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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 115/2008; OFÍCIO DE 30 de Maio de 2008

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 115/08

Ofício A.T.L. nº 129/08

Ref.: Ofício SGP-23 nº 1820/2008

Senhor Presidente

Nos termos do ofício referenciado, Vossa Excelência encaminhou a esta Chefia do Executivo cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara em sessão de 9 de abril de 2008, relativa ao Projeto de Lei nº 115/08, de autoria do Vereador Beto Custódio, que “dá nova redação ao art. 5º e inciso e ao § 1º do art. 9º da Lei nº 7.329, de 11 de julho de 1969, para permitir a inscrição no Cadastro Municipal de Empresas de Táxi de reabilitados criminais”.

A propositura, ao conferir nova redação aos referidos dispositivos legais, pretende substituir expressões neles atualmente constantes por outros termos, os quais permitiriam, consoante explicitado na Justificativa do projeto aprovado, ajustar o texto em vigor à Constituição Federal.

Para o exame da matéria é necessário o cotejo entre o texto atual e o proposto pelo projeto aprovado. A Lei nº 7.329, de 11 de julho de 1969, com alterações posteriores, estabelece normas para execução de serviço de transporte individual de passageiros em veículos de aluguel a taxímetro. Tal lei contém regramentos específicos para a pessoa jurídica que se constitui para exploração do serviço de táxi e para a pessoa física do condutor do veículo.

Quanto à primeira categoria, dispõe em seu artigo 5º, na parte sujeita a modificação pela propositura, que “a pessoa jurídica que pretender a permissão deverá promover, preliminarmente, sua inscrição no Cadastro Municipal de Empresas de Táxi, satisfazendo as seguintes exigências: ... III – Apresentar folha corrida de antecedentes criminais, relativamente a cada um dos sócios e, no caso de sociedade anônima, apenas dos membros da Diretoria e do Conselho Fiscal. § único No caso do item III deste artigo será negada inscrição, se constar condenação: a) por crime doloso; b) por crime culposo, se reincidente, num período de 3 (três) anos”.

Já no tocante ao condutor de táxi, novamente na parte a ser alcançada pelo projeto aprovado, o artigo 9º, inciso IV e § 1º apresentam atualmente a seguinte redação: “Para promover a inscrição no Cadastro, o interessado deverá satisfazer os seguintes requisitos: ... IV – apresentar folha corrida de antecedentes criminais;... § 1º No caso do item IV deste artigo será negada inscrição se constar condenação: a) por crime doloso; b) por crime culposo, se reincidente, até 3 (três) vezes, num período de 4 (quatro) anos”.

A propositura pretende alterar tais dispositivos, conferindo-lhes a seguinte redação: “Artigo 5º A pessoa jurídica que pretender a permissão deverá promover, preliminarmente, sua inscrição no Cadastro Municipal de Empresas de Táxis, satisfazendo as seguintes exigências: ... III – apresentar certidão de negativa do Distribuidor Criminal e da Vara das Execuções Criminais, relativamente a cada um dos sócios e, no caso de sociedade anônima, apenas dos membros da Diretoria e do Conselho Fiscal”. Também modifica a redação do inciso IV do referido artigo 9º, no seguinte teor: ”IV – apresentar certidão de negativa do Distribuidor Criminal e da Vara das Execuções Criminais”. Além disso, revoga os citados § único do artigo 5º e § 1º do artigo 9º.

Neste passo, é preciso salientar, nos termos da Justificativa e da ementa, que a intenção do vereador é “permitir a inscrição no Cadastro Municipal de Empresas de Táxi de reabilitados criminais”. Ou seja, objetiva-se a permissão para pessoas condenadas pela prática de crimes e que venham a ser reabilitadas, obviamente na forma da legislação penal e processual penal em vigor, tema que será abordado adiante.

Todavia, como se vê, o que efetivamente consta no texto aprovado é a troca da expressão em vigor “folha corrida de antecedentes criminais” pela equivalente “certidão negativa do Distribuidor Criminal e da Vara das Execuções Criminais”. Além disso, pela revogação do § único do artigo 5º e do § 1º do artigo 9º, passar-se-á a não admitir nenhum apontamento na certidão do distribuidor criminal, pois é determinado que tal certidão seja negativa. Essas novas normas irão tornar mais severos os requisitos para obtenção da autorização para operar o serviço de táxi.

Com efeito, conforme deflui do simples exame dos dispositivos legais transcritos, atualmente a legislação impõe limitação seletiva na inscrição de profissionais no cadastro municipal de condutores de táxi – CONDUTAX, e também quanto aos sócios de empresas de frota, detentoras de Termo de Permissão, visando que tais pessoas não apresentem em suas respectivas certidões condenações criminais, por crimes dolosos, ou ainda reincidência em condenações por crimes culposos. O objetivo dessa exigência é a proteção e promoção da segurança dos munícipes que se utilizam dos serviços prestados pelos taxistas de São Paulo. É que o uso de táxis tem como característica a escolha aleatória do prestador de serviços, baseada, via de regra, na disponibilidade do prestador na hora e no local em que o serviço é necessário, e não em fatores como conhecimento, habitualidade e confiança na pessoa do condutor.

Soma-se, aos fatores citados, a característica de que o serviço de transporte por táxi é praticamente o único meio de transporte de interesse público colocado à disposição dos usuários vinte e quatro horas por dia, sendo utilizado em horários avançados, do que decorre a necessidade imperiosa de selecionar com o devido critério os operadores do serviço, visando a segurança dos usuários.

Da leitura e análise do texto proposto, é possível verificar que, apesar das pretendidas modificações, permanece a limitação seletiva, para inscrição no cadastro, de profissionais que apresentem certidão positiva no tocante a condenações criminais. Ao substituir os detalhamentos especificados no § único do artigo 5º e no § 1º do artigo 9º pela expressão “certidão negativa”, a nova redação restringiu ainda mais a possibilidade de inscrição no referido cadastro. Os indivíduos que possuam condenações por crimes culposos, não reincidentes, e os que estejam sendo processados, ainda sem condenação criminal transitada em julgado, não satisfariam os requisitos impostos pelo inciso III do artigo 5º e pelo inciso IV do artigo 9º da Lei nº 7.329, de 1969, pois não estariam em condições de apresentar “certidão negativa”, mas somente certidão positiva, em que constariam apontamentos. Ao contrário, pela redação atual, tais pessoas estão aptas a proceder a sua inscrição no cadastro, sem maiores obstáculos.

De tal sorte, na contramão da intenção do legislador, a modificação do texto da lei em comento virá dificultar ainda mais a inscrição no sobremencionado cadastro. A Secretaria Municipal de Transportes informa que número expressivo de operadores atualmente nele inscritos tem algum tipo de condenação criminal relacionada a acidentes de trânsito, os quais, antes do advento do Código de Trânsito Brasileiro, davam ensejo a condenações pela conduta tipificada no § 6º do artigo 129 do Código Penal, ou seja, lesão corporal culposa. Diante disso, se a propositura viesse a ser sancionada, os operadores da categoria com apontamentos dessa ordem em suas certidões de distribuição e execução criminais ficariam impedidos de exercer suas atividades, as quais não encontram óbice atualmente porque os citados dispositivos da lei em vigor, em matéria de crime culposo, só excluem os que sejam “reincidentes”, com algumas distinções conforme o caso, se pessoa jurídica ou se pessoa física.

Retomando a problemática da reabilitação criminal, cabem algumas considerações de ordem doutrinária e legal. Seu conceito é “benefício que tem por finalidade restituir o condenado à situação anterior à condenação, retirando as anotações de seu boletim de antecedentes; ou, como conceitua Mirabete: ”é a declaração judicial de que estão cumpridas ou extintas as penas impostas ao sentenciado, que assegura o sigilo dos registros sobre o processo e atinge outros efeitos da condenação. É um direito do condenado, decorrente da presunção de aptidão social, erigida em seu favor, no momento em que o Estado, através do juiz, admite o seu contato com a sociedade” (Fernando Capez, Curso de Direito Penal, Editora Saraiva, 11ª ed., 2007, pág. 501).

A matéria é contemplada tanto na lei material quanto na processual. No Código Penal vem prevista nos artigos 93 a 95. No Código de Processo Penal é disciplinada nos termos dos artigos 743 a 750. Consoante ensinamentos de Fernando Capez, na obra citada, a reabilitação “suspende alguns efeitos da condenação; portanto, só cabe a reabilitação em existindo sentença condenatória com trânsito em julgado, cuja pena tenha sido executada ou esteja extinta”. Nessas circunstâncias, o interessado deverá requerer judicialmente tal benefício. Sendo deferido, seu resultado será o disposto no artigo 748 do Código de Processo Penal, qual seja, “a condenação ou condenações anteriores não serão mencionadas na folha de antecedentes do reabilitado, nem em certidão extraída dos livros do juízo, salvo quando requisitadas por juiz criminal”.

Como se percebe, se a pessoa for reabilitada criminalmente, sua folha de antecedentes estará livre de quaisquer anotações e, portanto, atenderá plenamente a legislação municipal no tocante às exigências previstas nos dispositivos que a propositura pretende modificar.

Em face das considerações já exaradas, verifica-se que a iniciativa é contrária tanto à legislação vigente quanto ao interesse público, a impor necessariamente seu veto, o que faço com fulcro no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Assim sendo, devolvo o assunto ao reexame dessa Egrégia Câmara, renovando a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.

GILBERTO KASSAB

Prefeito

Ao

Excelentíssimo Senhor

ANTONIO CARLOS RODRIGUES

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo