Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 201/08
OF. ATL nº 39/09
Ref.: Ofício SGP-23 nº 00116/2009
Senhor Presidente
Reporto-me ao ofício em referência, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia da lei decretada por essa Egrégia Câmara, relativa ao Projeto de Lei nº 201/08, de autoria do então Vereador Farhat, que cria o Museu do Bairro, no âmbito de todas as Subprefeituras do Município de São Paulo.
O texto cria 31 museus, ou seja, 31 órgãos públicos, com a finalidade de registrar a “história dos moradores dos bairros e da região do Município de São Paulo”, tendo por objetivos: a constituição de centros de estudos e pesquisas para desenvolver acervo de material sobre a história do bairro; formar banco de dados destinado a registrar e manter à disposição dos moradores, entidades e instituições, os dados históricos do bairro e da região; elaborar documentários e pesquisas sobre o processo de mudanças urbanas, socioeconômicas e culturais do bairro; realizar palestras e exposições em locais públicos para demonstrar os produtos organizados pelos moradores; incentivar e promover a publicação de revistas e impressos de divulgação popular, inerentes aos objetivos básicos do museu, através de um centro editorial; colaborar com o intercâmbio entre os resultados alcançados nas pesquisas com as demais Subprefeituras; programar exposições e mostras especializadas; celebrar convênios e acordos com entidades congêneres; instalar e desenvolver biblioteca, discoteca, videoteca e cinemateca especializadas. Determina, finalmente, que o Poder Executivo disponibilize espaço físico, bem como recursos humanos e materiais para o pleno funcionamento dos museus.
A proposta aprovada determina a efetivação de medida que impõe às Subprefeituras pesadas atribuições e encargos que demandarão vultosos recursos humanos e materiais para a adoção das mais diversas providências necessárias à sua implantação, incorrendo, assim, em vício de iniciativa, em razão de ser matéria de competência privativa do Chefe do Executivo, nos termos do artigo 69, inciso XVI, da Lei Orgânica Municipal. Também pressupõe a existência de verbas, importando expressivo aumento de despesas, sem a indicação dos correspondentes recursos, em desacordo com o artigo 25 da Constituição do Estado de São Paulo e com a Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000, em seus artigos 15 a 17.
Impende ressaltar que o projeto de implantação de um museu deve, necessariamente, levar em conta todas as suas necessidades em relação a recursos humanos e materiais, com vistas a contemplar determinadas funções, tais como reconhecimento, guarda, preservação, restauro e divulgação do patrimônio histórico, cultural e ambiental, com as finalidades de resgatar, preservar e difundir a memória social. Para tanto, e como instituição permanente da Sociedade, o museu deverá desenvolver trabalhos sistemáticos de forma a coletar, adquirir, custodiar, classificar, catalogar, armazenar e divulgar os acervos sob sua responsabilidade. São tarefas, como se vê, que demandam recursos, difíceis de se estimar em um primeiro momento, mas, certamente, significativos, porque proporcionais à multiplicidade das atribuições descritas na propositura.
Quanto ao mérito da medida, cabe observar sua desnecessidade, uma vez que o Município já conta com o Museu da Cidade de São Paulo. Sua disciplina normativa consta do Decreto nº 44.470, de 8 de março de 2004, que dispõe ser tal equipamento cultural destinado a implantar e desenvolver processos museológicos inerentes à identificação, estudo, conservação, documentação, exposição e ação sócio-educativo-cultural das expressões patrimoniais do Município.
Esse museu consiste numa rede de casas históricas formada por antigas construções dos séculos XVII ao XIX, tais como Casa do Bandeirante, Casa do Sertanista, Capela do Morumbi, Sítio Morrinhos, Casa do Tatuapé, que representam remanescentes da ocupação das áreas rural e urbana, e edificações do século XX, quais sejam, o Monumento à Independência e a Casa Modernista. Tais imóveis, desde sua transferência aos cuidados da Secretaria Municipal de Cultura, assumiram a vocação de lugares da memória coletiva e passaram a abrigar atividades culturais e museológicas que, somadas ao seu interesse histórico, valorizam o patrimônio cultural paulistano, incluindo naturalmente a história dos bairros e suas identidades particulares ao longo do tempo.
A respeito do tema é de se destacar o trabalho da Divisão de Iconografia e Museus do Departamento do Patrimônio Histórico, que efetua o registro periódico do processo de mudanças urbanas, reunindo importante acervo de história oral, em mais de 500 horas de depoimentos que preservam a memória paulistana mediante gravações de “oficinas de memória” e entrevistas realizadas constantemente com moradores residentes nos vários bairros paulistanos. Também há um rico acervo fotográfico com mais de 600 mil imagens, que retratam a cidade e suas transformações nos últimos 145 anos. Mencione-se também a coleção de bens móveis, o acervo etnográfico, representativo do patrimônio cultural de algumas etnias indígenas do país, e o arqueológico, decorrente de pesquisas realizadas pelo Centro de Arqueologia de São Paulo.
Diante do exposto, configura-se, por igual, a contrariedade ao interesse público, por serem desnecessários os cogitados museus, ante a existência de estruturas já implantadas com os mesmos propósitos do projeto aprovado, as quais se encontram em pleno funcionamento, em constante ampliação e atualização.
Nessas condições, evidenciados os óbices constitucionais, legais e de contrariedade ao interesse público que me levam a vetar integralmente a propositura, nos termos do § 1º do artigo 42 da lei Orgânica local, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo