Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 12/08
OF ATL nº 19/10
Ref. Ofício SGP 23 nº 04454/2009
Senhor Presidente
Nos termos do ofício referenciado, Vossa Excelência encaminhou a esta Chefia do Executivo cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara na sessão de 10 de dezembro de 2009, relativa ao Projeto de Lei nº 12/08, de autoria do Vereador Agnaldo Timóteo, que dispõe sobre a pintura obrigatória, pelo Poder Público, no âmbito do Município de São Paulo, de todos os quebra-molas e lombadas existentes nas vias de grande circulação ou cruzamentos considerados especialmente perigosos, a cada 6 (seis) meses, no mínimo.
O texto aprovado determina que a mencionada pintura deverá ser efetuada com tinta própria para a sinalização horizontal de solo, na cor amarelo-ouro, devendo possibilitar rápida visualização e identificação através de pintura na forma zebrada. Além disso, determina que o Poder Público deverá elaborar e publicar, até o dia 31 de janeiro de cada ano, uma lista de no mínimo mil quebra-molas ou assemelhados, levando em consideração o volume de tráfego e os acidentes ocorridos no local, que deverão receber a referida pintura.
Não obstante os meritórios propósitos de que se imbuiu o Parlamentar, vejo-me compelido a apor veto total à propositura, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, tratando-se, ademais, de matéria já completamente disciplinada no Município.
Preliminarmente, cabe lembrar que nos termos do artigo 22, inciso XI da Constituição Federal compete privativamente à União legislar sobre trânsito e transporte. No uso dessa competência foi editada a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro – CTB. Em seu artigo 5º o CTB instituiu o Sistema Nacional de Trânsito, que se constitui no “conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalidades”.
O Sistema Nacional de Trânsito é composto por diversos órgãos, dentre os quais se destacam – na esfera local – os órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição, competindo-lhes, nos termos do artigo 24, incisos II e III do citado diploma legal, “planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas”, bem como “implantar, manter e operar o sistema de sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário”.
A implantação de sinalização horizontal, como a prevista no projeto aprovado, constitui assim competência técnica específica, designada pelo Código de Trânsito para ser exercida pelos órgãos técnicos, sendo que no Município de São Paulo figuram o Departamento de Serviços Viários – DSV, da Secretaria Municipal de Transportes – SMT, e a Companhia de Engenharia de Tráfego – CET.
Além disso, por incidir sobre vias públicas, a propositura invade competência alheia, pois como consta dos artigos 70, inciso VI, e 111 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, compete à Chefia do Executivo a administração dos bens municipais. Deste modo, à evidência, a matéria relativa à análise técnica e consequente realização da pintura nos “quebra-molas e lombadas” não está dentre as competências da Câmara Municipal.
Diante disso, ao legislar sobre assuntos próprios da esfera privativa de competências do Poder Executivo, o texto vindo à sanção extrapola as atribuições do Legislativo, ferindo o princípio da independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Constituição Federal, artigo 5º da Constituição do Estado de São Paulo e artigo 6º da Lei Maior Local.
Sob outro ângulo de análise, é preciso considerar alguns problemas técnicos em que incorre a medida, inclusive no tocante à terminologia empregada. Como já salientado ao abordar o problema da competência do órgão executivo de trânsito, a sinalização horizontal obedece a parâmetros técnicos que impõem padronizações para todo o território nacional.
Por exemplo, no tocante à periodicidade de renovação do tratamento pictórico, o Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 80, assim dispõe: “sempre que necessário, será colocada, ao longo da via, sinalização prevista neste código em legislação complementar, destinada a condutores e pedestres, vedada a utilização de qualquer outra”. Desse modo, não cabe à lei municipal estabelecer o prazo de seis meses, ou qualquer outro, uma vez que é o órgão técnico que irá vistoriar o local e verificar se é o caso de renovação da pintura.
Essa pintura, de acordo com o informado pelo Departamento de Planejamento, Logística e Estudos Especiais da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET, é feita através de um processo de extrusão (material termoplástico com microesferas refletivas), implantado a quente, que possibilita a fusão da tinta no pavimento, permitindo maior durabilidade, tendo em vista o tráfego de veículos que sobre ela incide.
Quanto à cor empregada, diversamente do que a propositura impõe, o órgão técnico mencionado aduz que adota o disposto nas Resoluções do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN nº 160/2004, Anexo II, e nº 236/2007, que institui o Manual Brasileiro de Sinalização de Trânsito – Volume IV (Sinalização Horizontal), como documento técnico que visa a uniformização e a padronização da sinalização horizontal em todo o território do país. Apresenta, assim, normas específicas de sinalização de “ondulações transversais” contidas na Resolução nº 39/99 que dispõe como pintura obrigatória a “cor amarela refletiva” e sinalização vertical de advertência, entre outras especificações técnicas.
Do ponto de vista financeiro, finalmente, deve-se considerar que a CET não dispõe de recursos para a pintura nas condições impostas pela propositura, sendo um gasto desnecessário em face de outras solicitações mais urgentes que trariam melhores condições de segurança, fluidez e conforto aos usuários de forma geral. Ademais, tratando-se de projeto que impõe incumbências, os recursos para tanto necessários não estão previstos em dotações orçamentárias próprias nem foi previsto o impacto sobre as finanças públicas. Deste modo, a aprovação da medida implicaria ofensa à Lei de Responsabilidade Fiscal.
Por conseguinte, pelas razões expendidas, vejo-me compelido a vetar integralmente o texto aprovado, com fulcro no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.
Assim sendo, devolvo o assunto ao reexame dessa Egrégia Câmara, renovando a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo