Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 472/06
OF. ATL nº 66/09
Ref.: Ofício SGP-23 nº 00159/2009
Senhor Presidente
Reporto-me ao ofício em referência, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia da lei decretada por essa Egrégia Câmara, relativa ao Projeto de Lei nº 472/06, de autoria do Vereador Juscelino Gadelha, que dispõe sobre a criação do Museu da Memória Política da Cidade de São Paulo.
O texto estabelece que o cogitado museu seja composto por objetos, fotografias, películas, documentos dos partidos políticos, periódicos e outros elementos que constituem a referida memória. Consoante a Justificativa do Vereador, a nossa cidade é repleta de história política das diversas lutas de sindicatos, de ações do legislativo, de campanhas eleitorais, de produção literária, de marketing, de questões ambientais e inúmeros assuntos que merecem a catalogação em acervo voltado unicamente à memória política da capital.
Embora reconhecendo a importância do tema afeto ao equipamento cultural que a propositura pretende instituir, vejo-me compelido a apor veto total à mensagem, pelos fundamentos que passo a expor.
De início, observo que um museu é uma instituição que apresenta peculiaridades ímpares, que devem ser levadas em conta para sua viabilização. Nos termos do artigo 1º da recente Lei Federal nº 11.904, de 14 de janeiro de 2009, que institui o Estatuto de Museus, “consideram-se museus, para os efeitos desta lei, as instituições sem fins lucrativos que conservam, investigam, comunicam, interpretam e expõem, para fins de preservação, estudo, pesquisa, educação, contemplação e turismo, conjuntos e coleções de valor histórico, artístico, científico, técnico ou de qualquer outra natureza cultural, abertas ao público, a serviço da sociedade e de seu desenvolvimento”.
Com efeito, há museus de diversos tipos e características (museus fechados e ao ar livre; museus de arte, história e ciência; museus genéricos e especializados; contemplativos e interativos). Diante desse leque de possibilidades, há que se identificar a vocação da instituição museológica, bem como definir sua concepção e seus objetivos, previamente à sua criação. Trata-se da denominada “musealização”, ou seja, pode ser tanto a transformação em museu de um determinado acervo (organizar, catalogar, apresentar e conservar peças de interesse museológico, como ocorre com o Museu do Ipiranga), quanto em eleger-se um determinado tema, em função do qual o museu irá reunir informações e realizar apresentações culturais, servindo-se dos meios tecnológicos, segundo a técnica museológica moderna, como é o exemplo do Museu da Língua Portuguesa.
Nesse sentido, a citada Lei Federal nº 11.904, de 2009, em seu artigo 45, aborda tal questão em função do Plano Museológico, o qual “é compreendido como ferramenta básica de planejamento estratégico, de sentido global e integrador, indispensável para a identificação da vocação da instituição museológica para a definição, o ordenamento e a priorização dos objetivos e das ações de cada uma de suas áreas de funcionamento, bem como fundamenta a criação ou a fusão de museus, constituindo instrumento fundamental para a sistematização do trabalho interno e para a atuação dos museus na sociedade”.
Tal plano deverá definir sua missão básica e sua função específica na sociedade, contemplando o diagnóstico participativo da instituição, podendo ser realizado com o concurso de colaboradores externos. Também fará a identificação dos públicos a quem se destina o trabalho do museu.
Superadas essas questões iniciais, que definirão as diretrizes para a atuação da Administração, a criação do cogitado equipamento deve contemplar as funções de reconhecimento do material de interesse desse museu, bem como a guarda, preservação, restauro e divulgação do patrimônio histórico e cultural relativo à memória política da Cidade.
Para tanto, há que se levar em conta a real existência de um acervo, isto é, os bens materiais ou virtuais de que irá se compor, ou seja, em outras palavras, os elementos que justifiquem a ideia subjacente à sua criação.
Em seguida, seguir-se-ão as medidas concretas para efetiva execução do equipamento, com a designação de uma área física, consistente de construções ou espaços destinados para a exposição das coleções ou sua guarda, restauro e pesquisa. Além disso, é necessária a reserva de recursos para a implantação inicial, bem como para viabilizar a demanda de atualização e a continuidade dos projetos. O respectivo orçamento contemplará, ainda, o aporte financeiro para as atividades de manutenção física dos prédios e acervos, vigilância e limpeza, manutenção de atividades educativas, culturais e de difusão do museu.
Como se vê, o conjunto de providências prévias e necessárias à instituição do alvitrado museu demanda múltiplas ações, seja na área técnica pertinente ao assunto, seja na área administrativa, a implicar significativos encargos aos órgãos municipais, malferindo, anote-se, o artigo 37, § 2º, inciso IV, o artigo 69, inciso XVI e o artigo 70, inciso XIV, todos da Lei Orgânica Municipal.
Concluindo, embora reconhecendo o mérito da iniciativa, as razões expendidas demonstram inexistir, no momento, condições técnicas e legais para eventual criação por lei do Museu da Memória Política da Cidade de São Paulo, pelo que sou compelido a vetar integralmente a propositura, nos termos do § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica local, devolvendo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo