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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.839 de 6 de Março de 2018

EMENTA N° 11.839
Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT. Correios. Regime jurídico de empresa pública prestadora de serviços públicos também em relação aos serviços não postais, conforme jurisprudência do STF. Aplicável o entendimento do Parecer ementado sob o n. 11.748.

TID 167841114

INTERESSADO: SME/CODAE

ASSUNTO: Contratação da ECT para distribuição domiciliar de leite em pó (Programa Leve Leite) 

Informação n° 0255/2018-PGM.AJC 

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Sr. Coordenador Geral do Consultivo 

Trata-se de ofício encaminhado pela Coordenadoria de Alimentação Escolar da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo - SME/CODAE ao Gabinete daquela Pasta propondo a contratação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT (Correios), nos moldes anteriormente adotados, para a realização da distribuição e da entrega domiciliar de leite em pó aos beneficiários do Programa Leve Leite.

Apresenta como justificativas de tal proposta, em síntese: (a) a escolha da entrega domiciliar sanou diversos problemas enfrentados pelo Programa, tais como o armazenamento inadequado, o desperdício e o furto do produto; (b) a complexidade da execução da entrega domiciliar; (c) o fato de a ECT ser a única empresa a deter o conhecimento necessário para operacionalizar, de maneira efetiva, a entrega domiciliar do leite em pó, o que inclui a inspeção do material recebido, o controle de estoque através de software desenvolvido especificamente para o Programa, a armazenagem do produto, o controle da execução do Programa por meio de um sistema próprio, a manutenção de cadastro atualizado dos participantes e a disponibilização diária relativas à execução do Programa; (d) o esforço da ECT no desenvolvimento da solução logística integrada; (e) a estrutura exclusiva para atendimento das necessidades do Programa; (f) os índices de entregas realizadas pela ECT, que demonstram o sucesso da entrega domiciliar; e (g) os prejuízos resultantes de eventual descontinuidade da entrega domiciliar.

A Assessoria Jurídica daquela Pasta - SME/AJ, ao examinar o presente, realizou o resgate das contratações da ECT realizadas pela SME no âmbito do Programa Leve Leite, cujos principais aspectos podemos assim sintetizar: (i) a primeira contratação data de fevereiro de 2009 e foi realizada por dispensa de licitação com fundamento no artigo 24, inciso VIII, da Lei Federal n° 8.666/93; (ii) o fundamento legal da contratação tem sido o mesmo desde então; (iii) em 2014, quando iniciado o procedimento para nova contratação, foi identificada a existência de inscrições de débitos da ECT no Cadastro Informativo Municipal - CADIN Municipal; (iv) naquela oportunidade, a Assessoria Jurídica manifestou-se pela possibilidade, em caráter excepcional, de mitigação dos efeitos daquelas inscrições, dada a existência de parcela do objeto sujeita ao regime de monopólio da ECT, a especificidade dos serviços prestados, que foram, de certa forma, "customizados" para o Programa, e a continuidade do Programa; (v) aventou-se à época a possibilidade de se alterar o fundamento legal da contratação, passando a ser o artigo 25 da Lei Federal n° 8.666/93, mas tal proposta não foi adiante; (vi) ao ser consultada, esta Assessoria Jurídico-Consultiva - AJC reforçou seu entendimento no sentido de que a mitigação deve ocorrer "de forma restritiva e excepcional (...) tendo em vista, de um lado, a essencialidade cia atividade envolvida no ajuste e, de outro, a impossibilidade de execução dos serviços por outro prestador"; (vii) quando da prorrogação, em fevereiro, a SME/AJ apontou a necessidade de estudos para alternativas ao objeto do contrato ou reenquadramento do fundamento legal, pois a mitigação do CADIN não poderia continuar sendo realizada de forma permanente; (viii) houve a instauração de um procedimento de licitação para contratação dos serviços (SEI 6016.2016/0005107-7), o qual ainda estaria na fase interna.

Partindo da proposta de CODAE, de manutenção da contratação com fundamento no artigo 24, VIII, da Lei Federal n° 8.666/93 e a despeito da existência de inscrições no CADIN Municipal, e considerando o histórico das contratações, aquela Assessoria Jurídica passou a examinar as justificativas apresentadas por SME/CODAE, chegando à conclusão de que as mesmas, apesarem de demonstrarem a complexidade do objeto do contrato, não apresentaram qualquer evidência ou indício de que apenas a ECT poderia executá-lo. Nesse sentido, também considerou que as peculiaridades que o tornam complexo poderiam ser traduzidos em exigências, juridicamente lícitas, de um edital de licitação.

Especificamente quanto à justificativa de que apenas a ECT teria conhecimento para operacionalizar a entrega do leite em pó, o qual poderia levar a uma contratação direta por inexigibilidade de licitação, a Assessoria considerou que, diante da ausência de comprovação desse argumento, tratava-se de mera hipótese.

Concluindo que a proposta inicial não poderia ser acolhida, seja ela interpretada no sentido da manutenção da contratação direta pelo artigo 24, inciso VIII, da Lei Federal n° 8.666/93, seja no de seu reenquadramento para o artigo 25 daquela Lei, a SME/AJ recomendou a colocação da hipótese da SME/CODAE à prova por meio da tentativa de realização de licitação.

Examinada a proposta de SME/CODAE, passou a examinar a possibilidade de contratação da ECT diante do Parecer desta AJC ementado sob o n° 11.748. Afirmando que esta AJC defendeu que a existência de pendências no CADIN Municipal não representaria óbice à contratação da ECT se a contratação se referir a serviço público e houver notório benefício, chegou à conclusão de que o entendimento desta AJC não altera as conclusões e recomendações da SME/AJ, pois, à semelhança do quanto afirmado em relação à contratação direta por inexigibilidade de licitação, não há comprovação alguma de que haja notório benefício na contratação da ECT. Ademais, registrou a existência de parecer desta AJC analisando este caso específico, no qual teria se posicionado pela possibilidade de mitigação apenas enquanto não fosse possível a execução dos serviços por outro prestador.

Por fim, aquela Assessoria abordou a questão da contratação da ECT com fundamento no artigo 24, inciso VIII, da Lei Federal n° 8.666/93. Expôs inicialmente que vem defendendo a viabilidade jurídica da contratação com fundamento naquele dispositivo pela inexistência de decisão do Supremo Tribunal Federal - STF que o tenha declarado inconstitucional ou dado interpretação conforme e pela existência de precedentes dos Tribunais de Contas do Município e do Estado. A seguir, trouxe a divergência existente sobre tal hipótese de contratação direta, mencionando o entendimento do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Contas da União - TCU, inclusive no que se refere à contratação da ECT, mas concluiu ser possível a contratação direta, independentemente da natureza do serviço prestado, porque tal regra não afronta a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, prevista no artigo 173, § 1º, inciso II, da Constituição Federal, tanto que a própria legislação federal prevê hipótese de dispensa em favor de particulares (artigo 14, § 1º, da Lei Federal n° 11.947/09).

Assim sendo, sugeriu a consulta desta Coordenadoria quanto à possibilidade de os serviços em questão serem considerados públicos e de se contratar a ECT com fundamento no artigo 24, VIII, da Lei Federal n° 8.666/93.

Antes de examiná-la, parece-nos pertinente um esclarecimento sobre o Parecer ementado sob o n° 11.748.

*****

A partir da leitura do parecer ementado sob o n. 11.748, percebe-se que a premissa sobre a qual se estruturou o raciocínio que culminou nas conclusões ali expostas foi a natureza jurídica da ECT de empresa estatal prestadora de serviços públicos. Em outras palavras, só se chegou àquelas conclusões porque se trata de uma empresa estatal prestadora de serviços públicos, não de empresa estatal exploradora de atividade econômica em sentido estrito.

Essa premissa não foi adotada ao acaso. Como demonstrado naquela oportunidade, a sua natureza de prestadora de serviços públicos foi reconhecida pelo STF em diversas oportunidades, merecendo especial destaque o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF 46, pois, por ter sido o momento em que se definiu tal entendimento, tornou-se o precedente de que se vale aquele Tribunal ao enfrentar a questão.

Pois bem, reconhecendo-se a natureza da ECT de empresa estatal prestadora de serviço público, demonstrou-se no citado Parecer que o regime jurídico ao qual está submetida não se assemelha, por razões lógicas, àquele próprio das empresas que exploram atividade econômica em sentido estrito, em especial no que se refere à observância do artigo 173 da Constituição Federal, especificamente do princípio da livre concorrência. O principal exemplo dessa distinção é justamente o fato de a ECT gozar de ampla imunidade tributária, algo que seria impensável se se tratasse de empresa exploradora de atividade econômica, dada a clara ofensa à livre concorrência que a imunidade geraria. Entretanto, esse não é o único, pois podemos citar ainda o fato de os bens da ECT serem considerados impenhoráveis1, de estar submetida à sistemática dos precatórios2 e de ser vedada a despedida imotivada de seus funcionários3.

Realizado esse esclarecimento, podemos analisar a consulta que foi proposta pela SME/AJ: poderiam os serviços que SME/CODAE pretende contratar ser considerados como serviço público?

Parece-nos que a resposta isolada a essa questão não esgota o assunto tampouco nos leva à sua correta compreensão, razão pela qual propomos outra: a ECT continua a ter natureza de empresa prestadora de serviços públicos ao prestar serviços que não são qualificados como públicos4?

É sabido que atualmente a ECT presta diversos serviços que não integram a noção de serviço público, especificamente a noção de serviço postal, seja ele monopolizado ou não. O regime jurídico a que se submete a ECT em tais casos se difere daquele relacionado à prestação de serviço postal?

Essa questão também foi submetida ao STF quando do julgamento do Recurso Extraordinário - RE 601.392, submetido à sistemática da repercussão geral, oportunidade na qual o pleno daquele Tribunal entendeu que mesmo em tais casos não se pode equiparar a ECT a empresas que exploram atividades econômicas em sentido estrito5.

Como destacado pelo Ministro Dias Toffoli em seu voto: "a ECT permanece como empresa pública constituída para a prestação dos serviços de que cuida o art. 21, X, da Constituição Federal (...). Dessa forma, convenço-me da necessidade de se afastar a ECT da regra do art. 173 da Constituição Federal, que se refere, única e exclusivamente, às empresas estatais que exploram atividade econômica própria do setor privado. Os §§ 1º e 2º não se aplicam a empresas públicas prestadoras de um serviço público."

Importa trazer a exposição realizada pelo Ministro Gilmar Mendes, relator para o Acórdão:

Depois dos memoriais apresentados, indico que a Empresa - esse é um dado importante, por isso que, à época, eu tinha falado de processo de inconstitucionalização do modelo de uma lei ainda constitucional - é superavitária em apenas quatro unidades da Federação, Presidente: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Distrito Federal, sendo deficitária em todas as demais. Quer dizer, aqui o subsídio cruzado também diz respeito a esse balanço federativo. Claro que isso demanda uma reforma que não pode ser feita no plano meramente judicial; isso exige uma compensação num contexto de reformulação da própria estrutura. O ministro Lewandowski chama a atenção para uma medida provisória que já estaria fazendo essa alteração. Nesse contexto, é relevante relembrar que a Empresa está sujeita aos princípios da continuidade do serviço, da universalização do atendimento e da modicidade das tarifas. Um dado importante: mesmo no que diz respeito à entrega de encomendas, quem faz a entrega de encomendas nesses locais longínquos? (...) Certamente, não é empresa calcada nos padrões de lucratividade de mercado. Todos querem disputar esses grandes mercados, os grandes conglomerados urbanos, mas vai entregar alguma coisa em Cabrobó! Isso acaba sendo monopólio. Aí, os Correios têm o ônus. (...) Então, como, sem uma nova modelagem, simplesmente dizer que nessa atividade já não goza da imunidade, quando nós sabemos que é exatamente essa atividade que permite subsidiar a atividade monopolística normal da entrega de cartas e encomendas - extremamente importante para a integração deste país, para a comunicação deste país? (...) Então, é fundamental que se perceba esse modelo do subsídio cruzado para um serviço público. A forma jurídica, aqui, está marcada por acidentalidades. Nós já reconhecemos, em relação aos próprios Correios, por exemplo, o regime de precatório por conta dessas características. É fundamental. Peço desculpas, mas quero apenas realçar a importância desse posicionamento, embora reconheça que esse é um processo que está in fiere, que poderá ganhar um novo formato. O próprio perfil de garantia institucional do chamado "monopólio postal" comporta essa atualização. E nem me causa qualquer transtorno o fato de os Correios exercerem, por exemplo, atividade bancária. Felizmente, eles podem exercê-la, até para se subsidiarem. Veja: pagar benefícios nessas longínquas localidades que sequer banco têm. Na verdade, isso não é defeito, é virtude dos Correios.

A premissa adotada pelo STF naquela oportunidade e em outras posteriores foi a de que a remuneração das atividades econômicas realizadas pela ECT serve ao financiamento da prestação do serviço público. É o conhecido subsídio cruzado. Nas palavras do Ministro Ayres Britto:

Manter o serviço entregue à cura da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos cada vez mais me parece que é manter a qualquer custo, a qualquer preço, de qualquer maneira, ainda que sob retumbante, acachapante prejuízo. É uma atividade que não pode deixar de ser prestada, que não pode sofrer solução de continuidade; é obrigação do Poder Público manter esse tipo de atividade. Por isso que o lucro eventualmente obtido pela Empresa não se revela, com muito mais razão, como um fim em si mesmo; é um meio para a continuidade, a ininterrupção dos serviços a ela afetados. De outra parte, sabemos que os Correios - o Ministro Nelson Jobim lembrava isso - são destinados a um atendimento de modo a alcançar todos os municípios brasileiros, distritos, as subdivisões geográficas territoriais desses municípios, em busca desse valor mais alto da integração nacional - que Vossa Excelência, Ministro César Peluso, chamou de 'coesão nacional' em uma das nossas discussões. Isso tudo obriga os Correios e Telégrafos a adotar uma política tarifária de subsídios cruzados, ou seja, buscar obter lucro aqui para cobrir prejuízo certo ali. E como os Correios realizam também direitos fundamentais da pessoa humana, como a comunicação telegráfica e telefônica e o sigilo dessas comunicações, praticando uma política de modicidade tarifária, eles alcançam a maior parte da população carente, da população economicamente débil. Assim, nesta oportunidade, com um pouco mais de clareza ou menos dubiedade, parece-me que os Correios são como uma longa manus, uma mão alongada das atividades da União, um apêndice da União absolutamente necessário.

No mesmo sentido a exposição do Ministro Ricardo Lewandowski:

Há um outro aspecto que foi ventilado nos memoriais: a questão do subsídio cruzado - é um fenômeno jurídico ou fiscal ou econômico chamado subsídio cruzado. Para manter o serviço postal, o que faz a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos? Ela reinveste os "lucros", que são o resultado positivo dos serviços que ela presta e que não estão sujeitos ao regime de exclusividade. Portanto, naquilo que ela tem o resultado positivo, ela não aufere lucros, como numa empresa pública. Ela reinveste nos serviços. (...) E, de outra parte, e por fim, quero dizer - teria outros argumentos aqui a lançar -que eu entendo que não se pode equiparar a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos às empresas comuns, às empresas privadas em termos de concorrência, porque ela não concorre de forma igualitária com essas.

Vale mencionar que, dado o seu caráter de empresa prestadora de serviços públicos, o STF reconhece à ECT uma natureza jurídica assemelhada à da autarquia. Como bem sintetizou o Ministro Luiz Fux no julgamento do citado recurso, "é possível extrair-se da jurisprudência da Corte que o regime jurídico da ECT foi assemelhado ao regime autárquico, uma vez que integrante da Administração Pública Indireta". A título de exemplo, transcrevemos o seguinte trecho do voto do Ministro Menezes Direito na Ação Cível Originária - ACO n. 465, na qual foi relator do Acórdão:

Extrai-se dos julgados citados o entendimento de que a autora é empresa pública que presta serviço público e não atividade econômica em sentido estrito. Dessa peculiaridade decorre sua natureza autárquica (...), o que está bem delineado no voto proferido pelo eminente Ministro Carlos Velloso no mencionado RE n° 407.099-RS, referindo-se a voto no RE 220.907/R0, Relator o Ministro Carlos Velloso, como se segue:

"É preciso distinguir as empresas públicas que exploram atividade econômica, que se sujeitam ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias (C.F., art. 173, § 1º), daquelas empresas públicas prestadoras de serviços públicos, cuja natureza jurídica é de autarquia, às quais não tem aplicação o disposto no § 1º do artigo 173 da Constituição (...)."

O Supremo Tribunal Federal deixou claro, portanto, a necessidade de se fixar a distinção, para fins de tratamento normativo de empresas públicas prestadoras de serviço público e empresas públicas exploradoras de atividade econômica em sentido estrito.

 

Em suma, a ECT mantém a sua natureza de empresa prestadora de serviços públicos, ainda que venha a prestar serviços que não são qualificados pela Constituição Federal ou pela legislação como públicos, razão pela qual as conclusões do Parecer ementado sob o n. 11.748, em especial o quanto exposto na alínea a das conclusões, permanecem inalteradas.

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Apesar de a consulta se resumir às questões da natureza dos serviços que SME/CODAE pretende contratar e da possibilidade de a contratação ser fundamentada no artigo 24, inciso VIII, da Lei Federal n° 8.666/93, acreditamos ser oportuno realizar um esclarecimento no que se refere à possibilidade de mitigação pela autoridade dos efeitos da inscrição no CADIN Municipal, dada a análise do Parecer ementado sob o n° 11.748 realizada pela SME/AJ.

Inicialmente, importa asseverar que em nenhum momento aquele Parecer reviu ou foi de encontro ao entendimento anteriormente firmado por esta AJC ou pela Secretaria dos Negócios Jurídicos - SNJ, pois tratou de hipótese diversa das analisadas por tais órgãos em outras ocasiões.

Enquanto as manifestações anteriores examinaram situações em que a contratação de determinada pessoa era a única possibilidade, a ponto de se falar em "inexigibilidade de conduta diversa", o Parecer ementado sob o n. 11.748 examinou a possibilidade de a autoridade mitigar os efeitos da inscrição previstos na legislação do CADIN Municipal, no caso concreto, quando a contratação se der entre entes estatais, pois, valendo-se do postulado da razoabilidade, não se mostra razoável tratá-los como se particulares fossem, exceto, obviamente, as empresas estatais exploradoras de atividade econômica em sentido estrito, dadas as normas constitucionais que as regem.

Em outras palavras, estamos tratando de entes estatais, entes integrantes do Estado Brasileiro, os quais estão submetidos a um regime jurídico de direito público diverso daquele imposto aos particulares, regime esse conformado por princípios constitucionais estranhos à disciplina dos atos praticados por pessoas físicas ou empresas privadas, não sendo razoável impor a esses entes a mesma disciplina à qual estão submetidos os particulares.

Obviamente, essa constatação não significa que as regras do CADIN Municipal não se aplicam à contratação de entes estatais ou que a autonomia municipal tenha sido diminuída, pois só se mostrará possível a mitigação (repita-se, mitigação) em casos excepcionais, diante de justificativas concretas (vantagem notória e indiscutível) e, desde que assim entenda a autoridade municipal competente, por meio de decisão (exercício de competência).

De modo a não restar dúvidas, vale transcrever o seguinte trecho daquele Parecer:

(...) diante da presença de certas especificidades, como a demonstração de notório benefício à Administração Municipal e a natureza jurídica do ente estatal, a autoridade competente, caso entenda ser o caso, poderá delas se valer para justificar a eventual mitigação da exigência do artigo 3º da Lei Municipal n° 14.094/05, a qual sempre se dará concretamente e em caráter excepcional.

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Em relação à contratação do Programa Leve Leite, ainda que não nos caiba a sua análise, entendemos pertinente salientar que entendemos possível a contratação com fundamento no art. 24, VIII, da Lei Federal n° 8.666/93, pelas mesmas razões já indicadas no Parecer ementado sob o n. 11.748. Diga-se que, caso a autoridade tenha entendimento diverso do exposto naquele Parecer e na presente manifestação, poderá analisar a adequação da contratação àquele dispositivo legal sob a lógica do Parecer desta AJC de 2011 (Informação 24/2011 - PGM.AJC).

Quanto à existência de pendências no CADIN Municipal, aplicável a conclusão do Parecer ementado sob o n. 11.748, podendo a autoridade competente, caso entenda ser o caso, valer-se de certas especificidades, se presentes, como o notório benefício à Administração Municipal e a natureza jurídica do ente estatal, para justificar a eventual mitigação da exigência do artigo 3º da Lei Municipal n° 14.094/05, a qual sempre se dará concretamente e em caráter excepcional.

Se, contudo, a autoridade entender que não são cabíveis as conclusões deste Parecer e daquele ementado sob o n. 11.748 ou que não estão presentes as suas premissas no presente caso, seja no que se refere à interpretação do artigo 24, VIII, da Lei Federal n° 8.666/93, seja no que diz respeito aos efeitos da inscrição no CADIN Municipal, caberá a adoção pela autoridade das providências pertinentes à realização de procedimento licitatório.

São Paulo, 06/03/2018.

FÁBIO VICENTE VETRITTI FILHO

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP n° 255.898

PGM

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De acordo.

São Paulo, 08/03/2018.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC

OAB/SP n° 175.186

PGM

 1 EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA. IPTU. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. ABRANGÊNCIA. PRECEDENTES. O Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a compatibilidade do Decreto-lei n. 509/69 — que dispõe sobre a impenhorabilidade dos bens da ECT e os benefícios fiscais outorgados a essa Empresa — com a Constituição do Brasil. Agravo regimental a que se nega provimento. (Al 718646 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 16/09/2008, DJe-202 DIVULG 23-10-2008 PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-16 PP-03262 RTJ VOL-00213-01 PP-00719)
2 EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. IMPENHORABILIDADE DOS BENS. EXECUCÃO FISCAL. OBSERVÂNCIA DO REGIME DE PRECATÓRIOS. COMPETÊNCIA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Os bens, as rendas e os serviços da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos são impenhoráveis, e a execução deve observar o regime de precatórios. 2. Nas comarcas onde não há Vara da Justiça Federal, os Juízes Estaduais são competentes para apreciar a execução fiscal. (RE 393032 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 27/10/2009, DJe-237 DIVULG 17-12-2009 PUBLIC 18-12-2009 EMENT VOL-02387-07 PP-01119 RT v. 99, n. 893, 2010, p. 167-170 LEXSTF v. 32, n. 373, 2010, p. 180-185)
3 Apesar da existência de decisão do STF afirmando a necessidade de motivação para demissão de funcionários de quaisquer empresas estatais (RE 589.998), vale trazer a Orientação Jurisprudencial n. 247 do Tribunal Superior do Trabalho - TST que, mesmo indo de encontro àquele entendimento, o preserva em relação à ECT: SERVIDOR PÚBLICO. CELETISTA CONCURSADO. DESPEDIDA I MOTIVADA. EMPRESA PÚBLICA OU SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. POSSIBILIDADE. I - A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade; II - A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do rnesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais.
4 Importa lembrar que só podemos considerar um serviço como público se houver previsão na Constituição Federal ou em lei. Valendo-nos da noção do Professor Alexandre dos Santos Aragão, "serviços públicos são as atividades de prestação de utilidades econômicas a indivíduos determinados, colocadas pela Constituição ou pela lei a cargo do Estado, com ou sem reserva de titularidade, e por ele desempenhadas diretamente ou por seus delegatários, gratuita ou remuneradamente, com vistas ao bem-estar da coletividade" (ARAGÃO, Alexandre Santos de. O Conceito de Serviços Públicos no Direito Constitucional Brasileiro. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico - REDAE, Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n° 17, fevereiro/março/abril, 2009).
5 Recurso extraordinário com repercussão geral. 2. Imunidade reciproca. Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. 3. Distinção, para fins de tratamento normativo, entre empresas públicas prestadoras de serviço público e empresas públicas exploradoras de atividade. Precedentes. 4. Exercício simultâneo de atividades em regime de exclusividade e em concorrência com a iniciativa privada. Irrelevância. Existência de peculiaridades no serviço postal. Incidência da imunidade prevista no art. 150, VI, "a", da Constituição Federal. 5. Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 601392, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 28/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-105 DIVULG 04-06-2013 PUBLIC 05-06-2013). 

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INTERESSADO: SME/CODAE

ASSUNTO: Contratação da ECT para distribuição domiciliar de leite em pó (Programa Leve Leite)

Cont. da Informação n° 0255/2018-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador Geral do Município 

Encaminho-lhe o presente com o entendimento da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral, que acolho, no sentido da aplicabilidade do entendimento do seu Parecer ementado sob o n. 11.748 aos casos em que o serviço prestado pela ECT não é qualificado como serviço público, entendendo possível a contratação daquela empresa estatal com fundamento no art. 24, VIII, da Lei Federal n° 8.666/93.

São Paulo, 09/03/2018.

TIAGO ROSSI

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP nº 195.910

PGM

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TID 167841114

INTERESSADO: SME/CODAE

ASSUNTO: Contratação da ECT para distribuição domiciliar de leite em pó (Programa Leve Leite)

Cont. da Informação n° 0255/2018-PGM.AJC 

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO - SME

Senhor Secretário

À vista da manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva da Procuradoria Geral do Município, que endosso, no sentido no sentido da aplicabilidade do entendimento do seu Parecer ementado sob o n. 11.748 aos casos em que o serviço prestado pela ECT não é qualificado como serviço público, devolvo o presente para ciência e adoção das providências que julgar pertinentes.

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São Paulo, 09/03/2018.

RICARDO FERRARI NOGUEIRA

Procurador Geral do Município

PGM

 

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo