CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

Acessibilidade

Razões do Veto (LEI Nº 18.173 de 25 de Julho de 2024)

RAZÕES DE VETO

Projeto de Lei nº 247/24

Ofício ATL n° 107382241

Ref.: Ofício SGP-23 n° 543/2024

 

Senhor Presidente,

 

 

Por meio do ofício acima referenciado, essa Presidência encaminhou à sanção cópia do Projeto de Lei nº 247/24, de autoria do Executivo, aprovado em sessão de 03 de julho de 2024, que dispõe sobre as diretrizes orçamentárias para o exercício de 2025.

O texto vindo à sanção, contudo, não detém condições de ser sancionado em sua íntegra, sendo indeclinável a aposição de veto parcial, atingindo integralmente as seguintes disposições acrescidas ao texto original:

 

1) Inciso IV do “caput” do art. 3°

Durante o trâmite legislativo, foram acrescidos ao texto do inciso IV do “caput” do art. 3º da propositura, no que tange à apresentação de informações relativas ao orçamento e sua execução, novos segmentos como raça, gênero, condição socioeconômica e impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial.

Entretanto, a nova redação não é clara quanto ao sentido do trecho inserido na proposta inicial, isto é, se as especificidades em questão são inerentes exclusivamente aos atributos dos munícipes que acessam os dados de planejamento e execução orçamentária e os meios a serem utilizados para promover a transparência ativa, ou se as especificidades são inerentes ao conteúdo dos dados a que se dá transparência (ou seja, dotações orçamentárias relacionadas com especificidades oriundas de raça, gênero, condição socioeconômica e impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial), considerando o trecho em conjunto com outros dispositivos incluídos durante o trâmite legislativo, caso dos incisos XII, XIII e XIV do art. 21 do PL. Em ambos os casos, é essencial estudar as medidas necessárias para o atendimento às especificidades ali postas e mensurar os recursos necessários para sua implementação. Especialmente no segundo caso, tal providência ainda não se configura factível, em decorrência de limitações técnicas e metodológicas para a indicação adequada da especificidade das despesas a questões de gênero, igualdade racial e demais segmentações incluídas no texto.

2) § 2° e seus incisos (I a CLXXXV) do art. 8°

Os dispositivos em questão objetivam ampliar as metas e prioridades da Administração Municipal para o exercício de 2025 mediante o acréscimo de 185 (cento e oitenta e cinco) ações prioritárias além daquelas já consignadas no § 1º do mesmo artigo e no Anexo III - Metas e Prioridades do texto aprovado.

Entretanto, a inovação está em desacordo com o objeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias, posto que pretende veicular comandos atinentes a ações governamentais específicas e concretas (algumas iniciativas ora em andamento pelo Executivo), o que retira a possibilidade da necessária avaliação político-administrativa quanto à implementação de novas medidas propostas.

Por outro lado, conforme evidencia o conteúdo do aludido Anexo III, que acompanhou a mensagem originalmente encaminhada pelo Executivo, a previsão das metas e prioridades, além de discriminar cada ação governamental, deve igualmente conter, também de forma individualizada, a estimativa dos respectivos valores financeiros, sob pena de inviabilidade de sua concretização por absoluta carência de recursos. Com efeito, considerando que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) orienta a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA), deve ela contemplar o dimensionamento financeiro de todas as metas e prioridades para o exercício ao qual se refere, daí a impropriedade orçamentária dos indigitados acréscimos.

Merece destaque, ainda, a inclusão de incisos voltados à destinação de percentual mínimo de recursos arrecadados a setores específicos de políticas públicas, incorrendo, desse modo, em vinculação de receita de tributos, contrariando as disposições do art. 167, inciso IV, da Constituição Federal de 1988.

3) Incisos XII, XIII e XIV do “caput” do art. 21

Os incisos XII e XIII do “caput” do art. 21 do PL objetivam a disponibilização de informações do orçamento segregadas no tocante às destinações específicas para as políticas públicas de gênero e de igualdade racial. Contudo, há de ser considerada a momentânea impossibilidade de ordem técnica, sistêmica e metodológica para indicar adequadamente as despesas e inter-relações do orçamento público com dimensões de gênero e igualdade racial, tendo em vista as melhores práticas em execução no orçamento público de outros entes federativos e casos internacionais para a apresentação de dados do orçamento conforme a segmentação proposta.

Para que seja possível apresentar de forma adequada o orçamento público sensível a gênero e igualdade racial, é necessário implementar antes um conjunto de análises preparatórias e adequações para identificar as ações voltadas a esses recortes temáticos (para além da mera descrição das ações orçamentárias), estimar o impacto gerado por todas as ações orçamentárias e estabelecer um modelo coeso e coerente de demonstrativo que sirva aos propósitos incorporados no espírito dos dispositivos ora propostos - esforços esses que, até o prazo de apresentação do Projeto de Lei Orçamentária Anual para o exercício de 2025, que se finda em 30 de setembro de 2024, não são exequíveis. Caso se opte por implementar na LOA de 2025 os demonstrativos sugeridos sem os necessários estudos e medidas preparatórias, corre-se o risco de apresentar informações incompletas e de forma inadequada.

Por sua vez, o inciso XIV contém matéria estranha à LDO, em contrariedade ao disposto no art. 165, § 2º, da Constituição Federal de 1988.

4) Incisos IV e V do § 2° do art. 38

Os incisos apontados visam a ampliar as despesas que não serão objeto de limitação de empenho. Contudo, se acolhida, a pretensão acarretaria o aumento da rigidez orçamentária e restrição demasiada da discricionariedade do Executivo diante de eventual necessidade justificada ou, ainda, de revisão de gastos, em busca de eficiência e eficácia, dificultando, sobremaneira, o cumprimento das metas e prioridades destacadas no diploma legal em relevo e trazendo, por conseguinte, risco à estabilidade das contas públicas – o que não se afigura razoável.

Outrossim, importa esclarecer que as ações de zeladoria das Subprefeituras já permeiam as ações previstas no Anexo III - Metas e Prioridades, consubstanciando redundância que em nada contribui para a operacionalização da norma. De outro lado, os recursos advindos de convênios em vigor provêm da União ou do Estado, descabendo, assim, impor essa responsabilidade à Prefeitura.

5) Art. 42 e seus parágrafos

O art. 42 e seus parágrafos prescrevem comando legal que, para fins de controle dos contratos de gestão e dos termos de parcerias com as organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIPs) e demais associações civis e organizações assemelhadas, impõe ao Executivo a criação de códigos de itens ou subitens de despesa próprios no sistema de execução orçamentária, que, segundo o detalhamento indicado, deverão ser disponibilizados mensalmente em base de dados aberta, conforme especifica.

Contudo, na forma como se encontra redigido, o referido dispositivo incorre na mesma impossibilidade de atendimento que afeta os incisos XII, XIII e XIV do “caput” do art. 21 do PL, posto que a obrigação gerada à Administração no exercício de 2025 exige esforços de definição de regras e configuração sistêmica que exigem maior tempo de adaptação do que o disponível até o início do referido exercício. Caso o dispositivo seja mantido, corre-se o risco de haver incompletude ou inadequação das informações coletadas e disponibilizadas, considerando que, atualmente, a alocação de recursos transferidos para as aludidas entidades (OSs, OSCIPs, etc.) não é informada nos moldes previstos pelo art. 42 do PL e que, possivelmente, os instrumentos jurídicos dos ajustes vigentes não necessariamente exigem o fiel desmembramento dos valores totais pactuados em itens e subitens de despesa.

Dessa forma, é necessário maior planejamento e tempo de adaptação e adequação para que as informações sejam tempestiva e adequadamente informadas e disponibilizadas ao público. Caso contrário, qualquer divisão de valores por item e subitem poderia ser aproximada e não totalmente aderente à efetiva execução.

6) Art. 50 e seus parágrafos

Por meio do art. 50 e seus parágrafos, busca-se tornar obrigatória, nas condições e formas especificadas, a execução orçamentária e financeira das emendas parlamentares, conforme critérios para execução equitativa, em montante correspondente a 0,8% da Receita Corrente Líquida realizada no exercício de 2024, devendo a Lei Orçamentária Anual (LOA) definir percentuais mínimos a serem destinados para ações e serviços públicos de saúde e para outros investimentos.

Todavia, o disposto não deve prevalecer, haja vista tratar-se de dispositivo ilegal, conforme já declarado pelo Supremo Tribunal Federal (AR 929, Relator Min. Rodrigues Alckmin, Tribunal Pleno, julgado em 25.02.76, RTJ Vol. 78, pág. 339).

Adicionalmente, o tema não é pertinente à matéria a ser tratada pela LDO. Em outras palavras, as leis de diretrizes orçamentárias não gozam de força normativa suficiente a ensejar o nascimento de direitos subjetivos a eventuais interessados na concretização das políticas públicas nela enunciadas. Nem poderia ser diferente, vez que constitui o plano de ação e planejamento estatal, cabendo ao administrador público, diante de situações concretas, sobretudo diante de escassez de recursos, dar prioridade a determinadas despesas – ajustando os gastos diante das necessidades ao longo do exercício, pelo que não se afigura consentânea, no caso, a pretendida previsão de obrigatoriedade de execução orçamentária e financeira das aludidas emendas parlamentares.

Além disso, a existência de emendas de execução obrigatória, vale dizer, que extrapolam as vinculações legais e constitucionais já existentes, aumenta a rigidez do orçamento municipal. Dessa forma, as emendas parlamentares não devem se subtrair do disposto no artigo 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal, de observância compulsória pelos entes federativos, que expressamente prevê a obrigatoriedade de limitação de empenho e de movimentação financeira, por parte do Poder Executivo, em caso de risco de atingimento das metas de resultado fiscal.

7) Parágrafo único do art. 51

Embora o “caput” do art. 51 esteja alinhado com o art. 50 da LDO de 2024 e com o art. 53 da LDO de 2023, razão pela qual merece sanção, seu parágrafo único deve ser vetado, pois estabelece índice de correção diverso do previsto na Lei nº 10.734, de 30 de junho de 1989, e alterações posteriores, bem como, de forma mediata, vincula receita de impostos, contrariando as disposições do art. 167, inciso IV, da Constituição Federal de 1988.

8) Art. 52

O art. 52 do PL impõe ao Poder Executivo a disponibilização, em seu sítio eletrônico, dos valores arrecadados mensalmente, relativamente ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS, dos grupos de serviços elencados na lista da Lei Complementar Federal nº 116/2003, destacando-se os grupos relacionados a “Serviços de Intermediação e Congêneres” e os “Serviços relacionados ao setor bancário ou financeiro, inclusive aqueles prestados por instituições financeiras autorizadas a funcionar pela União ou por quem de direito”.

Não obstante o mérito da proposta e da importância de seus propósitos, a regra, na forma disposta, colide com o art. 198 do Código Tributário Nacional, que determina ser vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades (sigilo fiscal). A violação ao sigilo fiscal previsto no Código Tributário Nacional decorre do fato de haver grupos de serviços elencados na Lei Complementar Federal nº 116/2003, para os quais, por possuírem baixa quantidade de prestadores cadastrados, a divulgação da arrecadação do grupo equivaleria a divulgar o desempenho econômico e negocial de cada um desses prestadores.

Há, também, risco aos interesses econômicos do Município com a possível divulgação da arrecadação tributária com tal nível de granulometria, eis que tais dados poderiam, eventualmente, servir para informar a atuação focada e específica de outros Municípios no sentido de identificar setores com elevado crescimento da arrecadação do ISS (ou elevado potencial arrecadatório) e, ato contínuo, promover medidas de renúncia fiscal ou outros incentivos destinados a convencer prestadores de serviços a deixarem o Município de São Paulo e estabelecerem-se em seu território (concorrência fiscal predatória ou “guerra fiscal”).

Ademais, a exigência trata de matéria estranha à LDO, conflitando com o disposto no art. 165, § 2º, da Constituição Federal de 1988.

9) Art. 55

O disposto no art. 55 da propositura, além de incorrer nas mesmas impropriedades destacadas no tocante ao art. 50 do PL, acaba por privar o Executivo de sua competência para a definição da proposta orçamentária.

10) Art. 56

O dispositivo em questão, ao estabelecer percentual mínimo da receita orçamentária a ser destinado à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, gera vinculação da receita de impostos, violando o disposto no inciso IV do art. 167 da Constituição Federal de 1988.

11) Art. 57

O art. 57 da propositura estabelece percentual mínimo da receita orçamentária a ser destinado ao Fundo Municipal de Assistência Social - FMAS, configurando vinculação da receita de impostos, vedada pelo inciso IV do art. 167 da Constituição Federal de 1988.

12) Art. 58

O art. 58 da propositura cuida de matéria eminentemente de execução contratual ou ajuste similar, tema, portanto, estranho ao rol de matérias da LDO, violando as disposições do art. 165, § 2º, da Constituição Federal de 1988.

13) Art. 59

O art. 59 da propositura estabelece a utilização do índice de distribuição territorial, composto por indicadores das dimensões de vulnerabilidade social, infraestrutura urbana e demografia, aplicado de forma regionalizada no território do Município de São Paulo, conforme o art. 5º da Lei nº 17.729/2021, para todas as despesas de investimento no exercício de 2025.

Entretanto, no Plano Plurianual de Ações de 2022-2025 (Lei nº 17.729/2021), o referido índice não abrange a totalidade dos valores previstos para investimento no quadriênio, pelo fato de que tal determinação cercearia a destinação de investimentos necessários ao funcionamento da cidade em outras localidades, bem como a consecução de outras ações previstas no mesmo Plano Plurianual de Ações (PPA) e no Anexo III - Metas e Prioridades da LDO.

O dispositivo é, ainda, conflitante com o art. 54 do PL, que propõe a adoção preferencial do mesmo índice para a parcela remanescente dos investimentos municipais, uma vez atendidas as metas e prioridades definidas na LDO e nos demais instrumentos de planejamento urbano, estratégico e setorial vigentes.

14) Art. 60

O art. 60 do PL, ao prever a possibilidade de o Poder Executivo firmar contratações diretas por dispensa de licitação em regime emergencial até o limite de 50% (cinquenta por cento) dos valores empenhados com contratações emergenciais no exercício de 2023, trata de matéria estranha à LDO, violando o disposto no art. 165, § 2º, da Constituição Federal de 1988.

Ante o exposto, com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo e evidenciadas as razões que me conduzem a apor veto aos dispositivos acima mencionados, devolvo o assunto ao reexame dessa Egrégia Câmara Municipal, renovando a Vossa Excelência os meus protestos de elevado apreço e consideração.

 

 

RICARDO NUNES

Prefeito

 

 

Ao Excelentíssimo Senhor

VEREADOR MILTON LEITE

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

Documento original assinado nº 107382241