TID 9441873
INTERESSADO: Departamento Fiscal
ASSUNTO: Fração ideal - Cobrança de IPTU por meio de execução fiscal
Informação n°0637/2014-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA
Senhor Procurador Assessor Chefe
O Departamento Fiscal relata impasse decorrente da aplicação irrestrita da Lei municipal n° 14.125/05, regulamentada pelo Decreto 47.314/06, a execuções fiscais relacionadas a imóveis fracionados. Em resumo: conquanto a legislação municipal afaste a solidariedade e limite a responsabilidade tributária do titular do lote à "parte da dívida correspondente à sua fração"1, não haveria como, no âmbito da execução fiscal em que sê cobra a dívida integral relacionada à gleba da qual o lote deriva, levar-se a cabo tal regramento:
"(...) Some-se questão processual das mais relevantes: a inexistência de título executivo em face dos proprietários dos lotes-filhos, já que a Execução Fiscal está embasada em apenas uma CDA, que descreve a dívida global (e que contém, naturalmente, apenas os dados do lançamento original). O título executivo é o norteador do processo judicial de execução, assim este último, a meu ver, não se pode distanciar do que está inscrito na CDA, sob pena de se perder justamente a Característica executiva do título.
Ainda, como último ponto, também processual, surge a inviabilidade de se subverter o processo executivo proposto, para alcançar pretensão que se encontra fora dos limites definidos na petição inicial. O pedido constante da exordial é o de veicular a cobrança do tributo em face do proprietário do imóvel, pedido esse embasado em CDA que atesta o lançamento tributário do lote original. (...).
Como se nota, entendo inviável o cumprimento da legislação municipal relativa iis frações ideais nos autos da Execução Fiscal que cobra o lançamento do lote original." (fls; 36v°, 37)
Inicialmente cumpre lembrar que a possibilidade de pagamento administrativo de dívida ativa relativa à fração efetivamente titulada por devedor de tributo imobiliário foi instituída não só como imperativo de justiça social, mas também como oportuna medida de ordem prática: não houvesse tal possibilidade, a Fazenda estaria inibida de receber, ainda que parcialmente, crédito de dificílima concreção (inviável tanto a assunção integral da dívida por um devedor isolado, quanto a alienação judicial da gleba irreversivelmente transmutada em lotes). Não se debatem as vantagens do pagamento fracionado.
A dificuldade reside em tentar transportar para o âmbito judicial a solução prevista em lei municipal. Num primeiro momento pondera FISC que, a Administração, em princípio, "poderia continuar aceitando o pagamento das frações ideais por parte dos interessados em quitar sua parte proporcional da dívida do SQL ascendente, sem que isso impeça que, quanto aos demais devedores (que não pagaram administrativamente o devido em relação à sua fração), a responsabilidade pela dívida remanescente seja cobrada judicialmente de forma solidária. Haveria necessidade, para adoção desta solução, de alteração legislativa (salvo a hipótese de se entender pela prevalência do CTN sobre a legislação municipal)".
Já há, contudo, entendimento jurisprudencial que, harmonioso com a legislação municipal em vigor, restringe, em hipótese similar, o alcance do instituto da solidariedade previsto no art. 124 do CTN. Esse entendimento, se chancelado pelo Judiciário, tornaria desnecessária a alteração legislativa cogitada por FISC e evitaria os riscos — sobretudo o de reconhecimento de decadência — inerentes à efetivação de "novos lançamentos (ou ao menos novas notificações) em face dos responsáveis pelos lotes filhos, já contendo neles a identificação precisa do montante devido e a observação de se tratar de dívida originalmente constituída para o SQL ascendente", proposta subsidiária também sugerida por FISC.
A Primeira Turma do STJ, ao rejeitar o REsp n° 783.414 interposto pelo Município de São Paulo contra acórdão que limitara a solidariedade tributária à porção do imóvel titulada pelo executado, promoveu interpretação razoável do referido artigo 124 do CTN, concluindo que a transmissão da propriedade submetida a fracionamento — tal como nas hipóteses a que alude o art. 30 da Lei municipal n° 14.125/20052 - implica a transferência do dever tributário "proporcionalmente ao valor atinente à área da propriedade adquirida, razão pela qual resta inequivocamente afastada a solidariedade entre eles". Convém transcrever trecho do acórdão:
"(...) Entrementes, a questão debatida nos autos refere-se não à transferência do dever tributário aos adquirentes, o que é pacífico, mas à amplitude dessa responsabilidade, ou, em outros termos, à existência de solidariedade passiva tributária entre eles, uma vez que, de cada um dos ora recorridos, foi cobrado o valor total da dívida, a despeito de serem proprietários, cada um deles, de apenas 1/118 da área original, que pertencia, anteriormente, a um único proprietário. A solidariedade passiva é um instituto de direito civil aplicável a todos os ramos do direito, segundo o qual, em havendo pluralidade de sujeitos no pólo passivo de uma relação jurídica, cada um deles é obrigado à dívida toda, podendo o credor exigir de um ou alguns, parcial ou totalmente, a dívida em comum. Com efeito, em matéria tributária, a presunção de solidariedade opera inversamente àquela do direito civil, no sentido de que sempre que, numa mesma relação jurídica, houver duas ou mais pessoas caracterizadas como contribuinte, cada uma delas estará obrigada pelo pagamento integral da dívida, perfazendo-se o instituto da solidariedade passiva. Ad exemplum, no caso de duas ou mais pessoas serem proprietárias de um mesmo imóvel urbano, haveria uma pluralidade de contribuintes solidários quanto ao adimplemento do IPTU. Entrementes, no que pertine à responsabilidade tributária dos sucessores ou terceiros, a solidariedade não se presume, devendo resultar, necessariamente, de lei. Isto porque feriria a lógica jurídico-tributária a integração, no pólo passivo da relação jurídica, de alguém que não tenha tido qualquer participação na ocorrência do fato gerador da obrigação.
Acerca do instituto da solidariedade, o art. 124 do CTN prevê, verbis:
"Art. 124. São solidariamente obrigadas:
I- as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;
II - as pessoas expressamente designadas por lei.'
Nesse segmento, o 'interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal' - estatuído no inciso I, do preceito legal acima transcrito -impõe que as pessoas solidariamente obrigadas sejam sujeitos da relação jurídica que deu azo à ocorrência do fato imponível.
Todavia, o caso sub examine versa sobre propriedade horizontal, sendo cada impetrante proprietário de uma fração ideal, correspondente a 1/118 avos do terreno original, cada uma com um número de registro próprio junto à Municipalidade. Está-se diante de um condomínio edilício, direito real advindo da conjugação de dois outros direitos reais, quais sejam: a propriedade individual sobre unidades autônomas - cada uma das 118 garagens - e a co-propriedade sobre as partes comuns, nos termos do art. 1.331, do Código Civil. Nesse segmento, verifica-se que, à época da ocorrência do fato gerador do IPTU relativo aos exercícios de 1987 e 1988, o imóvel objeto da presente lide era tributado por inteiro, sendo sujeito passivo da relação jurídica a Liga das Senhoras Católicas, em nome da qual encontrava-se cadastrado o imóvel. Essa relação jurídica extinguiu-se no momento da transmissão da propriedade, a qual fragmentou-se em 118 unidades autônomas, que deram titularidade debitória a 118 novos contribuintes.
Destarte, cada um dos adquirentes tornou-se sujeito passivo de nova relação jurídica, assumindo a divida tributária pretérita proporcionalmente ao valor atinente à área da propriedade adquirida, razão pela qual resta inequivocamente afastada a solidariedade entre eles." (Rel. Min. Luis Fux, DJ à/4/2007)
Observadas tais premissas, e preliminarmente à deliberação desta PGM, sugiro encaminhar o presente a FISC consultando-se o Departamento acerca da viabilidade pratica de cobrar-se na execução original, já de cada devedor recalcitrante, o remanescente da dívida de IPTU na proporção de seu quinhão, preservado o modelo expresso na legislação municipal.
São Paulo, 06/05/2014
ANTONIO MIGUEL AITH NETO
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP n° 88.619
PGM
De acordo.
São Paulo, 06/05/2014
TIAGO ROSSI
Procurador Assessor Chefe - AJC
OAB/SP 195.910
PGM
1 Art. 1° O proprietário de lote que integre gleba em situação de débito, inscrito ou não na dívida ativa, perante a Municipalidade, não responderá solidariamente pelo débito, tornando-se responsável apenas pela parte da divida correspondente à sua fração. § 1º. Tratando-se de terreno ou imóvel construído, a fração a que se refere o "caput" deste artigo corresponderá ao percentual obtido da divisão do valor venal do lote resultante do desdobro fiscal pelo somatório dos valores venais dos lotes pertencentes à gleba, todos correspondentes ao exercício atual, de acordo com a seguinte fórmula: Fração individual da dívida = valor venal do lote desdobrado somatório dos valores venais dos lotes da gleba § 2º. O contribuinte deverá requerer a apuração do débito correspondente à sua fração individual na gleba à Secretaria Municipal de Finanças, à qual competirá o levantamento dos valores vencidos ainda não inscritos na Dívida Ativa e o encaminhamento ao Departamento Fiscal da Procuradoria Geral do Município da Secretaria Municipal dos Negócios Jurídicos, para a mesma finalidade quanto aos valores já inscritos na Dívida Ativa, podendo as providências de competência de ambas as Secretarias ser adotadas conjunta ou separadamente. § 3°. A emissão da Certidão Negativa de Tributos Imobiliários, referente ao lote desdobrado, está condicionada à quitação total do cíébito relativo a essa fração individualizada.
2 Art. 30. O proprietário de lote fiscal resultante de área maior já desdobrada, englobada ou remembrada, em situação de débito, inscrito ou não na dívida ativa, perante a Municipalidade, não responderá solidariamente pdo débito da área maior, tornando-se responsável apenas pela parte da dívida correspondente à sua fração.
TID 9441873
INTERESSADO: DEPARTAMENTO FISCAL
ASSUNTO: Fração ideal - Cobrança de IPTU por meio de execução fiscal
Cont. da informação n° 0637/2014-PGM.AJC
Senhor Diretor,
Preliminarmente à deliberação desta PGM, solicito manifestação desse Departamento conforme solicitado pela Assessoria Jurídico Consultiva desta Procuradoria Geral do Município.
Mantido o acompanhante.
São Paulo, 2014
ROBINSON SAKIYAMA BARREIRINHAS
PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 173.527
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo