RAZÕES DE VETO
Ofício ATL nº 100, de 27 de junho de 2006.
Ref.: Ofício SGP-23 nº 2016/2006
Senhor Presidente
Por meio do ofício acima referenciado, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 170/06, de autoria do Vereador José Police Neto, aprovado por essa Egrégia Câmara Municipal na sessão de 24 de maio do corrente ano, que objetiva estabelecer indicadores de desempenho relativos à qualidade dos serviços públicos no Município de São Paulo.
Revestindo-se a mensagem de inegável interesse público, visto que em muito incrementará e otimizará a concretização do princípio constitucional da eficiência no âmbito local, dada a avaliação periódica da qualidade dos serviços prestados mediante a utilização de indicadores de desempenho, a deliberação desta Chefia do Executivo não poderia ser outra senão o acolhimento do texto aprovado, apondo-lhe, contudo, veto parcial que atinge o inteiro teor do parágrafo único do artigo 3º, do artigo 5º, do § 2º do artigo 6º e dos artigos 19, 20 e 21, fazendo-o com supedâneo no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica deste Município, na conformidade das razões a seguir aduzidas.
Por primeiro, cumpre asseverar que não se afina com o princípio da independência e harmonia entre os Poderes, previsto no artigo 2º da Constituição Federal, também consignado no artigo 6º da Lei Maior local, a previsão inserida no parágrafo único do artigo 3º da medida aprovada, segundo a qual o Executivo e demais prestadores de serviços fornecerão à Câmara Municipal, nos prazos por esta determinados, os dados anuais necessários à apuração dos indicadores de desempenho. Em outras palavras, quer isso significar que, uma vez sancionado, referido dispositivo colocaria o Executivo em posição de dependência em relação ao Legislativo, porquanto ficaria a critério deste último a definição do momento em que aquele deveria cumprir sua obrigação de fornecer os aludidos dados anuais. Mais acertado teria sido a fixação de prazo certo no corpo do próprio dispositivo em exame, como, por exemplo, até o primeiro trimestre do exercício subseqüente àquele objeto da avaliação.
Acresce dizer, outrossim, que essa situação torna-se ainda mais inaceitável quando invocado o § 2º do artigo 6º da mensagem, que capitula como infração o não-fornecimento dos dados à Câmara Municipal, nos termos do acima comentado parágrafo único do seu artigo 3º. Com isso, poder-se-ia chegar ao absurdo da configuração da infração ficar vinculada ao prazo que venha a ser fixado pelo Legislativo, daí a necessidade de também apor-se veto a esse preceito.
De toda sorte, sob o prisma do mérito, o veto a esses dispositivos seria de rigor. Com efeito, a previsão de que os órgãos e demais prestadores de serviços forneçam dados diretamente à Câmara Municipal afigura-se de todo inconveniente para alcançar os objetivos pretendidos, dada a grande quantidade de entes públicos e privados envolvidos, circunstância que dificulta sobremaneira o seu controle. Aconselhável seria, isso sim, incumbir algum órgão da Administração Direta pela centralização e consolidação desses dados, bem assim pela sua divulgação e envio ao Legislativo.
De outra parte, nos termos do artigo 5º do texto aprovado, há a previsão de que a Câmara Municipal distinguirá, anualmente, com certificado de qualidade, os prestadores de serviço e os órgãos da Administração Direta e Indireta que atingirem indicadores de desempenho superiores à media dos últimos 5 (cinco) anos ou que, comparativamente ao ano anterior, obtiverem expressivas melhorias nos indicadores de desempenho em suas respectivas áreas de atuação. Ocorre que o conteúdo desse preceito, assim como o do precedente parágrafo único do artigo 3º, de igual modo acha-se em desconformidade com o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes.
Realmente, por força do disposto no inciso II do artigo 69 da Lei Orgânica, compete privativamente ao Prefeito exercer, com os Secretários Municipais, os Subprefeitos e demais auxiliares, a direção da Administração Municipal, abrangendo, por óbvio, a gestão de todos os serviços públicos. Em sendo assim, cumpre também ao Chefe do Poder Executivo, e não ao Legislativo, avaliar a prestação desses serviços e, se julgar conveniente, reconhecer e prestigiar formalmente os órgãos que venham a otimizar o desempenho de suas atribuições mediante a certificação de sua qualidade ou qualquer outro meio que se preste a essa finalidade.
A apuração é, sem dúvida, instrumento de aferição do desempenho dos órgãos públicos e dos prestadores de serviços, na sua dimensão individual e institucional, decorrente dos poderes hierárquicos, de subordinação e de fiscalização e meio de controle interno e autotutela que o Poder Executivo exerce sobre os próprios atos e serviços.
Em síntese, sob essa ótica, faleceria à Câmara Municipal competência para avaliar e premiar órgãos e entidades municipais, bem como seus prestadores de serviços, dispondo, contudo, de outros meios de controle das atividades do Poder Executivo.
Finalmente, por idênticas razões, a exigência de realização de pesquisa de opinião pública referida nos artigos 19, 20 e 21 da mensagem aprovada, com o objetivo de verificar o nível de satisfação dos usuários, muito embora se revele instrumento de aferição adequado, igualmente não pode prevalecer, pois, além de importar em aumento de despesas, constitui típica matéria de conveniência e oportunidade da Administração.
Efetivamente, por envolver matéria de organização administrativa exclusiva do Executivo, como se disse acima, deve o tema ser examinado sob o aspecto da conveniência, oportunidade e necessidade dos serviços, sendo, evidentemente, descabível sua previsão em lei como condição para sua realização. Haverá, por exemplo, situações em que não será necessário ou mesmo cabível a pesquisa de opinião pública em determinadas áreas de atuação do Poder Público, porquanto o nível de satisfação poderá ser aferido por outros meios disponíveis, inclusive menos onerosos para o serviço público municipal, conforme vier a ser avaliado pelo corpo de técnicos da Prefeitura ou por empresa por esta contratada. Vale dizer, por conseguinte, que a forma como a Administração procederá à essa medição será definida caso a caso e no momento oportuno.
Nessas condições, evidenciadas as razões de interesse público e de cunho legal que me compelem a vetar parcialmente a medida aprovada, atingindo, diga-se uma vez mais, o inteiro teor do parágrafo único do artigo 3º, do artigo 5º, do § 2º do artigo 6º e dos artigos 19, 20 e 21, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB, Prefeito
Ao Excelentíssimo Senhor
ROBERTO TRIPOLI
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo