Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 267/02
OF ATL nº 636/03
Senhor Presidente
Tenho a honra de acusar o recebimento do Ofício nº 18/Leg 3/0554/2003, com o qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica de lei decretada por essa Egrégia Câmara, nos termos do inciso I de seu artigo 84, relativa ao Projeto de Lei nº 267/02, de autoria do nobre Vereador Claudio Fonseca, o qual altera dispositivos da Lei nº 13.332, de 2 de abril de 2002.
Sem embargo dos meritórios propósitos que nortearam seu ilustre autor, impõe-se veto total ao texto aprovado, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, nos termos das considerações a seguir aduzidas.
A mensagem aprovada altera a lei supracitada para o fim de modificar o horário de funcionamento dos semáforos existentes em cruzamentos ou seções de vias localizados no Município de São Paulo, de forma intermitente no estágio amarelo, no período compreendido entre 22 e 5 horas do dia seguinte, observando-se o limite máximo de velocidade de 40 Km (quarenta quilômetros) por hora; exclui dessa exigência os semáforos instalados nas vias cujo porte e limite de velocidade permitidos indiquem que a medida possa causar periculosidade ao trânsito de veículos, assegurando, nessa hipótese, a alternância entre o vermelho e o verde em intervalos máximos de 40 (quarenta) segundos e, por fim, incumbe ao órgão competente do Executivo definir e classificar, com base em dados próprios, os semáforos aos quais corresponderão as medidas que determina.
Com efeito, a propositura incorre claramente em vício de iniciativa, versando sobre serviço público, cujo impulso oficial para legislar é privativo do Prefeito, “ex vi” do disposto no artigo 37, § 2º, inciso IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Dispõe, ademais, sobre matéria típica de administração de bens públicos municipais, igualmente de competência exclusiva da Chefia do Executivo, por força da norma prevista nos artigos 70, inciso VI, e 111, ambos da Lei Maior Local.
Inquestionável, portanto, que a mensagem, maculada pelo vício de iniciativa, transgride o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Constituição Federal e reproduzido no artigo 5º da Carta Estadual e no artigo 6º da Lei Orgânica do Município.
A par disso, ao regular assunto afeto à gestão administrativa municipal, relacionada ao funcionamento de semáforos, de natureza eminentemente técnica e de competência exclusiva de órgãos específicos do Executivo, a mensagem reveste-se de flagrante contrariedade ao interesse público, não apenas por adotar medidas inadequadas como também por propiciar maior risco de acidentes.
Inicialmente, cabe ressaltar que estudos técnicos e estatísticos realizados pela Companhia de Engenharia de Tráfego – CET e pelo Departamento de Operação do Sistema Viário – DSV da Secretaria Municipal de Transportes concluíram que a operação de semáforos em amarelo intermitente, durante a madrugada, resulta inviável em grande parte dos locais, por elevar consideravelmente o potencial de risco de acidentes, demandando, portanto, criteriosa análise, razão pela qual, após vistorias ocorridas nesse período, tem sido retirado o amarelo intermitente de determinados pontos.
Desse modo, é forçoso inferir que a generalização da medida revela-se de alto risco, valendo lembrar que há inúmeros cruzamentos na Cidade que não apresentam boa visibilidade para o motorista, bem como outros cujas vias pertencem a níveis hierárquicos semelhantes, nos quais os motoristas tendem a considerar-se sempre na preferencial, e ainda aqueles que atravessam vias que permitem velocidade alta, o que desaprova a adoção da providência em questão.
Por outro lado, cumpre assinalar que o Município conta com 423 (quatrocentos e vinte e três) semáforos operando em amarelo intermitente durante a madrugada, em locais apontados como viáveis. Desses, somente cerca de 2% (dois por cento) iniciam a operação após as 22 horas, sendo que a quase totalidade inicia o intermitente após a meia-noite.
O motivo dessa distribuição reside no fato de que somente é possível recorrer a esse tipo de funcionamento nos horários em que tanto o fluxo de veículos como o de pedestres passam a ser bem reduzidos. Antes da meia-noite, contudo, ainda há volume bastante intenso de veículos e pedestres em muitas regiões da cidade, decorrente de atividades escolares, de trabalho e de lazer. Por isso, a implantação de amarelo intermitente nessas circunstâncias resultaria em situações de congestionamento e aumento do potencial de acidentes, inclusive atropelamentos.
Ademais, é necessário ponderar que, numa metrópole do porte de São Paulo, o horário de início da operação intermitente deve ser flexibilizado em função das particularidades próprias de cada região da cidade e das características específicas dos diferentes dias da semana, não comportando fixação rígida em disposição de lei, como consta do texto aprovado. Assim, por exemplo, em semáforos próximos a centros de divertimento, o início da operação, às sextas-feiras e sábados, ocorre freqüentemente em horário mais tardio do que nos demais dias da semana.
Destarte, como a medida proposta não admite adequação do horário de início da operação às especificidades de cada local, a conseqüência direta de sua adoção é a eliminação da programação em amarelo intermitente em quase todos os 423 (quatrocentos e vinte e três) sinais semafóricos que já operam dessa forma, mas em horários variáveis.
A par disso, observa-se que nem a ressalva constante do parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 13.332, de 2002, com a redação que o texto aprovado pretende lhe conferir, possibilita sanar os inconvenientes resultantes da adoção desse procedimento.
Atualmente, em nosso município, há cerca de 1.000 (mil) semáforos que são controlados por equipamentos antigos, nos quais não é possível programar amarelo intermitente nem variar a duração dos tempos de verde e amarelo ao longo do dia. Disso decorre que, se mantida a medida aprovada, tais sinais de trânsito deveriam, obrigatoriamente, operar com tempos diminutos, mesmo nos horários de pico durante o dia, o que, a toda evidência, acarretaria considerável transtorno e problemas graves de fluidez e até mesmo de segurança de trânsito.
Outro aspecto relevante a salientar é que, em muitas avenidas da cidade, o fluxo de veículos ainda é muito elevado após as 22 horas, como, por exemplo, no cruzamento da Avenida Paulista com a Rua Augusta, em que o tempo de ciclo, nesse período, é de 144 segundos, dos quais a Av. Paulista recebe 92 segundos do sinal verde. Para que os motoristas da Rua Augusta não tivessem mais de 40 segundos de sinal vermelho, a Av. Paulista teria que operar com apenas 18 segundos de verde, pois os outros 22 devem ser, necessariamente, programados como intervalos de segurança, sem possibilidade de redução, sendo assim distribuídos: 14 segundos para a travessia de pedestre, 4 segundos de amarelo para a avenida e 4 segundos de vermelho de segurança 2 segundos para a Av. Paulista e 2 para a Rua Augusta.
Ora, destinar apenas 18 segundos para a Av. Paulista é medida absolutamente inviável, que causará imenso congestionamento em toda a região.
Com efeito, se o intuito da propositura é “criar condições de menos riscos aos motoristas que transitam à noite pela Cidade e estão expostos à incidência de crimes”, como afirma seu autor na justificativa do projeto de lei, é evidente que seu resultado será exatamente o contrário, gerando graves prejuízos a motoristas e pedestres, quer no tocante à fluidez do trânsito e à segurança viária, quer no que se refere ao aumento de risco de assaltos e outros crimes, sabidamente de maior incidência no trânsito congestionado.
Finalmente, é imperioso lembrar que a Prefeitura do Município de São Paulo vem adotando outras alternativas visando garantir mais segurança e tranqüilidade no trânsito para a população, durante a madrugada, quais sejam:
a) a programação de tempos de sinal vermelho mais curtos, com cerca de 20 (vinte) segundos, que tem trazido bons resultados, já implantada em cerca de 700 (setecentos) cruzamentos e em fase de implantação em aproximadamente mais 400 (quatrocentos);
b) a instalação de botoeiras de pedestres, também já presentes em muitos semáforos, as quais eliminam paradas inúteis dos veículos;
c) a instalação de laços detectores em transversais, que permitem a abertura do semáforo pelo tempo suficiente para o veículo passar e dependem da progressiva modernização dos equipamentos controladores dos semáforos;
d) a implantação do Projeto CTA (Semáforos Inteligentes), já efetivada aproximadamente 1.000 (mil) cruzamentos, reduzindo os tempos de sinal vermelho ao necessário para atender a demanda de veículos.
Destarte, as razões ora aduzidas impedem-me de acolher o texto vindo à sanção, compelindo-me a vetá-lo integralmente, por sua irremediável inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, com fulcro no disposto no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, sem olvidar a nobre intenção que o norteia.
Assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo.
Na oportunidade, reitero a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e da mais distinta consideração.
MARTA SUPLICY
Prefeita
Ao
Excelentíssimo Senhor
ARSELINO TATTO
Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo