Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 202/10
Ofício ATL nº 122/10
Ref.: Ofício SGP-23 nº 02461/2010
Senhor Presidente
Reporto-me ao ofício referenciado, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara, na sessão de 11 de agosto de 2010, relativa ao Projeto de Lei nº 202/10, de autoria do Vereador Carlos Apolinário, que “dispõe sobre a obrigatoriedade de se utilizar pulseira com sensor eletrônico sonoro para identificação e segurança de recém-nascido, nos hospitais e nas maternidades públicas e privadas na cidade de São Paulo”.
Em que pese o elevado intuito norteador da iniciativa, a propositura não reúne condições de ser convertida em lei, sendo indeclinável seu veto total, na conformidade das razões a seguir aduzidas.
De início, destaca-se que a medida relaciona-se mais com a questão da segurança do que propriamente com a identificação dos recém-nascidos. Com efeito, a Justificativa apresentada pelo Vereador evidencia essa índole, de modo claro, ao dizer que o projeto de lei apresentado consiste em nova contribuição à luta para reverter a atual situação de insegurança das maternidades.
Nesse particular, é preciso considerar, de pronto, que somente mediante a utilização de sistemas tradicionais de vigilância – com a competente e constante instrução técnica e operacional de funcionários e profissionais de saúde dos centros obstétricos e maternidades – garantir-se-á a segurança dos recém-nascidos e suas mães nos recintos hospitalares. De fato, mostra-se questionável atribuir a um dispositivo eletrônico de alarme sonoro, aplicado ao corpo da criança, a possibilidade, ainda que complementar, de se constituir no fator impeditivo de possíveis sequestros ou trocas de bebês, uma vez que a colocação de pulseiras de identificação, quaisquer que sejam, está atrelada, sempre e necessariamente, à correta atuação dos referidos funcionários.
Com vistas a verificar a existência das cogitadas pulseiras, bem como a viabilidade de seu uso, a Secretaria Municipal da Saúde encaminhou consulta à Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA — que detém as competências decorrentes do artigo 200 da Constituição Federal, exercidas nos termos da Lei Federal nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999, no sentido de “regulamentar, controlar e fiscalizar os produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública” —, perguntando se é obrigatória, nos termos da legislação federal pertinente, a aprovação, por parte daquela agência, para uso hospitalar em geral e, de modo especial, em crianças recém-nascidas, de produtos que atendam à especificação “pulseira de identificação com sensor eletrônico sonoro”. Indagou, também, se há algum produto cadastrado com tal especificação.
Em resposta, a ANVISA, por meio de sua Gerência-Geral de Tecnologia e Produtos para a Saúde, informou que as pulseiras de identificação de pacientes estão sujeitas a aprovação e cadastro perante a referida agência, não tendo sido localizado, em pesquisa no respectivo banco de dados, nenhum cadastro de pulseira de identificação com sensor eletrônico sonoro. Portanto, não está disponível no mercado nacional qualquer produto, de fabricação brasileira ou estrangeira, registrado e aprovado pela ANVISA, que atenda às exigências da propositura, restando, em consequência, impossibilitado o cumprimento da medida alvitrada.
A aprovação mencionada, além de obrigação legal, justifica-se pelo fato de que o aparelho ficará preso diretamente sobre o corpo do recém-nascido, em contado com a pele, devendo ser seguro para a saúde. O produto de alarme sonoro hoje existente e já amplamente utilizado no mercado destina-se a mercadorias, não a pessoas. Trata-se de dispositivo feito de material rígido, com partes metálicas perfurantes, com risco de ferimentos se usado junto ao corpo. A par da possibilidade de ocorrência de lesões na pele dos bebês, verifica-se que, pelo fato de o aparelho funcionar com ondas de rádio, não se descarta eventual interferência nos equipamentos hospitalares, afetando seu perfeito funcionamento, trazendo também riscos ainda não avaliados conclusivamente no tocante à fisiologia humana.
A Coordenadoria da Rede de Proteção à Mãe Paulistana apontou, além dos citados problemas com o material, as dificuldades no ajuste do tamanho das pulseiras, as quais também não podem ser submersas, destacando, ainda, óbices concernentes à viabilização das barreiras eletrônicas na estrutura física dos hospitais e o alto custo nessa implantação. Informou, também, que algumas maternidades particulares da cidade de São Paulo estudaram a tecnologia em comento, tendo constatado sua inviabilidade técnica e de implantação.
Observe-se que, embora essa tecnologia possa vir a ser uma inovação na segurança dos neonatos, atualmente são adotados procedimentos para garanti-la, como, por exemplo, pulseiras de identificação com código de barras para a mãe e para o bebê, monitores nos quartos com transmissão diuturna do berçário, além do acompanhamento da movimentação dos recém-nascidos e pacientes por seguranças, enfermeiras e profissionais dos hospitais.
Disso tudo se conclui ser prematura a adoção da medida cogitada, uma vez que necessita de exaustivos estudos, pesquisas e testes, e, finalmente, da aprovação da ANVISA. Assim sendo, se sancionada, a propositura viria a subverter a ordem estabelecida na legislação nacional, incorrendo em inconstitucionalidade e ilegalidade, bem como em contrariedade ao interesse público, ao obrigar entidades públicas e privadas a introduzir em seus sistemas de vigilância aparelho não aprovado pela agência federal.
Nessas condições, evidenciadas as razões que me levam a vetar integralmente o projeto aprovado, nos termos do § 1º do artigo 42 da lei Orgânica local, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo