CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 169/2003; OFÍCIO DE 24 de Dezembro de 2003

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 169/03

Ofício nº 18/Leg.3/0738/2003

Senhor Presidente

Por meio do Ofício nº 18/Leg.3/0738/2003, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 169/03, de autoria do Vereador Domingos Dissei, aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão 27 de novembro do corrente ano, que objetiva proibir a veiculação, em vias e logradouros, de peças publicitárias que utilizem imagens sexuais como atrativo.

Entretanto, não obstante os meritórios propósitos que certamente nortearam o seu autor, a medida não reúne condições para ser convertida em lei, ante sua inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, na conformidade das razões adiante aduzidas, pelo que se lhe impõe o veto total com fundamento nas disposições contidas no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica deste Município.

Impende observar, por primeiro, que, em consonância com o artigo 22, inciso XXIX, da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre propaganda comercial, não podendo o Município, pois, dispor acerca dessa matéria, sob pena de restar caracterizada a usurpação de competência constitucionalmente atribuída a outro ente da Federação, em evidente afronta ao princípio federativo preconizado pelo artigo 1º da Magna Carta.

Ainda sob o prisma constitucional, deve-se considerar que, na prática, a edição da pretendida lei configuraria forma de censura a exercício de atividades na área de comunicação, o que é vedado pelo artigo 5º, inciso IX, do Texto Maior, segundo o qual é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

Comentando esse dispositivo, destacou o constitucionalista CELSO RIBEIRO BASTOS a seguinte lição de Canotilho:

“A colocação da proibição da censura no artigo respeitante à liberdade de expressão e informação, e não nos artigos referentes à liberdade de imprensa, significa que a proibição constitucional é de âmbito geral. Extensional e intencionalmente, a proibição de censura aplica-se a toda e qualquer forma de expressão e informação e não apenas à que tem lugar através dos meios de comunicação social”. (Comentários à Constituição do Brasil, Editora Saraiva, 1989, p.60)

Mas não é só. Tão grande foi a preocupação do País em afastar a censura na área da comunicação social que o “caput” do artigo 220 da Constituição de 1988 encerra comando prevendo que a manifestação de pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão restrição.

De outra parte, não se pode perder de vista que o exercício do poder de polícia local, relativamente ao assunto em foco, limita-se a regulamentar a afixação de cartazes, anúncios e demais instrumentos de publicidade, consoante preceitua o artigo 160, inciso V, de sua Lei Orgânica, matéria atualmente tratada pela Lei nº 13.525, de 28 de fevereiro de 2003, que dispõe sobre a ordenação da paisagem para a veiculação de anúncios visíveis a partir de logradouros públicos no território do Município de São Paulo, nada se referindo ao conteúdo desses anúncios.

Como se vê, acha-se a normatização pretendida eivada de vício de ilegalidade, visto desbordar os limites da competência nessa área atribuída ao Município por sua própria legislação, ficando reforçada, assim, a necessidade de veto.

Não bastassem esses argumentos de ordem constitucional e legal, a mensagem aprovada também contraria o interesse público por dispor sobre assunto que envolve valores éticos e morais de difícil contorno e objetividade, dificultando sobremaneira a fiscalização do seu cumprimento, vez que nem sempre será possível identificar, de forma imparcial e segura, se determinada exposição publicitária tem ou não cunho erótico ou pornográfico, inviabilizando a aplicação da lei.

Acresce dizer, por outro lado, que hoje no Brasil os abusos cometidos na área da comunicação social vêm sendo coibidos com extrema eficácia pelo Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária – CONAR, sociedade civil sem fins lucrativos constituída com o objetivo de, dentre outras atribuições, zelar pela comunicação comercial sob todas as formas de propaganda, fazendo observar as normas do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária, sempre visando esclarecer a opinião pública sobre a sua atuação regulamentadora de normas técnicas aplicáveis à publicidade comercial, assim entendida toda a atividade destinada a estimular o consumo de bens e serviços, bem como promover instituições, conceitos e idéias.

Ora, se tal sistemática, sob o comando da própria sociedade civil, vem funcionando a contento, mostra-se inconveniente e inoportuna qualquer tipo de ingerência estatal nessa área.

Por derradeiro, bom é dizer que, no âmbito do direito positivo, os casos mais graves poderão ser enquadrados no artigo 234 do Código Penal, o qual proíbe a exposição pública de escrita, desenho, pintura, estampa ou qualquer objeto obsceno.

Nessas condições, evidenciadas a inconstitucionalidade e a ilegalidade da mensagem aprovada, bem como a sua contrariedade ao interesse público, vejo-me compelida a vetá-la integralmente, devolvendo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao Excelentíssimo

Senhor ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo