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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.868 de 19 de Junho de 2018

EMENTA N° 11.868
Patrimônio imobiliário. Área pública municipal. Passagem. Abertura de matrícula. Ausência de título hábil. Ajuizamento de ação de natureza dominial. Alternativa.

Processo n° 2018-0.033.977-8

INTERESSADO: Municipalidade de São Paulo

ASSUNTO: Abertura de matrícula. Área correspondente à passagem com início na altura do n° 208 da rua Fernandes de Abreu.

Informação n° 0728/2018-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhor Procurador Coordenador

O presente processo foi autuado a partir de peças extraídas do PA 2017-0.079.914-9, que trata de pedido de aquisição de área municipal, para a abertura da matrícula correspondente ao bem público.

Trata-se da passagem com início na altura do n° 208 da rua Fernandes de Abreu, cujo domínio público foi confirmado nos processos 2013-0.163.348-4 e 2016-0.077.378-4 (fls. 187/191).

O logradouro perdeu a sua função viária em razão da aquisição das moradias confrontantes para a implantação de um empreendimento no local.

Ocorre que, ao examinar nestes autos a questão da abertura da matrícula, o DEMAP ponderou que a Municipalidade não dispõe título hábil para tanto, por se tratar de logradouro cujo natureza pública foi reconhecida em razão de sua afetação, dependendo a efetivação da providência, assim, do prévio ajuizamento de ação de natureza dominial. Observou o referido departamento, por outro lado, que em casos como a dos autos podem ocorrer duas situações: a) a área afetada ao uso público está contida no registro do próprio interessado na aquisição; b) a área considerada afetada ao uso público não está contida no registro do interessado, mas naquele que lhe deu origem.

No primeiro caso, sustenta o DEMAP que a questão poderia ser facilmente resolvida mediante a celebração de um negócio jurídico entre as partes, sendo dispensável a abertura de matrícula para a área pública. Já na segunda hipótese, em que o logradouro afetado ao uso público não integra o registro do particular interessado na aquisição, a realização do mesmo negócio jurídico dependeria da anuência do terceiro que figura como proprietário no Registro de Imóveis.

Em ambos os casos, prossegue o referido departamento, devem ser observadas a normas a respeito da alienação de imóveis públicos, especialmente aquelas relativas à autorização legislativa e desafetação.

Com efeito, tal solução, de fato, atende ao interesse público, já que, para atingir o mesmo resultado, seriam evitados os custos decorrentes do ajuizamento de uma ação de natureza dominial pela Municipalidade, além do tempo necessário para a obtenção de um provimento jurisdicional reconhecendo o domínio público sobre o logradouro.

Quanto ao negócio jurídico adequado para que se alcance o fim em vista, parece-me apropriado o próprio contrato de compra e venda, uma vez que tal ajuste pode ser utilizado, inclusive, para a venda de coisa alheia ou apenas para a transmissão da posse.

Nesse sentido, a lição de Pontes de Miranda, ao discorrer sobre a venda de coisa alheia:

"Uma vez que o contrato de compra e venda é consensual e por êle só se promete a transmissão da propriedade e da posse, ou só da posse, nada obsta a que seja objeto de tal contrato o bem alheio, isto é, o bem de propriedade, ou de posse, ou de propriedade e de posse alheias. Não há qualquer invalidade, nem ineficácia. Se o vendedor vem a prestar, por ter adquirido o bem, ou por ter encarregado o dono de prestar a propriedade e a posse, ou só a propriedade, ou só a posse, cumpriu o que prometeu. Se falha, inadimpliu, e há as conseqüências do inadimplemento. Se prestou propriedade, ou posse, em vez prestar propriedade e posse, houve adimplemento ruim. "

Mais:

"A compra-e-venda do bem alheio é eficaz apenas entre o vendedor e o comprador. Não se pode dizer, a priori, que não tenha efeitos quanto ao terceiro, porque isso depende de outro negócio jurídico, ou situação de direito, entre o vendedor e o terceiro. O terceiro pode propor contra o vendedor as ações que lhe tocam, e talvez não tenha ações, nem pretensões, nem direitos, a despeito de ter sido o dono.

Em princípio, pode reivindicar, ou vindicar a posse, ou exercer alguma ação possessória ou obrigacional. A usucapião pode operar-se a favor do adquirente de boa fé, ou, mesmo, de má fé. " 1 (destaquei).

A Municipalidade, no entanto, não pretende vender coisa alheia, uma vez que tem tanto a propriedade como a posse do bem, não dispondo apenas de título hábil para a abertura da matrícula correspondente. Aliás, no precedente juntado pelo DEMAP às fls. 424/429, em que foi negado pedido de abertura de matrícula formulado pelo município de Jaboticabal, a Corregedoria Geral da Justiça não questionou a natureza pública do bem por destinação, mas apenas a falta de título hábil para a adoção da providência (Processo n° 2010/108707).

Desse modo, no caso dos autos, em que o leito da passagem cuja aquisição é pretendida não integra o título do interessado, remanescendo na transcrição n° 32.224 do 4º CRI, a formalização de uma escritura de compra e venda não exigiria a intervenção daquele que consta no Registro de Imóveis como proprietário, devendo ser mencionada no documento, porém, a impossibilidade de ser promovida abertura de matrícula pela Municipalidade, bem como o fato de que tal circunstância não poderá servir de fundamento para qualquer questionamento ou pedido de indenização. Também deverão ser integralmente observadas as normas para a venda de bens públicos previstas na Lei Orgânica do Município.

Já o adquirente do imóvel, para regularizar a situação registrária, poderá renovar a ação de usucapião anteriormente ajuizada2, que não será mais objeto de impugnação pela Municipalidade, ou até celebrar um acordo com o antigo proprietário que consta do Registro de Imóveis.

Diante de todo o exposto, e tendo em vista a lição de Hely Lopes Meirelles, no sentido de que, cumpridas as exigências administrativas, a alienação de imóvel público a particular formaliza-se pelos instrumentos e com os requisitos da legislação civil, e, desde que assinado o instrumento pelas partes, a Administração não poderá mais modificar ou invalidar a alienação por ato unilateral, o que somente poderá ser feito por acordo ou via judicial3, entendo que, uma vez confirmada a viabilidade da alienação da área em questão independentemente de licitação, nos termos da Lei Orgânica do Município, o interessado na aquisição poderá ser consultado a respeito da alternativa aventada.

A PGM, diga-se de passagem, já se manifestou no sentido da viabilidade da celebração de escrituras de compra e venda envolvendo remanescentes de desapropriação ainda não adjudicados, desde que observadas as exigências da Lei Orgânica do Município (Ementa n° 11.403).

Portanto, entendo que os autos poderão ser encaminhados à CGPATRI para prosseguimento nos termos expostos.

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São Paulo, 19/06/2018.

RICARDO GAUCHE DE MATOS

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP 89.438

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 18/07/2018.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC

OAB/SP 175.186

PGM

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1 Tratado de Direito Privado - Direito das Obrigações. 2ª edição. Rio de janeiro Borsoi, 1962, Tomo XXXIX. p. 26.
2 O interessessado desistiu da ação após a impugnação da Municipalidade (fls. 346/371).

3 Direito Municipal Brasileiro. 7ª edição. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 243.

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Processo n° 2018-0.033.977-8

INTERESSADO: Municipalidade de São Paulo

ASSUNTO: Abertura de matrícula. Área correspondente à passagem com início na altura do n° 208 da rua Fernandes de Abreu.

Cont. da Informação n° 0728/2018-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador Geral

Encaminho estes autos com a manifestação do DEMAP, bem como com as ressalvas feitas pela AJC, que acompanho, no sentido da viabilidade da celebração de uma escritura de compra e venda no caso em exame.

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São Paulo, 20/07/2018.

TIAGO ROSSI

PROCURADOR DO MUNICÍPIO

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP 195.910

PGM

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Processo n° 2018-0.033.977-8

INTERESSADO: Municipalidade de São Paulo

ASSUNTO: Abertura de matrícula. Área correspondente à passagem com início na altura do n° 208 da rua Fernandes de Abreu.

Cont. da Informação n° 0728/2018-PGM.AJC

SMG/COJUR

Senhor Procurador Coordenador

Encaminho estes autos com a manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acompanho, para prosseguimento.

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São Paulo, 02/08/2018.

GUILHERME BUENO DE CAMARGO

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 188.975

PGM

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo