpre ainda recordar que a atual administração assumiu dívidas de curto prazo que chegam à casa dos R$ 2,1 bilhões.

Por outro lado, não há como deixar de observar que, em virtude da imprecisão do legislador ao não delimitar de maneira satisfatória a condição daqueles que poderão valer-se do benefício - e não constando do texto legislativo a indicação dos recursos correspondentes, a medida em questão acha-se em frontal desacordo com o disposto nos artigos 15 e 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Por conseguinte, ante as razoes expendidas, que demonstram a impossibilidade de sanção do texto aprovado, por vício de iniciativa, por força da ausência de previsão orçamentária e de recursos financeiros, bem como da obrigatoriedade de observância às normas estabelecidas na Lei de Responsabilidade Fiscal, sob pena de ilegalidade, vejo-me na contingência de vetar o projeto aprovado na íntegra, com fundamento no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo, renovando, na oportunidade, a Vossa Excelência meus protestos de elevado apreço e distinta consideração.

JOSÉ SERRA

Prefeito

Ao

Excelentíssimo Senhor

ROBERTO TRIPOLI

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo