CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 357/2002; OFÍCIO DE 9 de Janeiro de 2004

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 357/02

OF. ATL nº 033/04

Ref.: Ofício 18-LEG.3 nº 0742/2003

Senhor Presidente

Por meio do ofício referenciado, ao qual ora me reporto, Vossa Excelência encaminhou à sanção desta Chefia do Executivo cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara em sessão de 27 de novembro de 2003, relativa ao Projeto de Lei nº 357/02, de autoria dos Vereadores Atílio Francisco e Celso Jatene, que institui, na rede municipal de saúde, o Programa de Cirurgia Bariátrica e Gastrectomia Parcial.

Sem desmerecer os elevados propósitos que certamente nortearam os Parlamentares autores da propositura, vejo-me compelida a vetar, na íntegra, o texto aprovado, com fulcro no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Com efeito, e como a seguir se demonstrará, está a mensagem aprovada comprometida por evidente inconstitucionalidade e irremediável ilegalidade, além de se mostrar contrária ao interesse público.

É de se aduzir, por primeiro, que o texto trazido à sanção versa sobre a instituição, na rede municipal de saúde, do chamado Programa de Cirurgia Bariátrica e Gastrectomia Parcial, que visa a atender, de modo integral, aos portadores de obesidade mórbida. O artigo 2º do referido texto chega, inclusive, a determinar que as autarquias hospitalares do Município constituam equipes multidisciplinares, a serem integradas por profissionais de saúde de diversas áreas, objetivando o diagnóstico, a avaliação clínica, a indicação cirúrgica e o acompanhamento, pré e pós-operatório, da obesidade mórbida.

Ao dessa forma dispor, a propositura incorre claramente em vício de iniciativa. De fato, o impulso oficial para legislar sobre serviço público – como o é aquele de que trata a mensagem aprovada – é privativo do Prefeito, “ex vi” do disposto no artigo 37, § 2º, inciso IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Assim, se no particular a competência é exclusiva da Chefia do Executivo Municipal, tem-se que a mensagem em causa transgride o princípio constitucional de independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Constituição Federal e reproduzido no artigo 5º da Carta Estadual e no artigo 6º da Lei Orgânica do Município.

Efetivamente, ainda que louvável o intuito da propositura, claramente correlacionado à prestação de amplo atendimento aos portadores de obesidade mórbida, a verdade é que, ao assim dispor, o texto aprovado extrapola as competências do Legislativo, restando configurada inegável invasão de área típica de atuação do Executivo.

Essa invasão cristalinamente se caracteriza inclusive pelo teor dos comandos que a mensagem contempla. De fato, atos concretos e específicos de administração, voltados a objetivos imediatos e especiais, integram o texto aprovado, que impõe ao Poder Público Municipal diversas obrigações, até mesmo a de constituir, no âmbito das autarquias hospitalares do Município, equipes multidisciplinares, integradas por profissionais de diversas áreas.

Ora, na esfera municipal, o planejamento, a organização e a direção de serviços públicos são tarefas – e mais do que isso – são atribuições dos órgãos públicos municipais, que detêm a competência legal sobre a matéria.

Em suma, as obrigações impostas pelo texto cuja sanção se pretende configuram verdadeira ingerência no poder autônomo do Executivo, ao qual cabe expedir orientações para a prática de atos administrativos de sua exclusiva competência, como são aqueles, remarque-se, que versam sobre serviços públicos.

Demais disso, para a Administração Municipal, o cumprimento do referido texto representaria assumir encargos de significativa expressão, com reflexos, como é óbvio, nos aspectos orçamentário e financeiro.

Com efeito, a cirurgia de obesidade mórbida é um procedimento de alta complexidade. Em São Paulo, apenas alguns hospitais credenciados pelo SUS, como a Beneficência Portuguesa, o Hospital das Clínicas e o Hospital Santa Marcelina, o realizam, não apresentando, no momento, os Hospitais Municipais, condições estruturais para tanto.

É que, como o próprio texto prevê, não se trata, tão-só, de realizar o procedimento cirúrgico. Mais do que isso, exige-se que toda uma equipe multidisciplinar acompanhe o paciente, até seu completo restabelecimento, que dependerá de se conferir atenção a diversos aspectos da saúde, em variadas áreas, como as de cardiologia, endocrinologia, fisioterapia, saúde mental, nutrição, assistência social.

Como deflui do exposto, a implementação das medidas constantes da mensagem acabaria por onerar os cofres municipais, demandando não desprezível montante de verbas. O evidente aumento de despesas de tanto decorrente não conta, todavia, com a correspondente indicação de recursos, o que configura hipótese francamente em desacordo com a Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000, em seus artigos 15 e 16.

Ademais, é imperioso destacar que o dispêndio de tais recursos far-se-ia sem benefício da maioria da população atendida pelos serviços de saúde do Município, o que não se coadunaria com o interesse público.

Evidentemente, não se está aqui a desmerecer a importância e os cuidados médicos que aos indivíduos portadores de obesidade mórbida devam ser dispensados. No entanto, a parcela da população clinicamente diagnosticada como portadora de tal enfermidade não é expressiva ao ponto de impor, ao Município, ônus e obrigações de tal envergadura.

Por conseguinte, em que pese seu nobre intuito, o texto aprovado, além de eivado de insanáveis vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade, desatende ao interesse público, razões pelas quais vejo-me na inarredável contingência de, na íntegra, vetá-lo, o que faço com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Em assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara, que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo.

Por oportuno, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao

Excelentíssimo Senhor

ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo