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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 12.113 de 2 de Março de 2020

EMENTA N° 12.113
Espaço livre previsto em loteamento aprovado. Ocupação parcial por lotes lindeiros. Impossibilidade de aplicação do art. 69 da Lei Federal n. 13.465/17 e do art. 19 da Lei Municipal n. 15.720/13 (Ementa n. 11.773 - PGM-AJC).

Processo n° 2003-0.006.468-0

INTERESSADOS: Maria Izildinha Tavares Stanley e outro

ASSUNTO: Ação de usucapião. Proc. n. 629/00 - 2ª Vara de Registros Públicos.

Informação n. 286/2020 - PGM-AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhora Coordenadora Geral Substituta

Tratou o presente de ação de usucapião relativa ao imóvel situado na Rua Desidério Ferreira, n. 93.

Inicialmente a Municipalidade contestou o pedido, em razão de interferência com espaço livre do loteamento aprovado, inscrito e regularizado denominado Jardim Monte Kemel (fls. 101/105). No entanto, tendo sido depois excluída a interferência com próprios municipais, a Municipalidade manifestou sua concordância com o trabalho pericial (fls. 156/157), com base no qual a ação foi julgada procedente (fls. 160).

Encerrada a ação, passou o presente a cuidar da invasão da área pública lindeira (fls. 184), tendo sido considerada a eventual incidência do disposto no art. 69 da Lei Federal n. 13.465/17 e do art. 19 da Lei Municipal n. 15.720/13 (Ementa n. 11.773 - PGM-AJC), que se referem à regularização de parcelamentos irregular do solo implantados e consolidados anteriormente a 19.12.1979 (fls. 189).

SEHAB-CRF informou que o parcelamento em questão é, de fato, anterior a 1979, e que está integrado à cidade (fls. 197).

Por isso, DEMAP-12 propôs o arquivamento do expediente (fls. 200/201).

DEMAP-G solicitou a DEMAP-3 a análise dos lotes lindeiros ao referido espaço livre, por meio da comparação entre o levantamento GEGRAN e o MDC (fls. 203), o que foi providenciado (fls. 210/211).

Diante da diversidade das situações existentes no que diz respeito à observância da divisa entre os lotes e o espaço livre em questão, DEMAP formulou a esta Coordenadoria os seguintes quesitos: a) aplica-se a ementa n. 11.773 em detrimento da planta válida e averbada por SEHAB, de modo a prevalecer a situação de fato em relação aos lotes que já estavam implantados no GEGRAN e que não respeitavam, na época desse levantamento, o espaço livre em questão, mantendo-se inalterados quando comparados com o MDC? b) que tratamento deve ser atribuído aos lotes que sofreram alterações entre o GEGRAN e o MDC, que implicaram agravamento do desrespeito à divisa com o espaço livre? c) que tratamento deve ser atribuído aos lotes que não estavam implantados na época do GEGRAN e que não respeitam tal divisa, de acordo com o MDC? (fls. 212/216).

É o breve relatório.

Com o devido respeito ao entendimento contrário, não parece ser este um caso de aplicação da chamada regularização sumária, por força do disposto no art. 69 da Lei Federal n. 13.465/17 e no art. 19 da Lei Municipal n. 15.720/13, dispositivos cuja interpretação foi desenvolvida no parecer objeto da Ementa n. 11.773 - PGM.AJC.

Questiona-se, no caso presente, a aplicação de tal modalidade de regularização para o fim de entender consolidada, ex lege, a divisa entre lotes particulares e um espaço livre oriundo de parcelamento aprovado, inscrito e regularizado. Não se trata, portanto, da situação típica de regularização sumária, correspondente à estabilização da linha divisória entre lote e sistema viário, mas de uma possível preservação da divisa entre um espaço livre e lotes situados em uma mesma quadra.

Tal aspecto parece crucial para a análise do caso.

Com efeito, o entendimento objeto da Ementa n. 11.773-PGM-AJC tem como referência as irregularidades verificadas na implantação dos parcelamentos do solo. Em geral, são irregularidades verificadas no parcelamento do solo aquelas que impedem a expedição de uma declaração final de conformidade, feita após a realização das obras do parcelamento, no âmbito do chamado controle urbanístico sucessivo.

Vale lembrar, a propósito, que, em um primeiro momento, o parcelamento é aprovado, definindo-se, assim, um determinado plano de urbanização (controle prévio). Depois disso, iniciam-se as obras, que podem e devem ser fiscalizadas pelo Município no curso de sua execução (controle concomitante). Por fim, encerradas as obras, cabe ao Município declarar sua conformidade com o plano original (controle sucessivo). Se, em algum momento do desenvolvimento da atividade de parcelamento, ocorre o descumprimento de normas legais ou de exigências impostas no âmbito do licenciamento ou da fiscalização, o parcelamento passa à condição de irregular. São os parcelamentos irregulares que podem ser alcançados pela regularização, em suas diversas modalidades, incluindo a sumária.

Havendo uma quadra para a qual esteja prevista a ocupação por lotes e por espaços livres, não parece que a fixação da divisa entre eles faça parte da implantação do parcelamento. Com efeito, assim como os lotes, os espaços livres são trechos que não exigem necessariamente a realização de obras pelo loteador para que se reconheça o loteamento como finalizado. Assim, deve-se considerar concluído o parcelamento do solo quando o loteador entrega as obras que implicam a conformação de uma quadra vazia, composta por lotes e espaços livres.

A atividade de parcelamento do solo é distinta da atividade de ocupação do solo parcelado, que a sucede. Por isso, não é a aceitável afirmar que a inobservância de uma divisa projetada entre dois lotes caracterize uma irregularidade na implantação do parcelamento, mas sim na ocupação das áreas que dele resultaram. Nessa linha, se a edificação executada pelo proprietário de um lote ocupa parte do lote vizinho, trata-se de uma simples invasão, que evidentemente não torna irregular o parcelamento do solo. De igual forma, não se pode imputar à execução do loteamento, em princípio, a inobservância das divisas projetadas entre lotes e espaços livres situados em uma mesma quadra.

Portanto, tendo sido entregue a quadra pelo parcelador, cabia aos proprietários envolvidos - particulares e Município - ocupar corretamente as áreas correspondentes. Nesse momento, já não seria adequado, em tese, falar em propriedade resolúvel e de estabilização da situação existente por meio da regularização, conforme desenvolvido no parecer objeto da Ementa n. 11.773 - PGM-AJC. Tratava-se, apenas, de respeitar as divisas das áreas correspondentes a cada proprietário, segundo a configuração prevista no respectivo plano de parcelamento do solo.

Vale ressalvar, ademais, como já mencionado, que o parcelamento em questão foi objeto de regularização. No entanto, não haveria fundamento para que essa regularização interviesse sobre a divisa entre o espaço livre e os lotes considerados. Em verdade, nem mesmo se vislumbra a necessidade de intervenção alguma sobre a quadra em questão, já que a sobreposição efetuada (fls. 210) indica ter havido uma implantação substancialmente compatível com o plano do parcelamento. Assim, o fato de se tratar de um loteamento regularizado não prejudica o raciocínio aqui desenvolvido, na linha de que a efetiva ocupação da quadra por distintos proprietários não integra a atividade de parcelamento do solo, não sendo alcançada, em princípio, pela chamada regularização sumária.

Por outro lado, seria inviável esgotar as diversas hipóteses que poderiam surgir na complexa casuística dos parcelamentos do solo. Há situações, por exemplo, em que o próprio loteador levou o parcelamento à irregularidade por ter efetuado uma alteração do plano de parcelamento, por meio do qual alienou trechos antes destinados como espaços livres, situação que poderia ser considerada como integrante da atividade urbanística de parcelamento do solo. Nesse caso, a irregularidade, embora relativa a um espaço livre, poderia ser alcançada pela chamada regularização sumária.

Outra hipótese seria a de uma implantação que levasse à diminuição de uma quadra como um todo, o que poderia, conforme o caso, implicar a diminuição do espaço livre ali previsto. Em tese, conforme poderia ser aferido em uma análise técnica a respeito, seria até mesmo possível afastar uma invasão pelos lotes, desde que se identificasse que a referida diminuição da área pública decorreu de uma imperfeição na implantação da quadra, gerando uma situação decorrente do próprio parcelamento, a qual, assim, poderia ser preservada, com base na regularização sumária.

Seria possível também, em teoria, que a própria Municipalidade tivesse expressamente dado ao espaço livre outra configuração, sobretudo no caso em que tivesse executado uma infraestrutura no local ou oficializado o espaço como logradouro. Na cabe aqui conjecturar sobre as razões para tal conduta por parte do Poder Público, mas seria necessário considerá-la como um elemento relevante que, conforme o caso, poderia até mesmo levar a uma estabilização de uma nova divisa no local.

Nenhuma dessas hipóteses, contudo, ocorreu no caso dos autos. Não há notícia de modificação do espaço livre pelo loteador, não foi apontada nenhuma impropriedade na implantação da quadra e o próprio espaço livre em questão foi oficializado pelo Decreto n. 40.631/01, passando a denominar-se Praça Moysés Fucs (art. 2º), para a qual foi adotada a mesma configuração da planta de regularização do parcelamento (art. 1º):

Convém observar, por fim, que a ausência de vinculação entre a situação existente e o parcelamento do solo afasta uma possível alegação de boa-fé por parte dos titulares dos lotes envolvidos. De fato, quando há um deslocamento na implantação de uma via, não se pode colocar em questão a conduta do proprietário que posiciona sua edificação no trecho lindeiro ao logradouro aberto, onde pensa estar localizado seu lote. Esse tipo de situação é que deve ser solucionado pela regularização do parcelamento - em qualquer de suas modalidades -, já que seria inviável fazer cumprir o plano original, até mesmo em razão da necessidade de indenizar edificações construídas de boa-fé. Ao contrário, no caso em exame, os titulares dos lotes podiam ter ocupado adequadamente o espaço que lhes cabia, com base no posicionamento do logradouro a que têm acesso e que está corretamente implantado. Não há dúvida, pois, de que o acréscimo de área ocupada, observado em relação a certos lotes, deu-se unicamente em virtude do propósito deliberado de avançar sobre o bem municipal.

Por isso, na linha do que constou do parecer objeto da Ementa n. 11.773 - PGM-AJC, cabe reiterar que os preceitos ali invocados se prestam a estabilizar determinadas situações decorrentes do parcelamento do solo, e não a legitimar as invasões de próprios municipais, mesmo que ocorridas antes de 19.12.1979.

Portanto, não havendo como associar a inobservância da divisa a uma ação do loteador e havendo manifestação oficial da Municipalidade no sentido de que o espaço livre oficializado é aquele que constou da planta do loteamento, não há como reconhecer a incidência, neste caso específico, da chamada regularização sumária. Assim sendo, a configuração do espaço livre em questão continua a ser aquela que constou da planta de regularização, o que leva à necessidade de responder negativamente ao primeiro quesito formulado por DEMAP, tornando prejudicados os demais quesitos. Com isso, sugere-se o retorno ao Departamento, para ciência e o prosseguimento cabível, tendo em vista as invasões noticiadas.

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São Paulo, 02/03/2020.

JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP 173.027

PGM

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Processo n° 2003-0.006.468-0

INTERESSADOS: Maria Izildinha Tavares Stanley e outro

ASSUNTO: Ação de usucapião. Proc. n. 629/00 - 2ª Vara de Registros Públicos.

Cont. da Informação n. 286/2020 - PGM.AJC

PGM

Senhora Procuradora Geral

Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Assessoria Jurídico Consultiva da Procuradoria Geral do Município, que acolho, no sentido de que não é cabível a aplicação, ao caso, do disposto no art. 69 da Lei Federal n. 13.465/17 e do art. 19 da Lei Municipal n. 15.720/13 (Ementa n. 11.773 - PGM-AJC), razão pela qual deverá ser dado prosseguimento às medidas cabíveis relativas às invasões verificadas.

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São Paulo, 11/03/2020.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE

COORDENADORA GERAL DO CONSULTIVO - SUBSTITUTA

OAB/SP 175.186

PGM

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Processo n° 2003-0.006.468-0

INTERESSADOS: Maria Izildinha Tavares Stanley e outro

ASSUNTO: Ação de usucapião. Proc. n. 629/00 - 2ª Vara de Registros Públicos.

Cont. da Informação n. 286/2020 - PGM.AJC

DEMAP

Senhor Diretor

Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Assessoria Jurídico Consultiva da Procuradoria Geral do Município, que acolho, no sentido de que não é cabível a aplicação, ao caso, do disposto no art. 69 da Lei Federal n. 13.465/17 e do art. 19 da Lei Municipal n. 15.720/13 (Ementa n. 11.773 - PGM-AJC), devendo esse Departamento prosseguir nas medidas cabíveis relativas às invasões verificadas.

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São Paulo, 30/04/2020.

MARINA MAGRO BERINGHS MARTINEZ

PROCURADORA GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 169.314

PGM

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo