RAZÕES DE VETO
OF. ATL nº 105, de 15 de maio de 2008
Ref.: Ofício SGP-23 nº 1733/2008
Senhor Presidente
Por meio do ofício acima referenciado, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 425/07, de autoria do Vereador Ricardo Teixeira, aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão de 9 de abril de 2008, que estabelece normas para repressão à comercialização e ao consumo de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol e conjuntos poliesportivos no Município de São Paulo.
A iniciativa, em síntese, cuida de proibir, nos mencionados equipamentos, o preparo, a venda, a exposição, o oferecimento, o transporte, a guarda, a entrega e o fornecimento, ainda que gratuito, de bebidas alcoólicas, no período de 2 horas antes e 1 hora depois da realização de eventos esportivos profissionais, alcançando a proibição o raio de 1 quilômetro de distância, sob pena de aplicação de multa, cassação do alvará de funcionamento, lacração do imóvel, apreensão da mercadoria e expulsão do infrator que a esteja consumindo.
Revestindo-se a mensagem aprovada de inegável mérito e atualidade, à vista dos recentes episódios de violência em dias de jogos envolvendo grande número de pessoas, a deliberação desta Chefia do Executivo não poderia ser outra senão o acolhimento da propositura, apondo-lhe, contudo, veto parcial que atinge o inteiro teor do § 1º do artigo 1º, o "caput" e o parágrafo único do artigo 5º e o artigo 9º, fazendo-o com supedâneo no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica deste Município, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, na conformidade das razões que passo a aduzir.
Em primeiro lugar, assinalo que o § 1º do artigo 1º do projeto em análise não detém, no plano concreto, condições mínimas de aplicação. Isso porque, ao estender a vedação da prática de todas as condutas constantes do "caput" do mencionado artigo ao raio de 1 quilômetro de distância dos estádios de futebol e conjuntos poliesportivos, o dispositivo acabaria por alcançar inúmeros estabelecimentos que exercem as atividades de restaurantes, bares, hotéis, casas noturnas e padarias, dentre outras, situados nas proximidades dos indigitados equipamentos, muitos deles sem a freqüência de torcedores esportivos, os quais não poderiam sequer manter expostas, em suas vitrines ou balcões, a referida mercadoria para consumo.
A prevalecer tal disposição, configurar-se-ia, sem razão lógica que a justifique, descabida restrição à atividade lícita regularmente exercida por esses estabelecimentos.
De igual modo, o "caput" e o parágrafo único do artigo 5º da medida aprovada veiculam comandos de impossível cumprimento, haja vista a imprecisão e a generalidade da conduta e da pena ali previstas, especialmente em se considerando a abrangência relativa ao citado raio de 1 quilômetro.
É evidente que esses dispositivos se contrapõem ao princípio da razoabilidade, albergado pelo artigo 81 da Lei Maior Local e pelo artigo 111 da Constituição do Estado de São Paulo, que impõe ao Poder Público a prática de atos adequáveis, compatíveis e proporcionais, de modo a restar atendida a sua finalidade pública específica.
Discorrendo sobre o tema, Adilson Josemar Puhl, ao considerar a proporcionalidade um dos elementos que integra o Princípio da Razoabilidade, assim explicita:
"Por último, o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito diz respeito a um sistema de valoração, na medida em que se garante um direito muitas vezes é preciso restringir outro, situação juridicamente aceitável somente após um estudo teleológico, no qual se conclua que o direito juridicamente protegido por determinada norma apresenta conteúdo valorativamente superior ao restringido.
O juízo de proporcionalidade permite um perfeito equilíbrio entre o fim almejado e o meio empregado, ou seja, o resultado obtido com a intervenção na esfera de direitos do particular deve ser proporcional à carga coativa da mesma.
O princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, dessa forma, é o princípio constitucional segundo o qual, sempre que houver poderes que colidam com direitos ou interesses legalmente protegidos dos particulares, a Administração Pública deve atuar segundo o princípio da justa medida, quer dizer, adotando, dentre as medidas necessárias para atingir os fins legais, aquelas que implicam o sacrifício mínimo dos direitos dos cidadãos. As decisões da administração que afetam direitos e interesses dos cidadãos, só devem ir até onde sejam imprescindíveis para assegurar o interesse público, não devendo utilizar-se de medidas mais gravosas quando outras, que o sejam menos prejudiciais, forem suficientes para atingir os fins da lei." (O Princípio da Proporcionalidade ou da Razoabilidade, Ed. Pillares, 2005, pp. 61/62).
Note-se, a propósito, que a Lei Estadual de São Paulo nº 9.470, de 27 de dezembro de 1996, de modo mais razoável e proporcional, coíbe a venda, distribuição ou utilização de bebidas alcoólicas, nos dias de jogos, em um raio de 200 metros das entradas dos estádios de esporte.
De outra parte, também não poderá ser sancionado o disposto no artigo 9º do texto aprovado, o qual revoga a Lei Municipal nº 12.402, de 3 de julho de 1997. Isso porque, como a restrição prevista no "caput" do artigo 1º da propositura dirige-se tão-somente aos eventos esportivos profissionais, se a lei municipal vigente - que impede a comercialização de bebidas alcoólicas antes e durante a ocorrência de eventos esportivos em geral - fosse retirada do mundo jurídico, os eventos esportivos amadores restariam sem qualquer limitação nesse sentido.
Nessas condições, evidenciadas as razões de interesse público e de ordem legal constitucional que me compelem a vetar parcialmente a medida aprovada, atingindo, diga-se mais uma vez, o inteiro teor do § 1º do artigo 1º, o "caput" e o parágrafo único do artigo 5º e o artigo 9º, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB, Prefeito
Ao Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo