Processo nº 1994-0.051.131-0
INTERESSADO: Administração Municipal.
ASSUNTO: Regularização da ocupação de imóvel pelo Parque Municipal Raul Seixas.
Informação n. 0965/2017-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONTENCIOSO
Trata o presente da regularização da área ocupada pelo Parque Raul Seixas, localizado no Conjunto Habitacional José Bonifácio, em Itaquera. A questão diz respeito, basicamente, ao fato de o parque ter sido instalado em área originalmente pertencente à Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo – COHAB, sem que tenha ocorrido a aquisição formal do bem pela Municipalidade.
Grande parte dos esforços efetuados, assim, dizem respeito à análise dominial do bem. Nesse sentido, o então PARSOLO havia esclarecido que a área fora reservada à COHAB no âmbito do parcelamento do solo, tendo, portanto, caráter privado (fls. 135). PATR-11, contudo, considerou que a área ocupada pelo Parque Raul Seixas integraria, a partir da instalação deste, o patrimônio municipal, porque teria sido intenção do loteador, desde o princípio, destinar a área ao uso público (fls. 150/151 e 236/238).
No entanto, a Diretoria de PATR entendeu que "embora utilizada como parque, não há como sustentar sua afetação ao domínio municipal por força de concurso voluntário, até porque a COHAB sempre deixou claro que o local lhe pertencia, dispondo-se apenas a deferir uma cessão de uso em favor da PMSP, o que, aliás, poderá se concretizar através de um comodato (vide fls. 122), sem prejuízo do posterior e necessário ajuste patrimonial definitivo, através de uma eventual permuta ou de outra forma cabível" (fls. 240). Tal entendimento foi acolhido pela PGM (fls. 244) e pela então Secretaria dos Negócios Jurídicos (fls. 245).
PATR chegou a propor o encaminhamento a SMG para discussão das alternativas de equacionamento do caso, sobretudo a desapropriação e a doação (fls. 309/311), o que foi referendado pela PGM (fls. 312/314)
SNJ, no entanto, entendendo estar definida a necessidade de equacionamento do caso, encaminhou o expediente a DESAP, para avaliação da desapropriação da área (fls. 315). DESAP considerou, por sua vez, que não seria possível a desapropriação da área, porque a área há muitos anos é utilizada pela coletividade, tendo, por isso, sido integrada no domínio público (fls. 318/321). Diante disso, SNJ encaminhou os autos a SMG, para uma solução definitiva da questão.
Ao analisar o caso, DGPI sustentou que a área estaria afetada ao uso comum, estando, contudo, no domínio da COHAB, porquanto registrada em nome desta. Com uma indicação das possíveis dificuldades decorrentes das alternativas existentes, cogitou-se o ajuizamento de ação declaratória de domínio – o que ensejaria o registro do bem como municipal ou o cancelamento da matrícula – ou o ajuizamento de ação de usucapião. Por outro lado, eventual desapropriação precisaria dar-se sem pagamento, já que a obrigação de indenizar estaria prescrita, podendo o pagamento de obrigação prescrita caracterizar renúncia de receita, vedada pela legislação de responsabilidade fiscal. Eventual doação, venda, dação em pagamento ou permuta, por sua vez, dependeriam de manifestação da PGM quanto aos requisitos a serem observados (fls. 338/350).
No entanto, SEMPLA/ATEP considerou que não caberia considerar o ajuizamento de ação judicial, cabendo à CMPT avaliar os meios consensuais cabíveis, para posterior análise por parte da PGM (fls. 352/355).
Por isso, foi a COHAB instada a manifestar-se (fls. 360), tendo proposto permuta por área equivalente (fls. 377/378).
DGPI solicitou, então, manifestação da PGM, nos termos do art. 87 da Lei Orgânica do Município.
É o relatório do essencial.
Embora a questão do domínio da área já tenha sido enfrentada pelo então Departamento Patrimonial e por esta Procuradoria
Geral, cabe trazer algumas considerações a respeito, sobretudo tendo em vista os pareceres sucessivos, que voltaram a mencionar a afetação da área ao uso comum e os seus possíveis efeitos dominiais. De fato, a solução para o caso é substancialmente diversa caso se entenda que a área é pública por afetação ou caso se considere que a área ainda integra do patrimônio da COHAB.
A existência de uma praça sobre área de terceiro realmente constitui uma realidade impactante. Já chegamos até mesmo a sustentar, em trabalho acadêmico publicado há anos, a impossibilidade de que houvesse bem de uso comum de titularidade particular, em razão da irreversibilidade da situação 1.
No entanto, analisando melhor a questão, verifica-se que não se trata do melhor critério para a identificação dos efeitos da afetação ao uso comum. Na verdade, não parece haver impedimento a que o Poder Público instale o uso comum em bem particular, por meio de alternativas negociais avaliadas segundo o caso concreto, sem que a destinação ao uso comum implique a retirada do bem do patrimônio privado.
Não há motivo, na verdade, para considerar que a utilização de bem de terceiro para a instalação de uso comum seria diferente daquela que se mostra inteiramente consolidada no âmbito dos bens de uso especial. Com efeito, nunca houve discussão acerca da inexistência de efeitos dominiais em decorrência da locação, pelo Poder Público, de um bem particular para a instalação de um escola ou de um hospital, ou mesmo de uma repartição pública. A situação é clara: por meio de um contrato de locação, a Administração obtém a posse direta de um bem para a instalação do uso especial, permanecendo a posse indireta com o locador. Há, no caso, também uma espécie de afetação, fundamentada na necessidade de manutenção do serviço público, mas não é possível atribuir efeitos dominiais a tal fato, porquanto estes são imunizados pelo ajuste entre as partes, o qual, ao prever o desdobramento da posse, até mesmo ratifica do domínio por parte do locador e afasta qualquer forma de apossamento administrativo.
Essa é, na verdade, a questão mais relevante para a solução do caso: a existência de um desdobramento da posse ou de uma posse com animus domini. Se há desdobramento da posse, não é possível afirmar que tenha ocorrido apossamento administrativo, mas uma cessão do bem por parte de seu proprietário. Se a posse é exercida com animus domini, o apossamento tem efeitos dominiais, afastando a possibilidade de reivindicação do bem e fazendo restar ao proprietário somente o pleito de indenização em perdas e danos (art. 35 do Decreto n. 3.365/41).
A irreversibilidade prática de uma dada situação de fato pode indicar que, provavelmente, em algum momento, ocorrerá a incorporação do bem ao domínio do Poder Público. Isso não impede, por certo, que as partes tenham um entendimento no sentido de postergar essa potencial incorporação, reconhecendo o domínio do terceiro e a necessidade de uma futura solução dominial para o caso.
No caso presente, está demonstrado, à exaustão, que a ocupação, por parte da Municipalidade, do bem de titularidade da COHAB, ocorreu por mera tolerância desta. Nesse sentido, é possível identificar que: a) foi considerada a possibilidade uma permissão de uso gratuita em favor do Município (fls. 1); b) foi mencionado que a COHAB pretenderia doar o bem ao Município (fls. 7); c) teria havido um acordo antes da entrega do parque ao uso público, no qual ficou acertado que a COHAB tomaria as providências para a doação do bem ao Município (fls. 12); d) considerou-se a possibilidade de que os autos fossem remetidos à então SNJ, para recebimento da doação (fls. 14); e) foi oficiado à COHAB solicitando a doação do bem (fls. 18/19) e a permissão de uso da área (fls. 30); f) a COHAB considerou a outorga de permissão de uso (fls. 44), tendo enviado minuta do respectivo termo (fls. 45/47), até mesmo, em uma oportunidade, subscrito pela companhia (fls. 64/66); g) DEPAVE afirmou que seria interesse das partes regularizar a ocupação por meio de um termo de permissão de uso (fls. 84); h) a PMSP continuou a tributar o imóvel (fls. 113 e 117; 158/166; 181/205), tendo depois RI tomado providências para cancelamento (fls. 174); i) PATR-12 havia considerado apropriada a celebração de um comodato, cabendo também avaliar a doação da área ao Município (fls. 122); j) COHAB insistiu que não houve doação ou permissão de uso à Municipalidade, repelindo o entendimento de que o bem estaria afetado (fls. 177/178), mencionando a necessidade de uma compensação pela área (fls. 222) e ressaltando que a companhia continua esperando a resposta ao ofício quanto à formalização da permissão de uso (fls. 225).
É certo que jamais houve a regularização da situação por meio de um contrato devidamente firmado, mas também é manifesto que jamais ocorreu a chamada inversão da posse. Desde sempre, a Municipalidade ocupa a área sabendo tratar-se de bem de terceiro, ao passo que a COHAB nunca deixou de se considerar a proprietária do bem, situação consolidada, a partir de fevereiro de 2000, quando a Urbe adotou, de modo expresso, o entendimento segundo o qual a área, apesar de ocupada pela praça, estaria ainda no patrimônio da companhia (fls. 245).
Vale notar, no mais, que as exigências de boa-fé que devem marcar as relações civis em geral se mostram ainda mais pronunciadas no caso das tratativas entre entes da Administração. Há, por exemplo, inúmeras situações de bens municipais ocupados por instalações estaduais – por exemplo, escolas –, que somente são regularizadas muitos anos depois, sem que se considere um apossamento do bem por parte do Estado. Em tais casos, formaliza-se, ainda que tardiamente, um instrumento de permissão de uso em favor do Estado, mantido do domínio municipal do imóvel.
O mesmo se dá em relação às muitas áreas de ocupação recíproca entre o Município e o Metrô, que ainda pendem de uma situação dominial – objeto dos chamados Termos de Acordo e Protocolo de Intenções (cf., por exemplo, a referência contida na Informação n. 602/05 - PGM.AJC). De fato, ainda que áreas pertencentes ao Metrô sejam ocupadas por viário municipal, isso não inibe uma solução entre as partes que tome por base esse domínio por parte do Metrô, sem que se possa afirmar que os direitos da companhia tenham perecido em razão da afetação ao uso comum.
Mais similar ainda ao caso presente foi a situação do chamado Parque do Povo, disponibilizado à coletividade em área de propriedade da Caixa Econômica Federal e do Instituto Nacional do Seguro Social, com base em um contrato de instituição de direito de superfície em favor da Municipalidade. Caso a afetação ao uso comum implicasse necessariamente a retirada do bem do patrimônio do terceiro, tal avença seria inadmissível ab initio, limitando, sem fundamento normativo algum, as alternativas colocadas à disposição a Administração para a obtenção de espaços necessários a realizações de interesse público.
No mais, é preciso ressaltar, até mesmo em vista das observações feitas por DESAP, que o direito de propriedade não estaria totalmente eliminado pela afetação ao uso público, mesmo que esta ocorresse com base em posse caracterizada pelo animus domini.
Neste ponto, é preciso reconsiderar o entendimento da Informação n. 1168/2016 - PGM-AJC, na qual sustentamos que não seria possível a permuta entre bem municipal e imóvel particular afetado ao uso comum sob o argumento de que este já não pertenceria ao proprietário original. Na verdade, os efeitos do apossamento administrativo devem ser interpretados de modo restritivo, até mesmo em função da proteção constitucional à propriedade. Conforme já foi apontado pela doutrina, "caso o apossamento se prolongue e o Estado acabe realizando no imóvel obras ou edificações úteis ou necessárias ao funcionamento de seus serviços, não mais será possível a reintegração do proprietário na posse, sob pena de comprometimento do serviço público"2. Assim, a limitação decorrente do apossamento administrativo deve ser interpretada do modo mais restritivo possível, apenas para o fim de evitar o comprometimento do exercício da atividade pública.
Por isso, deve-se entender que, no caso de afetação ao uso público, o proprietário é privado irreversivelmente da posse, mas somente isso: dessa sorte, o apossamento administrativo não implica a perda da propriedade sobre o bem: "Perde o proprietário, sobre seu bem, certo direito que não é a propriedade, e, reciprocamente, ganha a Administração o que o primeiro perdeu: a posse. A pessoa administrativa é então possuidora de coisa alheia"3. Nesse sentido, o bem não pode ser reavido pelo proprietário em sua integralidade, em especial no tocante às faculdades inerentes à posse, mas isso não implica a extinção do direito de propriedade.
Conforme já se observou:
Os bens indiretamente expropriados, porque aproveitados para fins de necessidade ou utilidade pública, ou de interesse social, não podem ser reavidos in natura. Impossível vindicar o próprio bem, a ação, cujo fundamento é o direito de propriedade, visa, precipuamente, à prestação do equivalente da coisa desapropriada, que é a indenização assegurada na Constituição, como pressuposto do ato de retirada da propriedade4
A ação de desapropriação indireta, assim, constitui uma forma de compor o prejuízo sofrido pelo proprietário, por meio de uma subrogação de direitos, em que o bem passa a pertencer efetivamente ao Poder Público, com sua substituição por um equivalente pecuniário. Dessa forma, "[a]o julgar procedente a ação e estabelecer o valor do ressarcimento, o juiz decretará a incorporação do bem ao patrimônio público"5. É por isso que se tem afirmado que o objeto da desapropriação indireta é o direito de propriedade, substituído pela indenização reclamada pelo proprietário6.
Isso tudo foi muito bem sintetizado em acórdão do Supremo Tribunal Federal:
"Tem ocorrido, com frequência, que o poder público, sem promover a ação, realiza, pela ocupação da coisa, desapropriação de fato, que se passou a chamar desapropriação indireta. Certamente, esse comportamento não deve afastar a garantia constitucional. O direito à indenização que, na desapropriação indireta, assiste ao proprietário, embora a ilegalidade do desapossamento administrativo, tem, na essência, o mesmo fundamento daquele inscrito como garantia constitucional, conferida ao direito de propriedade. O direito à indenização, pressuposto da desapropriação – que é exercício regular de direito–, não pode desaparecer com a ilicitude dos atos praticados pelo desapropriante. (...) A desapropriação, por nenhuma forma, inclusive pelo desapossamento administrativo, poderá ser causa de perda da propriedade, antes da prestação do desapropriante, nos termos da Constituição. O expropriado não perde a propriedade, na desapropriação indireta, pela simples ocupação; poderá perdê-la, se, decorrido o tempo previsto na lei, o desapropriante a tiver adquirido por usucapião"7.
Vale notar, a propósito, que há precedente da PGM admitindo a doação, ao Poder Público Municipal, de bem em expropriação, já ocupado por melhoramento viário, para o aproveitamento do potencial construtivo no lote remanescente (cf. Informação n. 1409/2013 - PGM.AJC). O entendimento, baseado em manifestação de DESAP, é plenamente condizente com a linha de raciocínio citada, porquanto a imissão provisória na posse, ainda que sucedida por uma afetação, continua a constituir uma causa de obtenção da posse, não fazendo perecer o direito de propriedade – o que só ocorre com o pagamento da indenização. A mesma conclusão se impõe no caso do apossamento administrativo, uma vez que tem sido identificada uma ampla similaridade entre a ação de desapropriação indireta e a desapropria-ção comum8. Se, na desapropriação comum, a imissão provisória na posse não acarreta a perda da propriedade, mesmo que ocorra afetação ao uso público, tampouco isso ocorre no caso do apossamento administrativo.
Assim, embora o bem privado já esteja afetado ao uso público, o completo desaparecimento da situação jurídica de proprietário somente ocorre com o recebimento da indenização ou com a extinção do direito a esta, seja pela celebração de um negócio jurídico com o expropriante, seja com a prescrição do direito a ela. Até lá, é possível que o proprietário exerça direitos que não sejam incompatíveis com a afetação do bem – seja em caso de apossamento ou de imissão provisória na posse. É claro que uma propriedade irreversivelmente destituída de posse constitui algo bastante limitado; sem embargo, mesmo nessa situação, o proprietário pode exercer direitos residuais, não apenas ao pleitear a indenização, mas até mesmo ao alienar o bem, inclusive para o próprio Poder Público, fazendo perecer o direito à indenização. É o que ocorre não somente no caso mencionado, da doação para utilização do potencial construtivo, prevista no Código de Obras, mas também na doação para fins de transferência de direito de construir, referida no Estatuto da Cidade (art. 35, § 1º). É o que se dá, igualmente, no caso da permuta do bem afetado com outro bem de titularidade da Administração, alternativa considerada no caso presente.
Assim, no caso em exame, mesmo que estivesse caracterizada alguma espécie de afetação com implicações patrimoniais, não estariam descartadas providências, de caráter dominial, baseadas nos direitos residuais da proprietária, caso estes não estivessem prescritos. Contudo, tampouco parece possível sustentar a prescrição diante da situação existente nos autos, que não permite imputar inércia à companhia, a qual continua aguardando uma solução consensual para o caso, tendo em conta as inúmeras discussões acima relatadas.
É importante ressalvar que o entendimento ora proposto não implica nenhuma diferença prática no tocante à tradicional atuação da Municipalidade em relação aos bens afetados. Destinada uma área ao uso público, o Poder Público pode e deve exercer os direitos plenos de possuidor. Da mesma forma, estão legitimadas todas as providências cabíveis quanto ao cadastramento de imóveis como afetados, sempre que se tratar de uma posse qualificada, irreversível, observado que os direitos residuais do proprietário original tendem à extinção, seja por indenização, composição ou prescrição. Da mesma maneira, não há necessidade de rever nenhuma anotação cadastral que tenha sido feita com base no reconhecimento da afetação ao uso público ou que se refira a efeitos dominais que impropriamente tenham sido atribuídos a esta. Para os fins que interessam ao Poder Público, são extremamente parecidas as situações de domínio pleno e de posse irreversível sobre bem de terceiro. Com efeito, de modo geral, não há necessidade de obter o registro da área apossada perante a Serventia Predial para que ela atenda à sua finalidade pública, já que o apossamento é uma realidade prática incontornável e ostensiva. Caso se entenda necessário o registro civil do bem, conforme as necessidades do caso, ele poderá ocorrer mediante usucapião, cujo reconhecimento poderá ser pleiteado e cujo efeito será a extinção dos referidos direitos residuais do proprietário que ainda figure no registro imobiliário.
Por outro lado, a interpretação proposta – ressalte-se: na linha adotada pelos tribunais superiores – não implica prejuízo algum à Municipalidade, cujo maior interesse, nesses casos, é simplesmente manter a posse do bem, o que nem sequer se encontra em discussão. Na verdade, reconhecer a manutenção de um direito de propriedade, com as significativas restrições decorrentes do apossamento, apenas pode oferecer ao Poder Público a possibilidade de solucionar a questão dominial com base em atos negociais, e não somente por meio do pagamento de indenização. Assim, a interpretação proposta coloca-se, na verdade, em favor dos interesses municipais, pois a flexibilidade por ela proporcionada pode viabilizar soluções práticas que não dependam do dispêndio de recursos financeiros.
De todo modo, no caso presente, seja pelo fato de que a afetação sem animus domini não tem implicações dominiais, seja porque não se encontram prescritos os direitos residuais da COHAB que existiriam mesmo na hipótese de apossamento administrativo, são admissíveis, em tese, todos os instrumentos cogitados para o equacionamento da questão. Com efeito, pode a Municipalidade desapropriar o bem, recebê-lo em doação, comprá-lo ou permutá-lo com outro imóvel. Em cada uma das situações existem as exigências legais próprias, a serem analisadas de acordo com o interesse da Administração.
Cabe, contudo, mencionar alguns desses requisitos, que podem ser considerados pela Administração em eventuais avaliações políticas a respeito. Assim, dos instrumentos considerados, a compra e venda e permuta dependeriam de lei autorizativa e avaliação. No caso da permuta, parece estar demonstrada a necessidade da Municipalidade quanto ao bem da COHAB, cabendo apenas encontrar o bem municipal, de valor equivalente, que poderia ser do interesse da companhia. A desapropriação e a compra, por sua vez, dependeriam da existência de recursos financeiros. Já o recebimento de doação, sem encargo, não exigiria nenhuma dessas providências, devendo ser analisada, sobretudo, sob a perspectiva do regime jurídico aplicável à COHAB (cf. Informação n. 1254/2016 - PGM-AJC).
De todo modo, sendo todos esses instrumentos, em tese, como afirmado, admissíveis para a solução da questão, não é viável oferecer manifestação jurídica conclusiva no tocante ao caso, de maneira que parece possível, tão somente, afirmar a viabilidade, em tese, do prosseguimento do presente, sendo necessário dar continuidade à deliberação discricionária quanto à melhor alternativa a ser adotada.
Assim sendo, sugere-se o retorno do presente ao DGPI, para o devido prosseguimento, podendo ser o caso novamente submetido à Procuradoria Geral do Município quando estiver desenhada uma solução negocial para o caso.
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São Paulo, 10/07/2017.
JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA
PROCURADOR ASSESSOR – AJC
OAB/SP 173.027
PGM
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De acordo.
São Paulo, 14/07/2017.
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
PROCURADORA ASSESSORA CHEFE – AJC
OAB/SP 175.186
PGM
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1Brega, José Fernando Ferreira. Aspectos da aquisição e perda da propriedade imobiliária pelo município. In: Boletim de direito municipal: BDM, v. 26, n. 5, maio, 2010, p. 321.
2Sundfeld, Carlos Ari. Desapropriação. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1990, p. 53.
3Cf. Sé, João Sento. Desapropriação indireta. In: Revista de Direito Público, v. 4, n. 15, jan./mar. 1971, p. 142, com referência a Marcel Waline, Précis de Droit Administratif, p. 77.
4 STF - Pleno, Embargos de Divergência no Recurso Extraordinário n. 63.833/RS, Rel. Min. Eloy da Rocha, j. 18.05.1972.
5Sundfeld, Carlos Ari. Op. cit., p. 54.
6STF - Segunda Turma, Recurso Extraordinário n. 56.705/PB, Rel. Min. Victor Nunes, j. 10.09.1965. No mesmo sentido: "O decreto judicial que a deslinda, a par de ordenar o pagamento da indenização postulada pelo particular – que é o preço do imóvel e seus consectários – determina também a incorporação das áreas ocupadas ao patrimônio do órgão público, com o que se opera a transmissão da propriedade imobiliária, por isso que deve ser entendida como uma forma de alienação" (STJ - Primeira Turma, Recurso Especial n. 46.899-0/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. 16.05.94).
7STF - Pleno, Embargos de Divergência no Recurso Extraordinário n. 63.833/RS, Rel. Min. Eloy da Rocha, j. 18.05.1972.
8"A ação de desapropriação indireta, como é a que se cogita no presente feito, nada mais é senão uma ação de desapropriação direta às avessas, tendo ambas a mesma natureza, em que a indenização pretendida funda-se na transferência da propriedade imobiliária, as duas constituindo-se espécies do mesmo gênero – ação de desapropriação" (STJ - Primeira Turma, Recurso Especial n. 46.899-0/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. 16.05.94).
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Processo nº 1994-0.051.131-0
INTERESSADO: Administração Municipal.
ASSUNTO: Regularização da ocupação de imóvel pelo Parque Municipal Raul Seixas.
Cont. da Informação n. 0965/2017–PGM.AJC
PGM
Senhor Procurador Geral
Com a manifestação da Assessoria Jurídico Consultiva desta Coordenadoria, que acompanho, encaminho-lhe o presente, sugerindo a restituição a DGPI para prosseguimento das discussões discricionárias quanto à melhor alternativa a ser adotada para a definitiva incorporação do bem no patrimônio municipal.
São Paulo, 20/07/2017.
TIAGO ROSSI
PROCURADOR DO MUNICÍPIO
COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO
OAB/SP 195.910
PGM
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Processo nº 1994-0.051.131-0
INTERESSADO: Administração Municipal.
ASSUNTO: Regularização da ocupação de imóvel pelo Parque Municipal Raul Seixas.
Cont. da Informação n. 0965/2017-PGM.AJC
DGPI
Senhora Diretora
Com a manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, ratificando o entendimento da Procuradoria Geral do Município quanto ao fato de que o imóvel em questão continua no domínio da COHAB, restituo-lhe o presente, para prosseguimento das discussões discricionárias quanto à melhor alternativa a ser adotada para a definitiva incorporação do bem no patrimônio municipal.
Acompanha o p.a. n. 2009-0.164.915-1 e os TID n. 14363882 e 2958407.
São Paulo, 21/07/2017
RICARDO FERRARI NOGUEIRA
PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 175.805
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo