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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.811 de 11 de Dezembro de 2017

EMENTA N° 11.811
A extensão da vedação da exoneração à pedido para servidores que respondem a procedimentos de exoneração em estágio probatório e processos sumários, conforme previsto no parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03, não se compatibiliza com a Constituição e com Lei municipal n° 8.989/79.

2017-0.139.446-0

INTERESSADO: XXXXXXXXXXXXXXXX

ASSUNTO: Pedido de exoneração no curso do procedimento de exoneração em estágio probatório.

Informação n° 1.784/2017-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhor Coordenador Geral

No curso deste procedimento de exoneração em estágio probatório, em função de inassiduidade e falta de dedicação ao serviço, o servidor interessado requereu exoneração do cargo que ocupa (fls. 42).

PROCED-2 entendeu que, muito embora o parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03 vede pedidos de exoneração no curso de procedimentos de exoneração em estágio probatório (assim como em procedimentos disciplinares)1, tal previsão desborda da vedação prevista na Lei municipal n° 8.989/79, que apenas proíbe a exoneração do servidor que estiver submetido à inquérito administrativo. Atentou, ainda, que o procedimento de exoneração em estágio probatório não tem caráter punitivo, mas sim o intento de avaliar a capacidade do servidor em executar a função que lhe foi conferida, de forma que a eventual exoneração de ofício decidida ao final do procedimento  não ostenta caráter de pena, e tem os mesmos efeitos de um pedido de exoneração pelo servidor. Lembrou que, caso o servidor em estágio probatório cometa uma conduta caracterizada como procedimento irregular de natureza grave, contra ele será instaurado inquérito administrativo, e não procedimento de exoneração - proibindo-se, assim, a exoneração a pedido. Por fim, notou que idêntica discussão foi realizada nos autos do PA 2016-0.250.753-4.

A diretoria do Departamento endossou a proposta de extinção do feito sem julgamento do mérito em função do pedido de exoneração do servidor.

É o relato do necessário.

No processo 2016-0.250.753-4, mencionado por PROCED, esta Coordenadoria anuiu com a proposta formulada pelo Departamento, considerando, além das questões trazidas por PROCED-2, que a exoneração da servidora já havia se consumado, e não faria sentido anular o ato para, em seguida, exonerá-la de ofício - vide cópia retroencartada da Informação n° 1.586/2017-PGM.AJC. Ao final, foi sugerido, após a extinção de tal processo sem julgamento do mérito, o retorno dos autos à CGC/AJC para estudos destinados à alteração do parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03. Referidos autos ainda não retornaram a esta unidade, razão pela qual, diante do problema semelhante enfrentado neste processo, julgamos adequado que se lhe aproveite para dar solução à questão da previsão do parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03.

Parece-nos assistir razão à PROCED-2 quando se insurge contra a disposição parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03, no que diz respeito à vedação da exoneração a pedido no curso de procedimento de exoneração em estágio probatório. Primeiro, em função da notável falta de razoabilidade da previsão.

De fato, a exoneração em estágio probatório não consiste em penalidade disciplinar: não se trata de uma demissão. Seus efeitos, portanto, são os mesmos de uma exoneração a pedido do servidor. Daí porque não parece fazer sentido impedir tal pedido e impor, à Administração Pública, que gaste recursos escassos para processar, até o final, um procedimento de exoneração, sendo que o máximo que o servidor poderia sofrer seria uma exoneração de ofício. Trata-se do exercício de autoridade completamente desnecessário, se o servidor solicitou, ele próprio, a medida objeto do poder da autoridade. Desconsiderar tal solicitação para impor a mesmíssima medida, com os mesmos efeitos, após um longo processo administrativo, beira o escárnio.

Em segundo, o Estatuto dos Funcionários Municipais (Lei n° 8.989/79) apenas veda a exoneração a pedido quando o servidor estiver submetido à inquérito administrativo - procedimento disciplinar mais grave. Nos termos do diploma legal:

Art. 194 - Uma vez submetido a inquérito administrativo, o funcionário só poderá ser exonerado a pedido, depois de ocorrida absolvição ou após o cumprimento da penalidade que lhe houver sido imposta.

Parágrafo Único. O disposto neste artigo não se aplica, a juízo da autoridade competente para impor a penalidade, aos casos de procedimentos disciplinares instaurados por infração aos incisos I ou II do artigo 188.

Ora, como a exoneração a pedido consiste em direito do servidor2 — como, aliás, não poderia deixar de ser -, qualquer restrição ao seu livre exercício deve ser razoável e encontrar amparo em lei. Norma infralegal não poderia inovar neste sentido, instituindo autonomamente uma vedação ao exercício de um direito consagrado na lei, primeiro porque se trata de matéria sujeita à reserva legal, e segundo porque, ainda que não fosse matéria reservada à lei, a partir do momento em que a lei consagra um direito, não pode um decreto condicionar ou vedar seu exercício, se não tiver base em algum diploma legal de igual (ou superior) hierarquia.

Quanto à reserva de lei para normas que dizem respeito ao regime jurídico do servidor, o STJ já decidiu:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO DA CARREIRA DO MAGISTÉRIO. PROGRESSÃO FUNCIONAL PORTARIA DO MINISTÉRIO DA MARINHA. AMPLIAÇÃO DE CRITÉRIOS. ILEGALIDADE.

- A alteração do regime jurídico e sistema de provimento de cargos dos servidores públicos é matéria de reserva legal, sendo insusceptível de alteração por meio de portaria expedida 8 por órgão da Administração Federal. 

- A Portaria n° 177/88, expedida pelo Ministério da Marinha, ao ampliar os requisitos que asseguram o direito à progressão funcional aos integrantes da carreira do magistério civil, restringiu o alcance da Lei n° 7.596/87 e do Decreto n° 94.664/87, desviando-se, de conseqüência, de sua função regulamentar.

- Recurso especial não conhecido.

(REsp 221.981/RJ, Rel. Ministro VICENTE LEAL, SEXTA TURMA, julgado em 07/10/1999, DJ 29/11/1999, p. 227)

Embora nem todos os aspectos que digam respeito ao regime jurídico dos servidores estejam submetidos explicitamente à reserva de lei por força da Constituição, parece-nos que as normas proibitivas de comportamentos que não encontram amparo no texto constitucional devem ser objeto de lei, considerando o disposto no art. 5°, inc. II, da Constituição, segundo o qual "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei'. O núcleo essencial de deveres do servidor público, portanto, deve ser objeto de lei formal, e nos parece evidente que norma que obriga a manutenção do vínculo público por certo período é de tal modo gravosa que não tem como não integrar o núcleo de obrigações do servidor.

Ainda que não se tratasse de matéria sujeita à reserva de lei, a previsão do decreto vai de encontro com a Lei n° 8.989/79, na medida em que tal diploma, por um lado, garante a exoneração a pedido e, por outro, apenas a condiciona à inexistência de inquérito administrativo contra o servidor interessado. Qualquer novo condicionamento ao exercício de tal direito legal só poderia ser previsto na próprio Estatuto ou em outra lei, sendo que, segundo anota PROCED, não há qualquer norma que ampare a previsão do decreto no que toca ao impedimento para exoneração no curso do procedimento de exoneração em estágio probatório.

Por idêntica razão, a inserção dos processos sumários no parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03 também contraria a Lei municipal n° 8.989/79, que, vale reprisar, apenas impede a exoneração no curso de inquéritos administrativos, que constitui procedimento disciplinar mais grave (pelo fato do servidor ficar sujeito à penalidade de demissão). Para o legislador, portanto, apenas fatos graves, apurados em inquérito, justificariam um impedimento ao exercício do direito à exoneração do cargo.

No caso de procedimentos sumários, contudo, aplica- se o disposto no §2° do art. 75 do Decreto n° 43.233/03, segundo o qual "o número do processo será anotado no prontuário do ex-servidor, sendo obrigatória a reabertura do feito se restabelecido o vínculo funcional, observado o disposto no artigo 170, inciso I, deste decreto".

De resto, nada impede que o decreto seja reformado para, além de suprimir a parte do parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03 considerada desconforme a lei, prever que a exoneração no curso do processo sumário não terá como efeito à sua extinção sem julgamento do mérito, ficando prejudicado o cumprimento de eventual penalidade (que apenas será viável em caso de reassunção de função no Município) - a qual, de resto, produzirá seus regulares efeitos.

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São Paulo, 11/12/2017.

RODRIGO BRACET MIRAGAYA

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP 227.775

PGM

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De acordo.

São Paulo, 11/12/2017.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

Procuradora Assessora Chefe - AJC

OAB/SP 175.186

PGM

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1 Parágrafo Único. A partir da determinação de instauração do Inquérito Administrativo, Procedimento Sumário ou Procedimento de Exoneração em Estágio Probatório, a parte só poderá ser exonerada, dispensada a pedido ou licenciada sem vencimentos após a decisão final, devendo os expedientes respectivos acompanhar o procedimento, exceção feita ao disposto no artigo 153 deste decreto.
2 Art. 62. (...)
§ 1°- Dar-se-â exoneração:
1- a pedido do funcionário;
2 - a critério do Prefeito, quando se tratar de ocupante de cargo em comissão;
3 - quando o funcionário não entrar em exercício dentro do prazo legal.

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2017-0.139.446-0

INTERESSADO: XXXXXXXXXXXXXXXX

ASSUNTO: Pedido de exoneração no curso do procedimento de exoneração em estágio probatório.

Cont. da Informação n° 1.784/2017-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador Geral

Encaminho, a Vossa Senhoria, manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acompanho, no sentido de que: (1) a extensão da vedação da exoneração à pedido para servidores que respondem a procedimentos de exoneração em estágio probatório e processos sumários, conforme previsto no parágrafo único do art. 73 do Decreto n° 43.233/03, não se compatibiliza com a Constituição e com Lei municipal n° 8.989/79; (2) recomenda-se a reforma do decreto para supressão da parte considerada desconforme à lei - sem prejuízo da imediata aplicação do entendimento aqui exposto - e para prever que a exoneração a pedido no curso do processo sumário não terá como efeito à sua extinção sem julgamento do mérito, ficando prejudicado o cumprimento de eventual penalidade até eventual reassunção.

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São Paulo, 19/12/2017.

TIAGO ROSSI

Coordeandor Geral do Consultivo

OAB/SP 195.910

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo