Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 370/01
Ofício ATL nº 199/03
Senhor Presidente
Dirijo-me a Vossa Excelência para, nos termos do disposto no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, comunicar a minha deliberação pelo veto integral ao Projeto de Lei nº 370/01, aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão de 1º de abril de 2003, de autoria do Vereador Antonio Paes-Baratão, que objetiva dispor sobre a criação do “Programa Saúde na Escola”, tendo em vista a sua inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, na conformidade das razões a seguir aduzidas.
Com efeito, não obstante o meritório propósito que certamente norteou o seu autor, a medida é inconstitucional por se chocar com o salutar princípio da harmonia e independência entre os Poderes, insculpido no artigo 2º da Constituição da República.
Isso porque a avaliação e encaminhamento de alunos da Rede Municipal de ensino, com dificuldades de ordem fonoauditiva e/ou visual, para tratamento adequado, bem assim a promoção de palestras e atividades sobre higiene e prevenção de doenças, constituem, a toda evidência, modalidades de prestação de serviços públicos cuja competência para dar início ao processo legislativo é privativa do Chefe do Executivo local, nos termos do artigo 37, § 2º, IV, reforçado pelo artigo 69, XVI, ambos da Lei Orgânica do Município de São Paulo, daí a afronta àquele princípio constitucional.
Na lição sempre precisa do renomado constitucionalista CELSO RIBEIRO BASTOS, tem-se que:
“Ao contemplar tal princípio, o constituinte teve por objetivo — tirante as funções atípicas previstas pela própria Constituição — não permitir que um dos “poderes” se arrogue o direito de interferir nas competências alheias, portanto, não permitindo, por exemplo, que o Executivo passe a legislar e também a julgar ou que o Legislativo, que tem por competência a produção normativa, aplique a lei ao caso concreto.” (in CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL, Editora Saraiva, 11ª edição, São Paulo — 1999, obra reformulada de acordo com a Constituição Federal de 1998, pág. 149)
Ainda que assim não fosse, tal admitindo-se apenas para possibilitar a continuidade da argumentação, a propositura, no mérito, também não poderia ser sancionada por este Executivo, porquanto os serviços públicos sobre os quais recai a pretendida disciplina legal vêm sendo objeto de abrangente estudo pelas Secretarias Municipais de Educação – SME e da Saúde – SMS, mostrando-se inoportuna e, pois, contrária ao interesse público, a edição de normas legais que, antecipando-se à conclusão daqueles estudos, estabeleçam o modo e a amplitude da atuação do Executivo nessa área.
De fato, por meio da Portaria Intersecretarial SMS/SME nº 03/2002, publicada no Diário Oficial do Município de 3 de setembro de 2002, foi instituído Grupo de Trabalho com o objetivo de elaborar projeto de integração entre as atividades afetas à Secretaria Municipal de Educação e à Secretaria Municipal da Saúde, contemplando as seguintes ações governamentais: a) a articulação dos meios pelos quais as equipes de ambas as Secretarias possam desenvolver uma linguagem comum; b) o desenvolvimento de atividades na perspectiva da construção do “Projeto Escolas Saudáveis”, nele considerando as peculiaridades dos diversos níveis de ensino; c) o estabelecimento de estratégias de capacitação para os profissionais das duas áreas — saúde e educação — nas questões relacionadas à criança e ao adolescente convivendo em ambientes coletivos; d) a criação de mecanismos de apoio ao “Projeto de Inclusão”; e) o fortalecimento das relações entre as crianças e adolescentes, as famílias, os profissionais e a comunidade, de maneira a possibilitar a participação desses segmentos no equacionamento de problemas e construção conjunta de soluções; e f) a definição de protocolos de procedimentos nas áreas da saúde e educação, à luz das ocorrências mais freqüentes nos ambientes educacionais.
Como se pode observar, a proposta de disciplina do tema, atualmente em fase de estudos no âmbito deste Executivo, calca-se em uma perspectiva de saúde como produto da qualidade de vida a partir de uma visão não fragmentada, delineada por uma ação intersecretarial voltada à construção de unidades educacionais promotoras de saúde, respondendo às demandas emergentes das diferentes regiões da Cidade, cuja concretização encontra-se hoje facilitada em decorrência da implantação das Subprefeituras, circunstância esta propiciadora da renovação de ações intersetoriais, mediante a atuação integrada dos gerentes locais da saúde e da educação. Dentro desse cenário é que se inclui a adoção de medidas pontuais com vistas à correção de anormalidades visuais, fonoauditivas e outras que venham a ser constatadas nos alunos da Rede Municipal de Ensino, razão primeira da inconveniência de se converter o projeto aprovado em lei, neste momento.
Nessas condições, em face da apontada inconstitucionalidade e da existência, no âmbito deste Executivo, de proposta muito mais abrangente para a matéria em questão, vejo-me na contingência de vetar integralmente a medida aprovada, devolvendo o assunto ao reexame dessa Egrégia Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.
MARTA SUPLICY
Prefeita
Ao Excelentíssimo
Senhor ARSELINO TATTO
Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo