processo n° 2010-0.046.703-8
INTERESSADO: PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
ASSUNTO: Contrato entre Município, Estado e Sabesp para prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário.
Informação n° 841/2015-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
Assessoria Jurídico-Consultiva
Senhor Procurador Assessor Chefe
Trata-se de processo documental de acompanhamento do contrato de prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário no âmbito do Município de São Paulo (contrato este que, nos termos da Lei federal n° 11.107/05, poderia ser qualificado como contrato de programa), celebrado entre o Município, o Estado e a Sabesp (esta última na qualidade de prestadora dos serviços), após convênio de cooperação entre os entes federativos e autorização conferida pela Lei municipal n° 14.934/09.
Discute-se, nesta fase, parecer da consultoria jurídica da ARSESP de fls. 3.973/3.982 que, inobstante as dúvidas colocadas pela Superintendência da agência reguladora estadual, concluiu que não se pode desconsiderar o repasse contratual de 7,5% feito pela Sabesp ao Fundo Municipal de Saneamento Ambiental e Infraestrutura (FMSAI) como custo da prestação do serviço e que tal encargo deveria ser considerado para fins de revisão tarifária. Referida manifestação foi chancelada pela Procuradoria Geral do Estado, conforme fls. 3.983/3.990, segundo a qual não haveria impedimento para que o encargo contratual seja repassado à tarifa.
Os fundamentos apresentados para tal conclusão foram as seguintes:
- o encargo de 7,5% destinado, pela Sabesp, ao FMSAI não decorreu da vontade do governo estadual ou da direção da empresa, mas de dispositivo de lei municipal, a Lei 14.934, de 18/6/2009, que condicionou a celebração do contrato ao referido repasse. Apesar de ser legítima a previsão de tal encargo pelo Município, ele impacta a equação econômico-financeira do contrato e, portanto, deverá ser objeto de consideração para efeitos de revisão tarifária;
- a cláusula 48, §1°, d, do contrato de prestação de serviços, prevê textualmente que a ARSESP, a cada revisão tarifária, deverá assegurar que a Sabesp, no período subsequente, obtenha receita tarifária suficiente para, no mínimo, cobrir os encargos contratuais, inclusive o estabelecido na cláusula 35, "a" (que trata do encargo de 7,5%);
- a não consideração do encargo para fins de revisão tarifária e reequilíbrio contratual implicaria num subsídio da empresa à Prefeitura. O aumento tarifário derivado da consideração desse encargo poderia somente ser creditado ao Município, já que foi ele quem o criou.
O Município solicitou à d. assessoria jurídica de SGM manifestação sobre a questão, que exarou o parecer de fls. 4.138/4.152, no seguinte sentido:
- antes da celebração do contrato entre o Município, o Estado e a Sabesp, foram feitos estudos econômicos e financeiros, inclusive por renomada entidade independente, que concluíram que a tarifa então praticada era suficiente para arcar com todos os custos e encargos da concessionária, incluindo o encargo contratual de 7,5% destinado ao FMSAI, bem como garantir o lucro da concessionária e os investimentos necessários. De tal forma, quando da celebração do ajuste, o encargo contratual já havia sido considerado para a fixação da tarifa inicial, e foi constatado que havia um equilíbrio entre os ônus e os bônus;
- a manifestação da ARSEP se baseou num pressuposto errôneo, qual seja, o de que o encargo de 7,5% fora criado por lei municipal e passou a gerar um custo adicional para a contratada, enquanto, na verdade, a lei municipal apenas autorizou a celebração do convênio e do contrato, desde que fosse prevista, neste, contrapartida ao Município (tal como uma "outorga"). Portanto, o encargo foi criado pelo próprio contrato de programa, que a Sabesp voluntariamente firmou, após minuciosos estudos de viabilidade econômica que atestavam tratar-se de ajuste vantajoso (e que, conforme acima explanado, consideraram o encargo contratual);
o equilíbrio econômico-financeiro de um contrato, quando perturbado em virtude de eventos não tratados como risco contratada (como, por exemplo, o aumento de encargos), deve ser revisto, em procedimento de revisão tarifária, para que o equilíbrio inicial entre os bônus e ônus seja restaurado. A contrario sensu, encargos legais ou contratuais já existentes não podem dar ensejo ao reequilíbrio contratual, exceto se majorados ou reduzidos, o que não foi o caso. Assim, o aumento da tarifa para o repasse, para os consumidores, do encargo de 7,5%, já previsto e incorporado à tarifa no momento do ajuste, representa a violação à lei e ao contrato firmado.
Encaminhado, o processo, à Secretaria de Finanças, a Coordenadoria de Assuntos Econômicos se manifestou às fls. 4.155/4.160, esclarecendo que:
- a Deliberação ARSESP n° 484 aprovou a nota técnica n° RTS 004/2014 e autorizou um incremento de 5,4408% nas tarifas. Nos termos da nota técnica, os encargos decorrentes de imposições legais próprias das diferentes jurisdições deveriam ser cobrados por fora da tarifa e destacados nas faturas dos usuários. Entretanto, ela não foi conclusiva acerca do repasse ao FMSAI, previsto no contrato com o Município -- segundo a sobrecitada deliberação da ARSESP, tal pendência deverá ser resolvida definitivamente ao final do processo de revisão contratual;
- a conclusão do contrato com a Sabesp foi precedida de dois estudos de viabilidade econômica, um da FIPE e outro da Sabesp, sendo que ambos consideraram, dentre os encargos, os 7,5% que deveriam ser pagos pela empresa como contraprestação. Ambos os estudos foram conclusivos no sentido da existência de um equilíbrio tanto nas operações da Sabesp no Município como na região metropolitana. Daí porque teria havido interesse de ambas as partes em efetivamente celebrar o contrato;
- no mais, corroborou-se o parecer de SGM no sentido de que o reequilíbrio só se aplica a fatos supervenientes à data da celebração do contrato que impactem o seu equilíbrio inicial, razão pela qual não faria sentido o sem emprego para um encargo originalmente previsto no contrato e que foi considerado na análise do equilíbrio inicial.
A d. assessoria jurídica de SF apresentou o parecer de fls. 4.161/4.168, corroborando as manifestações anteriores de SGM/AJ e de SF/COAEC. Acrescentou que:
- cabe à Sabesp suportar a contrapartida de 7,5%, estipulada e anuída pela empresa em função das vantagens econômicas e financeiras que teve com a contratualização com o Município, sendo que, na época, a empresa já havia avaliado que a tarifa vigente seria suficiente para suportar tal encargo (fls. 593, 611/618), e que seria interessante economicamente a celebração do contrato;
- o equilíbrio econômico de um contrato deve ser avaliado no momento da sua celebração, e é esse equilíbrio que deve ser preservado ao longo da execução do contrato. No caso, não houve criação ou alteração do referido encargo. Ao revés: a proposta econômica apresentada pela Sabesp (fls. 823), que integra o Anexo III do contrato (e, portanto, o próprio contrato), faz expressa menção que a receita esperada é aquela que a empresa considerou necessária para cobrir todos os custos operacionais, tributos e outros encargos, investimentos e remuneração do custo de oportunidade do capital dos investidores;
- a cobrança do encargo de 7,5% por fora da tarifa - como sugerido na nota técnica da ARSESP após a manifestação da sua Procuradoria - implicaria numa dupla cobrança do mesmo valor, eis que tal encargo já foi considerado "por dentro" da tarifa, como ilustrado na proposta econômica da Sabesp, e nas tabelas de fls. 834 e 840 (e, consequentemente, num enriquecimento sem causa da prestadora do serviço);
- a nota técnica RTS 1/2014 da ARSESP (fls. 4.045- v) reconheceu que com o nível tarifário estabelecido, a Sabesp assumiu a responsabilidade pela realização de um plano de metas e de investimentos em cada Município, o que leva à conclusão de que os investimentos contratuais estavam contemplados pelas tarifas acordadas, mesmo para os Municípios cujo fluxo de caixa projetado para o período contratual apresentasse situação deficitária - o que seria compensado pelo esquema tarifário baseado em subsídios cruzados entre Municípios, o que garante o equilíbrio econômico-financeiro geral da concessionária. Como a prestação dos serviços no Município é superavitária, ela acaba por subsidiar as atividades da Sabesp nos demais Municípios, e não o contrário, como fizeram crer as manifestações jurídicas do Estado;
- a cláusula 48, §1°, "d", deve ser interpretada em conjunto com as cláusulas 52, f, e 53, "a", que tratam das revisões tarifárias, e dispõem que caberá o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato apenas "se houver posterior criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, quando comprovado o seu impacto";
- como se não bastassem todos os argumentos acima, o encargo de 7,5% destinado ao FMSAI ainda beneficia indiretamente a própria concessionária, eis que os recursos destinam-se ao investimento em saneamento ambiental, auxiliando o alcance das metas e resultados definidos no contrato;
- persistindo o entendimento do Estado, e sendo aplicado pela ARSESP em procedimento de revisão, caberá ao Município e aos órgãos de defesa dos consumidores e do patrimônio público e social adotar as medidas necessárias a fim de preservar os interesses da população paulistana.
Em seguida, o processo nos foi encaminhado, a pedido de SGM.
Diante das manifestações precedentes, que corroboramos, toma-se difícil acrescentar qualquer outro argumento, já esgotados pelos órgãos municipais oficiantes. Por tal razão é que fizemos questão de reproduzi-los integralmente acima, ainda que de forma sucinta.
A quantidade de argumentos esposados pelos órgãos municipais é diretamente proporcional à perplexidade que causa a proposta de considerar o encargo de 7,5% sobre a receita da concessionária, que ela deve destinar ao FMSAI, como elemento ensejador de reequilíbrio contratual, mesmo tendo sido tal encargo expressamente contemplado no ajuste original e considerado na modelagem econômica prévia ao contrato e na proposta de tarifa apresentada pela Sabesp.
Só podemos crer, com o devido respeito, que as manifestações estaduais olvidaram que a Sabesp não é mais o braço estadual para a execução direta do serviço de captação e distribuição de água e esgotamento sanitário, como ocorria outrora, mas sim uma empresa contratada por Municípios, ainda que por meio de contratos de programa, para a execução de serviços. A consultoria jurídica da ARSESP, na manifestação retromencionada, pressupôs, como data "inicial" para avaliação do equilíbrio contratual, o período anterior à celebração do contrato com o Município, quando a empresa estadual aqui executava o serviço sem qualquer relação contratual. Ocorre que, obviamente, o equilíbrio inicial de um contrato só pode ser avaliado no momento da sua celebração ou, no máximo, no momento da proposta. A partir do momento em que a Sabesp firmou contrato com o Município, ela concordou em arcar com todos os encargos previstos na cláusula 35, sendo remunerada pela tarifa então vigente para a região metropolitana (cf. cláusula 43). E o fez não porque foi obrigada, mas porque os estudos contratados anteriormente à contratação apontaram que era vantajosa a celebração do ajuste, mesmo considerando o encargo previsto na minuta de contrato que veio a ser firmada.
A confusão também parece derivar do fato da ARSESP efetuar o procedimento de revisão tarifária tendo como base o conjunto de regiões em que a empresa atua, e não as específicas localidades abrangidas pelos contratos de prestação de serviços celebrados com o Município de São Paulo e outros Municípios. Portanto, a avaliação feita pela ARSEP considera a prestação de serviços pela Sabesp como um todo. Ainda que este não seja o foro apropriado para questionar tal metodologia, o regulador, ao aplicá-la, não poderá desconsiderar as previsões contratuais contidas em cada ajuste que a Sabesp firmou com as Prefeituras dos diversos Municípios nos quais atua, nem que eventual reequilíbrio tarifário demandará a existência de eventos futuros não contemplados na equação econômica inicial.
Parece claro que a cláusula 48, §1°, "d" — ao prever que a ARSESP, a cada revisão tarifária, deverá garantir que a Sabesp obtenha receita tarifária suficiente para, no mínimo, cobrir suas despesas, incluindo os encargos contratuais (dentre os quais o de 7,5%) — não confere um mandato para que a ARSESP utilize os custos, despesas, investimentos e encargos previstos no parágrafo em questão, contemplados originalmente no contrato, como fatores de desequilíbrio contratual e elementos ensejadores de reequlíbrio.
A equação econômico-financeira de um contrato, portanto, deve ser assegurada tanto em benefício da contratante como da contratada, e só poderá ser modificada mediante aditivo contratual, com a anuência de todas as partes (vide cláusula 48, §4°). Assim, tendo sido o encargo de 7,5% um dos componentes da equação inicial (equivalência entre os bônus, ou seja, a remuneração, e os ônus, ou seja, as obrigações) um eventual acréscimo tarifário baseado em tal encargo originalmente contemplado importaria em violação ao contrato firmado. Basicamente, o Estado e a Sabesp estariam desprezando completamente todas as tratativas feitas com o Município nos idos de 2009/2010, bem como a repactuação (consensual) delas resultante, a qual desembocou no contrato ora analisado (o qual ajustou os encargos e obrigações da Sabesp aos ganhos que ela tinha com a exploração dos serviços na capital).
Daí porque, considerando o exposto nas manifestações precedentes, entendemos que o Município pode -- e deve - se insurgir contra a proposta da ARSESP ora analisada.
É como entendemos, sub censura.
São Paulo, 03/07/2015.
RODRIGO BRAGET MIRAGAYA
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP n° 227.775
PGM
.
De acordo.
São Paulo, 07/07/2015.
TIAGO ROSSI
Procurador Assessor Chefe - AJC
OAB/SP 195.910
PGM
.
.
processo 2010-0.046.703-8
INTERESSADO: PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SAO PAULO
ASSUNTO: Contrato entre Município, Estado e Sabesp para prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário.
Cont. da Informação n° 841/2015-PGM.AJC
SECRETARIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
Senhor Secretário
Encaminho, o presente, a Vossa Senhoria, com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral, que acompanho, que, corroborando as manifestações anteriores de SGM/AJ, SF/COAEC, e SF/ASJUR, concluiu pela impossibilidade do encargo de 7,5%, previsto no contrato de prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário firmado com o Estado de São Paulo e com a Sabesp, ser considerado como para efeitos de reequilíbrio econômico-financeiro em procedimento de revisão contratual.
.
São Paulo, 08/07/2015.
ANTÔNIO CARLOS CINTRA DO AMARAL FILHO
PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 162.363
PGM
.
.
processo n° 2010-0.046.703-8
INTERESSADA: PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
ASSUNTO: Contrato entre Município, Estado e SABESP para prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Proposta de inclusão do repasse de 7,5 ao FMSAI nas tarifas cobradas dos consumidores. Impossibilidade.
Informação n.° 1957/2015-SNJ.G.
SGM/G
Senhor Secretário
Encaminhamos o presente nos termos da manifestação da PGM/AJC, que acolhemos, a qual concluiu, na esteira dos pareceres precedentes da Assessoria Jurídica de SGM e SF, pela impossibilidade do encargo de 7,5% ao FMSAI previsto no contrato de prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário ser considerado para efeito de reequilíbrio econômico financeiro em procedimento de revisão contratual.
Sugerimos seja dada ciência destes pareceres aos membros do Comitê Gestor, bem como à SABESP e ao Governo Estadual.
.
São Paulo, 22/07/2015.
ROBINSON SAKYIAMA BARREIRINHAS
Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos
SNJ.G
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo