Razões de veto ao Projeto de Lei nº 439/07
RAZÕES DE VETO
Ofício ATL nº 016, de 13 de março de 2020
Ref.: Ofício SGP-23 nº 00109/2020
Senhor Presidente em Exercício
Nos termos do ofício em referência, Vossa Excelência encaminhou a esta Chefia do Executivo cópia da lei decretada por essa Egrégia Câmara em sessão de 12 de fevereiro do corrente ano, relativa ao Projeto de Lei nº 439/07, de autoria dos Vereadores Adilson Amadeu e Adolfo Quintas, que objetiva dispor sobre a obrigatoriedade de, no território do Município, todos os estabelecimentos comerciais que vendam produtos com prazo de validade informarem em cartaz, de forma visível, quando o prazo da mercadoria tiver ou estiver com sua validade inferior a 30 dias, sob pena de cominação de multa no valor e forma que especifica.
Ainda, segundo a medida, o aludido cartaz deve ser escrito em letra de forma vermelha, numerador em preto indicando de modo decrescente os dias restantes para o vencimento do produto e com tamanho que possibilite sua nítida visualização pelo consumidor.
Contudo, o exame do mérito da propositura indica que o ordenamento jurídico vigente já contempla a disciplina da matéria em foco, inclusive mediante abordagem mais ampla e técnica, como a seguir se expõe.
No âmbito federal, destaca-se o artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor, ao estatuir que a oferta e a apresentação dos produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidade, quantidade, composição, preço, garantia, “prazo de validade” e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
A seu turno, o Código Sanitário do Município de São Paulo, instituído pela Lei n° 13.725, de 9 de janeiro de 2004, prescreve que a rotulagem dos produtos e substâncias de interesse da saúde, como os alimentos, deve obedecer às exigências da legislação vigente (artigos 44 e 49).
Melhor detalhando e especificando essas regras, o regulamento de boas práticas e de controle de condições sanitárias e técnicas das atividades relacionadas à importação, exportação, extração, produção, manipulação, beneficiamento, acondicionamento, transporte, armazenamento, distribuição, embalagem e reembalagem, fracionamento, comercialização e uso de alimentos, aprovado pela Portaria nº 2.619, da Secretaria Municipal da Saúde, publicada no Diário Oficial da Cidade de 6 de dezembro de 2011, disciplina, nos seus infindáveis dispositivos (subitens 4.7, 5.7, 6.1, 6.4, 6.8, 6.9, 6.10, 6.11, 6.27, 6.30, 7.40, 8.2.1, 8.2.2. e 9.4, além de tantos outros), a obrigatoriedade de registro dos prazos de fabricação e expiração nas embalagens e rotulagens dos produtos, sendo terminantemente proibida a sua venda e utilização com prazos de validade vencidos, sem identificação ou sem o registro no órgão competente, nos termos da legislação vigente.
Demais disso, na conformidade do preconizado nos artigos 2º e 3º da supracitada portaria da Pasta da Saúde, os estabelecimentos são obrigados a cumprir as boas práticas e os procedimentos operacionais padronizados ali estabelecidos, configurando infração sanitária a sua desobediência, punível de acordo com os preceitos em vigor, especialmente da forma fixada pela citada Lei nº 13.725, de 2004 – Código Sanitário do Município de São Paulo.
De outra parte, mesmo que assim não fosse, tal admitindo-se para viabilizar a continuidade da argumentação, ao determinar que os dados referentes aos prazos de validade dos produtos sejam apostos em “cartazes”, a aprovação da iniciativa impediria a possibilidade de utilização de painéis eletrônicos ou de outros meios de alerta aos consumidores, tais como lousas ou outros métodos de escrita em superfícies reaproveitáveis. De se ressaltar, outrossim, que a dinâmica de vencimento da validade dos produtos alimentícios, por sua própria natureza de perecibilidade, implicaria trocas diárias dos cartazes, com vistas à inclusão das mercadorias alcançadas, naquele dia, pelo prazo previsto na propositura, bem como daqueles recebidos pelo estabelecimento. De mais a mais, inúmeras situações em produtos específicos, com prazos de validade inferiores a 30 dias, como é o caso do queijo fresco cujo vencimento se dá em, no máximo, 20 dias, demonstram a inviabilidade prática da adoção da medida, a qual, é de se supor, aplicar-se-ia a centenas, e mesmo milhares, de itens expostos à venda.
Pondere-se, também, que nada garante que os “cartazes” sejam lidos pelos consumidores, pois todos os prazos de validade devem constar individualizadamente em cada produto. Na verdade, o que é necessário é a educação consumerista, a fim de que haja a prática constante de verificação de todos os fatores que afetam a qualidade do produto – dentre eles data de validade e, acima de tudo, as condições de conservação – tanto no estabelecimento quanto na residência do consumidor. Nesse sentido, é de registrar que desde outubro de 2011 vigora a campanha “De Olho na Validade”, fruto da parceria entre a Associação Paulista de Supermercados – APAS e a Fundação PROCON-SP, em virtude da qual o consumidor tem direito a receber gratuitamente produto igual ou similar se porventura vier a encontrá-lo com prazo de validade vencido nas gôndolas dos supermercados paulistas, sendo esse, efetivamente, o tipo de iniciativa que, com certeza, cria nas pessoas o hábito de checar as informações constantes do rótulo ou embalagens das mercadorias antes de se decidir pela sua compra, notadamente quando o prazo da validade estiver vencido ou próximo da data de seu vencimento.
Em conclusão, como se pode observar, a matéria se encontra adequada e sistematicamente disciplinada, revelando-se inconveniente a superveniente edição de norma legal que venha a dispor sobre a mesma matéria em desacordo, também, com o disposto no inciso IV do artigo 7º da Lei Complementar Federal nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação e a consolidação das leis, bem como estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que especifica.
Em assim sendo, sou compelido a vetar na íntegra o projeto aprovado, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, devolvendo o assunto a essa Egrégia Câmara, para o sempre criterioso reexame.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.
EDUARDO TUMA, Prefeito em Exercício
Ao Excelentíssimo Senhor
MILTON LEITE
Digníssimo Presidente em Exercício da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo