CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

Acessibilidade

PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.911 de 26 de Outubro de 2018

EMENTA N.° 11.911
Lei municipal n.° 16.914, de 6 de junho de 2018. Proibição de alimentar pombos urbanos (Columbia livia) no Município de São Paulo. Espécies sinantrópicas  nocivas. Ameaça à saúde pública. Compatibilidade com o artigo 225, "caput" e §1°, inciso VII, da Constituição Federal. Prevalência da tutela à saúde, que autoriza a tomada de medidas de controle populacional de espécie animal nociva. Proporcionalidade. Competência do Município para legislar sobre a matéria. Constitucionalidade.

Processo n° 6011.2018/0001439-9

INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

ASSUNTO: Processo SEI/MPSP 29.0001.0031592.2018-42. Representação. Análise da constitucionalidade da Lei n° 16.914, de 6 de junho de 2018, que dispõe sobre a proibição de se alimentar pombos urbanos no âmbito do Município de São Paulo.

Informação n° 1.328/2018-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Assessoria Jurídico-Consultiva

Senhor Procurador Coordenador

Trata-se de consulta formulada pela Assessoria Técnica da Secretaria do Governo Municipal (SGM-AT) acerca da constitucionalidade da Lei municipal n.° 16.914, de 6 de junho de 2018, que dispõe sobre a proibição de se alimentar pombos urbanos (Columba livia - variedade doméstica) no âmbito do Município de São Paulo.

A consulta decorreu de representação formulada perante o Ministério Público do Estado de São Paulo pela entidade SOS AVES E CIA, para quem referido diploma municipal ofende o artigo 225, §1°, inciso VII, da Constituição Federal, que veda a submissão dos animais à crueldade.

É o relatório do quanto necessário.

Cumpre registrar inicialmente que esta Procuradoria Geral do Município não se pronunciou, em etapa anterior à sanção pelo Prefeito, acerca da juridicidade do Projeto de Lei n.° 484/2015, que deu origem à Lei municipal n.° 16.914/2018. A despeito disso, reconhece-se a constitucionalidade do diploma legal em relação aos preceitos de caráter ambiental que veicula.

Trata-se de norma que proíbe tanto a alimentação quanto a manutenção de abrigo para alojamento envolvendo os pombos urbanos (animais da espécie Columba livia). Demais, é vedada a comercialização de alimentos para pombos nas vias e logradouros públicos do Município. A violação a tais preceitos sujeita os respectivos infratores à pena de advertência e de multa.

A premissa tomada pela lei é a inserção de indigitada ave na categoria de espécie sinantrópica nociva passível de controle, conforme estipulação prevista na Instrução Normativa IBAMA n.° 141/2006. Nos termos do mesmo ato normativo, trata-se de "fauna sinantrópica que interage de forma negativa com a população humana, causando-lhe transtornos significativos de ordem econômica ou ambiental, ou que represente riscos à saúde pública".

No caso dos pombos urbanos evidencia-se patente risco à saúde pública, "devido à quantidade de organismos patogênicos e parasitas veiculados por eles, especialmente em seus excrementos", como salientado pela Coordenação de Vigilância em Saúde (SEI 011479240). Desta feita, "faz-se necessário o controle efetivo das populações desta espécie, por exemplo, em relação à oferta de alimentos, uma vez que os ciclos reprodutivos são regulados entre outros fatores, por esta oferta".

Conforme exposto na justificativa ao Projeto de Lei n.° 484/2015, o "pombo urbano é chamado, por muitos de 'rato voador', pois é um animal onívoro que inclui em sua dieta detritos e lixo, reproduz-se em ritmo veloz (até 5 posturas por ano) e transmite diversas moléstias além de abrigar vermes e insetos em sua penagem, que podem se desprender no voo, caindo sobre transeuntes."

Considerando o potencial malefício que essas aves podem causar, cabível a estipulação legal de práticas que promovam o controle de tais populações, a exemplo da restrição da oferta de alimentos, principal conteúdo prescritivo da Lei municipal n.° 16.914/2018.

Sobre a sua adequação constitucional, deve-se consignar que a Lei Fundamental congrega duas vertentes ético-filosóficas que norteiam a hermenêutica na seara ambiental.

De um lado impõe-se o antropocentrismo, pelo qual as normas ambientais assumem como destinatário o ser humano, a quem é assegurado o meio ambiente ecologicamente equilibrado, reputado como bem de uso comum do povo. É o que se extrai da norma-matriz do direito ambiental brasileiro (artigo 225, "caput", da CF), que gira na órbita do homem como usufrutuário de condições ambientais hígidas que permitam uma sadia qualidade de vida. Trata-se de legítimo direito fundamental (do homem), uma extensão do rol encartado no artigo 5° da CF.

A Constituição, contudo, é dialética, não olvidando a necessidade de proteção à fauna. Nos termos do artigo 225, §1°, inciso VII, são vedadas, entre outras, as práticas que submetam os animais à crueldade. Trata-se de um cenário que evidencia o biocentrismo como elemento crucial do regime jurídico-ambiental. Não só o homem, mas todas as formas de vida são objeto de tutela ambiental.

Ocorre que em diversas situações implanta-se uma colisão entre tais diretrizes, de modo a exigir uma compatibilização. Ou seja, tais modos de conceber o direito ambiental estão circunscritos, porquanto jurídicos, à técnica hermenêutica da ponderação, em que os valores contrapostos são submetidos a uma aferição de adequação.

É o que se verifica em relação ao conteúdo da norma objeto de análise. O confronto consiste na prescrição que afeta a população de determinada espécie animal e a finalidade de preservar a saúde pública da população. Assim, estar-se-ia privilegiando a concepção antropocêntrica, em detrimento da biocêntrica.

No entanto, entende-se que o Parlamento municipal procedeu de modo legítimo (leia-se, constitucional) em relação ao ajuste material de indigitada dialética. A vedação legal assume o condão mediato de garantir a saúde pública (aspecto que integra o meio ambiente, frise-se), por meio de uma medida razoável destinada imediatamente a controlar a população dos pombos urbanos. Inexiste, como se pode perceber, qualquer submissão de animais à crueldade, ante a ausência de maus-tratos. Tampouco foi disciplinada qualquer medida de extermínio direto, como o abate dos pombos urbanos. Atendido, logo, o postulado da proporcionalidade, notadamente no tocante à tríade que o compõe (adequação/necessidade/proporcionalidade em sentido estrito).

Vale ressaltar que o regime incorporado na lei paulistana objeto de análise não é inédito, seja no âmbito do direito comparado quanto do direito nacional.

De fato, cidades como Londres, Paris, Roma e Lisboa editaram leis proibindo a alimentação dos pombos urbanos. A justificativa é a mesma, relacionada com o impacto na saúde pública. Conforme informação extraída de órgão governamental da capital portuguesa, in verbis: "Os incómodos causados pelos pombos na cidade traduzem-se em riscos para a saúde pública através da transmissão de agentes patogénicos existentes nas aves. O contacto com as fezes, ectoparasitas e penas pode causar problemas alérgicos, quer a nível respiratório, quer outros. Podem ainda transmitir doenças como a Salmonelose, a Criptococose, a Ornitose, especialmente aos grupos mais vulneráveis da população (crianças, idosos e imunodeprimidos)."

Já no âmbito nacional, inúmeros Municípios contam com leis com similar prescrição, a exemplo de Guarulhos, São Carlos, Ribeirão Pires, Porto Alegre, Campina Grande, entre outros. A propósito, não foi verificado qualquer questionamento em relação à constitucionalidade de tais normas locais.

Sobre a competência do Município para legislar sobre a matéria, reproduza-se trecho do parecer n.° 2081/2015, da Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa da Câmara Municipal, sobre o Projeto de Lei n.° 484/2015, in verbis:

"O projeto pode prosperar, eis que de acordo com a Constituição Federal, podem legislar concorrentemente sobre a proteção e a defesa da saúde a União, os Estados, Distrito Federal e também o Município, para suplementar a legislação federal e estadual, dentro dos limites do predominante interesse local (arts. 24, inciso XII c/c art. 30, incisos I e II, da Constituição Federal).

Também o art. 23, inciso II, da Carta Magna, determina que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, cuidar da saúde e assistência pública.

De se ressaltar, ademais, que na órbita municipal o art. 213 da Lei Orgânica prevê a atribuição do Município de garantir o direito à saúde mediante políticas que visem ao bem estar físico, mental e social do indivíduo e da coletividade, a busca da eliminação do risco de doenças e outros agravos, abrangendo o ambiente natural, os locais públicos e de trabalho."

À luz de todo o exposto, reputa-se constitucional a Lei municipal n.° 16.914, de 6 de junho de 2018, que dispõe sobre a proibição de se alimentar pombos urbanos (Columba livia - variedade doméstica) no âmbito do Município de São Paulo.

À consideração superior.

.

São Paulo, 26 de outubro de 2018.

RODRIGO BORDALO RODRIGUES

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP 183.508

PGM

.

.

Processo n° 6011.2018/0001439-9

INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

ASSUNTO: Processo SEI/MPSP 29.0001.0031592.2018-42. Representação. Análise da constitucionalidade da Lei n° 16.914, de 6 de junho de 2018, que dispõe sobre a proibição de se alimentar pombos urbanos no âmbito do Município de São Paulo.

Cont. da Informação n° 1.328/2018-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador Geral

Encaminho a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral, que acolho integralmente.

.

São Paulo, 29/10/2018.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

COORDENADORA GERAL DO CONSULTIVO SUBSTITUTA

OAB/SP 175.186

PGM / AJC

.

.

Processo n° 6011.2018/0001439-9

INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

ASSUNTO: Processo SEI/MPSP 29.0001.0031592.2018-42. Representação. Análise da constitucionalidade da Lei n° 16.914, de 6 de junho de 2018, que dispõe sobre a proibição de se alimentar pombos urbanos no âmbito do Município de São Paulo.

Cont. da Informação n° 1.328/2018-PGM.AJC

SECRETARIA DO GOVERNO MUNICIPAL

Senhor Chefe da Assessoria Técnica

Nos termos da consulta formulada, encaminho com a manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho integralmente, no sentido da constitucionalidade da Lei municipal n.° 16.914, de 6 de junho de 2018, que dispõe sobre a proibição de se alimentar pombos urbanos (Columba livia - variedade doméstica) no âmbito do Município de São Paulo.

.

São Paulo, 12/11/2018.

GUILHERME BUENO DE CAMARGO

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 188.975

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo